STJ RESP 1481743 A8D1F
Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 1.481.743 - RS (2014/0235846-6)
RELATOR | : MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES |
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC. EXISTÊNCIA DE OMISSÃO. SUBSISTÊNCIA DO VÍCIO, MESMO APÓS A OPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO PROVIDO.
DECISÃO
Trata-se de recurso especial interposto em face de acórdão do Tribunal Regional
Federal da 4ª Região cuja ementa é a seguinte:
EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. GARANTIA DO JUÍZO. DOCUMENTAÇÃO. FGTS. PAGAMENTO DIRETO AO EMPREGADO. IMPOSSIBILIDADE DE COBRANÇA EM DUPLICIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA INOCORRENTE. ENCARGOS DE SUCUMBÊNCIA.
1. O artigo 16, § 1º, da Lei nº 6.830, de 1980, não prevê que, para a oposição dos embargos, a execução deva estar integralmente garantida, admitindo-se a ação ainda que o bem penhorado tenha valor inferior ao crédito.
2. Está suficientemente instruído aquele feito que permite a adequada compreensão da controvérsia.
3. Não há cerceamento de defesa quando a prova não foi produzida por inércia do próprio embargante.
4. Os recolhimentos realizados ao FGTS reverterão em benefício do empregado. Logo, se o empregador pagou diretamente a ele, tal pagamento deve ser considerado, não se concebendo que deva recolher novamente a quantia em conta vinculada ao Fundo, pois o destinatário já recebeu o valor que lhe era devido. 5. Os encargos previstos em lei pelo não recolhimento no prazo legal, inclusive incidentes sobre os valores pagos diretamente aos empregados, devem ser mantidos, pois os juros moratórios e a multa do art. 22 da Lei n.º 8.036/90 revertem para o próprio FGTS, e não para o empregado.
6. Tendo sido o próprio embargante quem, por ter recolhido os valores ao FGTS em atraso e de forma incorreta, deu causa à cobrança de quantias indevidas, não é cabível a condenação da embargada ao pagamento de honorários de sucumbência.
Os embargos de declaração opostos foram rejeitados.
No recurso especial, interposto com base na alínea "a" do permissivo constitucional, a ora recorrente aponta ofensa ao art. 535, II, do CPC, art 23, § 1º, I, arts. 25 e 26 da Lei 8.036/90, alegando, em síntese, que: (a) o acórdão recorrido manteve-se omisso, mesmo após a oposição dos embargos de declaração; (b) que o FGTS deve ser recolhido diretamente ao fundo, pois a lei não autoriza o pagamento da contribuição diretamente ao empregado, ainda que por meio de acordo realizado na Justiça Trabalhista.
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O recurso foi admitido pela decisão de fl. 452.
É o relatório. Passo a decidir.
Até o advento da Lei n. 9.491/97, o art. 18 da Lei n. 8.036/90 permitia o pagamento direto ao empregado, das parcelas relativas ao depósito do mês da rescisão, ao depósito do mês imediatamente anterior (se ainda não vencido o prazo para depósito) e aos 40% (demissão sem justa causa) ou 20% (culpa recíproca ou força maior) de todos os depósitos realizados durante a vigência do contrato de trabalho.
Com a entrada em vigor da Lei n. 9.491/97, o pagamento direto ao empregado passou a ser vedado, devendo o empregador depositar todas as parcelas devidas na conta vinculada do FGTS.
Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. FGTS. ALEGAÇÃO DE IMPOSSIBILIDADE DA INCIDÊNCIA DE MULTA. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DE DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL TIDO POR VIOLADO. SÚMULA 284/STF. PAGAMENTO FEITO DIRETAMENTE AOS TRABALHADORES. OBRIGATORIEDADE DA REALIZAÇÃO DO DEPÓSITO EM CONTA VINCULADA, EM OBEDIÊNCIA ÀS DISPOSIÇÕES CONTIDAS NA LEI 8.036/90.
1. Os deveres e obrigações relativos ao FGTS, cuja ocorrência se dê sob a égide da sua atual legislação de regência, devem ser cumpridos com obediência às disposições legalmente expressas, por se tratarem de normas específicas e cogentes.
2. A possibilidade de pagamento direto ao empregado, nos casos de despedida sem justa causa, prevista à época pela redação do art. 9º do Decreto 99.684/90, em nenhum momento teve o condão de desobrigar o empregador a efetuar mensalmente os depósitos do FGTS na conta vinculada de cada empregado, em conformidade com o disposto no art.
15 da Lei 8.036/90.
3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesse ponto, desprovido.
(REsp 621.420/PR, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28/08/2007, DJ 01/10/2007, p. 212)
FGTS – EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL – ACORDO REALIZADO NA JUSTIÇA TRABALHISTA – PARCELAS PAGAS PELO EMPREGADOR DIRETAMENTE AO EMPREGADO – COBRANÇA PELA CEF.
