COMPETENCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL QUALIDADE DA AUTORIDADE OC
ESTADO DO RIO DE JANEIRO
PODER JUDICIÁRIO
COMARCA DA CAPITAL
JUÍZO DE DIREITO DA 10ª VARA DE FAZENDA PÚBLICA
Processo nº: 2012.001.033891-0
SENTENÇA
I
Vistos etc..
Trata-se de Mandado de Segurança impetrado por AILSON MIGUEL DE LIMA, qualificado na inicial, em face de ato do SUPERINTENDENTE EXECUTIVO DA EMPRESA MUNICIPAL DE VIGILÂNCIA S/A, objetivando ser reintegrado no cargo de Guarda Municipal.
Como causa de pedir, alega o impetrante, em síntese, ter participado de um incidente de trânsito envolvendo “flanelinhas”, no dia 06.02.04, que veio a ser filmado por uma rede de televisão, onde foi dado destaque às faltas funcionais cometidas pelos agentes públicos. Diante destes fatos, foi instaurado procedimento administrativo que, ao final, concluiu pela sua demissão. Inconformado, propõe o impetrante a presente demanda, sustentando, para tanto, a presença de vícios na forma de condução do procedimento administrativo (fls. 02/06).
Com a inicial vieram os documentos de fls. 07/30.
Devidamente notificada, a autoridade apontada como coatora prestou informações (fls. 36/44), mencionando, preliminarmente, a inépcia da inicial, além da incompetência absoluta do Juízo. No mérito, sustenta a legalidade do procedimento administrativo que teve seus trâmites normais, com observância do contraditório e ampla defesa. Assim, a demissão por justa causa foi pertinente, na medida em que o impetrante incorreu em ato de improbidade e incontinência de conduta.
Com a contestação vieram os documentos de fls. 45/106.
Parecer do Ministério Público às fls. 112/114, no sentido da improcedência do pedido.
II
É o relatório. Fundamento e decido.
Inicialmente, cabe o exame das preliminares.
A primeira delas, relativa a inépcia da inicial, não prospera. Da narrativa dos fatos, fácil deduzir que o impetrante se insurge quanto ao ato do seu desligamento dos quadros da Empresa Municipal de Vigilância S/A. Não se verifica aí falta de lógica e coerência para efeitos de aplicação da regra do art. 295, parágrafo único, II, do CPC.
Do mesmo modo, não vinga a tese de incompetência absoluta da Justiça Estadual para apreciar e julgar a presente demanda.
Conforme orientação sedimentada no âmbito do STJ, a competência para julgar Mandado de Segurança é definida em razão da qualidade que quem ocupa o pólo passivo da relação processual, sendo irrelevante a natureza ou conteúdo do ato impugnado.
Sobre o assunto, valem os seguintes julgados:
“CONFLITO DE COMPETÊNCIA - MANDADO DE SEGURANÇA – DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL – JUSTIÇA COMUM – PRECEDENTES DO STJ.
I – No Mandado de Segurança, uma competência ora se discute, cinge-se o pedido o pedido ao reconhecimento do direito de defesa do impetrante em processo administrativo disciplinar contra ele instaurado, sem qualquer cumulação com outros de natureza trabalhista.
II – Em se tratando de Mandado de Segurança , a competência é definida em função da autoridade coatora, não em razão da matéria.
Conflito conhecido para declarar competente o Juízo de Direito da Sexta Vara da Fazenda Pública do Distrito Federa, o suscitado” (CC 18123/DF, Rel. Min. CASTRO FILHO, 2a Seção, J. 24.10.01, DJ 04.02.02).
“PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL – RECURSO ESPECIAL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – PRESSUPOSTOS – OMISSÃO – INEXISTÊNCIA - MANDADO DE SEGURANÇA - EX-FUNCIONÁRIO PÚBLICO CELETISTA – REINTEGRAÇÃO – ATO DE PREFEITO – COMPETÊNCIA - JUSTIÇA COMUM ESTADUAL.
...