1. Até o advento da Lei 9.491/97, o art. 18 da Lei 8.036/90 permitia que se pagasse diretamente ao empregado as seguintes parcelas: depósito do mês da rescisão, depósito do mês imediatamente anterior (se ainda não vencido o prazo para depósito) e 40% do montante de todos os depósitos realizados durante a vigência do contrato de trabalho, em caso de demissão sem justa causa ou 20%, em caso de culpa recíproca ou força maior.
2. Com a alteração da Lei 9.491/97, nada mais pode ser pago diretamente ao empregado, devendo o empregador depositar todas as parcelas devidas na conta vinculada do FGTS.
3. Hipótese dos autos em que parte do pagamento direto ocorreu, de forma ilegítima. Legalidade da exigência de tais parcelas em execução fiscal.
4. Recurso especial provido em parte.
(REsp 754.538/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/08/2007, DJ 16/08/2007, p. 310)
Nesse contexto, verifica-se que assiste razão à recorrente ao afirmar que houve
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omissão no acórdão recorrido, na medida em que não se pronunciou sobre a vigência dos contratos de trabalho que geraram a obrigação ao recolhimento do FGTS, se anterior ou posterior à entrada em vigor da Lei n. 9.491/97, que vedou o pagamento direito ao trabalhador.
Portanto, em virtude da subsistência da omissão apontada, mesmo após a oposição de embargos de declaração, fica caracterizada a alegada afronta ao art. 535 do CPC.
A corroborar esse entendimento, destacam-se:
PROCESSUAL CIVIL. ART. 535, I, DO CPC. CONTRADIÇÃO NO ACÓRDÃO EMBARGADO. OMISSÃO NO ACÓRDÃO REGIONAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO SILENTES. VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, DO CPC. OCORRÊNCIA. RETORNO DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE ORIGEM PARA JULGAMENTO COMPLETO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. 1. Os embargos declaratórios somente são cabíveis para modificar o julgado que se apresentar omisso, contraditório ou obscuro, bem como para sanar possível erro material existente no acórdão. 2. Embora o acórdão que julgou o agravo regimental tenha afastado a preliminar de violação dos arts. 458 e 535 do CPC quanto à suposta omissão acerca da infringência à coisa julgada pela instância de origem, o acórdão embargado consignou que não há no acórdão recorrido qualquer menção ou informação acerca da determinação, na sentença exequenda, da incidência de juros de mora até o efetivo pagamento do precatório. Existência de contradição. 3. Se na sentença exequenda já transitada em julgado há expressa determinação para se incluírem os juros moratórios no precatório complementar até o depósito total da dívida, o afastamento de sua incidência violaria o princípio da coisa julgada. Precedentes da Corte Especial. 4. O Tribunal a quo considerou incabível a incidência de juros de mora até a data do efetivo pagamento da dívida, sem, no entanto, manifestar-se acerca da existência da coisa julgada quanto ao tema. 5. A teor da jurisprudência desta Corte, somente a existência de omissão relevante à solução da controvérsia, não sanada pelo acórdão recorrido, caracteriza a violação do art. 535, II, do CPC. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos modificativos, para dar total provimento ao recurso especial, a fim de que os autos retornem ao Tribunal a quo para o julgamento completo dos embargos de declaração opostos. (EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 1.231.689/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Humberto Martins, DJe de 1º.7.2011)
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CAUTELAR. LIQUIDAÇÃO. EXECUÇÃO. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. RATEIO. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL DE FLUÊNCIA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO RECONHECIDA. ACÓRDÃO ANULADO. ARTIGOS ANALISADOS: ART. 535 DO CPC. 1. Ação cautelar ajuizada em 1985. Recurso especial concluso ao Gabinete em 04.11.2013. 2. Discussão relativa à existência de omissão relevante no acórdão recorrido. 3. O Tribunal de origem deveria ter analisado a questão relativa à forma de rateio dos honorários de sucumbência e ao termo inicial de fluência dos juros de mora. Não o fazendo, o TJ/RJ acaba impedindo que a recorrente traga essa questão para ser analisada por esta Corte, em sede de recurso especial, seja por ausência de prequestionamento, seja por incidência da Súmula 7/STJ. 4. Reconhecida a violação do art. 535 do CPC, devendo o acórdão ser anulado, para nova manifestação do Tribunal de origem sobre os temas relevantes à solução da controvérsia. 5. Recurso especial provido. (REsp 1440760/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/06/2014, DJe 17/06/2014)
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Assim, merece ser provido o presente recurso, a fim de anular o acórdão proferido em sede de embargos de declaração (fls. 425/427), determinando-se o retorno dos autos ao Tribunal de origem para que seja proferido novo julgamento, sanando-se a omissão existente.
Diante do exposto, com base no art. 557, § 1º-A, do CPC, dou PROVIMENTO ao recurso especial.
Brasília (DF), 29 de setembro de 2014.
MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES
Relator
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