Este Superior Tribunal de Justiça vem se posicionando no sentido de que, em se cuidando de Mandado de Segurança, a competência deve ser firmada em razão da qualidade de quem ocupa o pólo passivo da relação processual, não decorrendo da natureza ou conteúdo do ato impugnado. Precedentes.
Na espécie, não se deve considerar a natureza da relação empregatícia, mas a circunstância de que a pretensão foi deduzida em Mandado de Segurança impetrado contra ato de Prefeito Municipal, cuja competência é da Justiça Comum Estadual.
Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta extensão, provido” (RESP 201909/SP, Min. VICENTE LEAL, 6a Turma, J. 28.08.02, DJ 05.05.03).
“COMPETÊNCIA – MANDADO DE SEGURANÇA.
Irrelevante, para fixação de competência, a matéria a ser discutida em Mandado de Segurança, posto que é em razão da autoridade da qual emanou o ato, dito lesivo, que se determina qual o Juízo a que deve ser submetida a causa” (CComp nº 17438-MG, Min. FELIX FISCHER, DJU 20.10.97).
Delimitada a competência em razão da função ou cargo ocupado pela autoridade apontada como coatora, não restam dúvidas quanto a ser a Justiça Estadual a competente para processar e julgar a presente demanda.
Na hipótese, a discussão travada envolve questão relativa ao direito administrativo e constitucional, na medida em que é alegada a presença de vícios formais no processo administrativo, não tendo, portanto, qualquer relação com a matéria trabalhista.
Deste modo, por se estar diante de ato praticado por autoridade pertencente aos quadros de uma Empresa Pública, integrante da Administração Indireta Municipal, cabe ao Juízo Fazendário, com base na regra do art. 86, do CODJERJ, a análise da causa.
Superadas as preliminares, entra-se no mérito.
A questão posta a debate consiste em checar se o processo administrativo que culminou na demissão do impetrante, encontra-se eivados de vícios, capaz de macular a sua validade.
Examinando-se a prova carreada os autos, não se constata a presença de qualquer ilegalidade no apontado ato administrativo.
O procedimento administrativo se fez com observância de todos os princípios próprios e inerentes a este. Foram respeitados a legalidade objetiva, a oficialidade, o informalismo, o contraditório e a ampla defesa.
Para esta conclusão basta checar os documentos juntos. Neles fácil perceber a preocupação do administrador em apurar a veracidade dos fatos que foram objeto de divulgação em rede de televisão, apontando o impetrante, juntamente com seu colega, em atitudes tidas como desvirtuantes daquelas próprias do cargo. Foi permitido ao impetrante se defender de maneira adequada, em observância ao comando constitucional inserto no art. 5o, LV, da CRFB.
Assim, não se vislumbra a presença de vícios formais no procedimento que, após os trâmites normais, constatou faltas funcionais sujeitas à aplicação da pena de demissão, com base nas regras da CLT.
Vale aqui ressaltar que o Poder Judiciário não pode se substituir a Administração na valoração das provas, estabelecendo aquela que deve merecer maior credibilidade, e aquela que não deve.
Quanto ao que é dito, e a limitação da análise a que se pode fazer o Judiciário, em sede de decisão punitiva, vale a seguinte passagem de HELY LOPES MEIRELLES: “O que a Administração não pode é aplicar punições arbitrárias, isto é, que não estejam legalmente previstas. ... O necessário é a que Administração Pública, ao punir seu servidor, demonstre a legalidade da punição. Feito isso, ficará justificado o ato, e resguardado de revisão judicial, visto que ao Judiciário só é permitido examinar o aspecto da legalidade do ato administrativo, não podendo adentrar os motivos de conveniência, oportunidade ou justiça das medidas de competência específica do Executivo” (Direito Administrativo Brasileiro, 20a ed., Malheiros, p. 416/417).
Pautando-se, pois, o administrador pelo princípio da legalidade e moralidade pública, adequada a sanção imposta, que se mostra proporcional ao tipo de conduta realizada pelo impetrante.
Finalizando, pois, o que se tem é a improcedência do pedido.
III
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido, denegando a segurança.
Sem custas, face a gratuidade deferida.
Sem honorários (Súmula 512, do STF).
Rio de Janeiro, 15 de outubro de 2012.