REMOÇÃO SERVIDOR EM LICENÇA DELEGACIA
ESTADO DO RIO DE JANEIRO
PODER JUDICIÁRIO
COMARCA DA CAPITAL
JUÍZO DE DIREITO DA 10ª VARA DE FAZENDA PÚBLICA
Processo n° 2012.001.112788-0
SENTENÇA
I
Vistos etc..
Trata-se de mandado de segurança impetrado por CARLOS FERNANDO DOS SANTOS AZEREDO, qualificado na inicial, em face do CHEFE DE POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, objetivando seja declarado nulo o ato que determinou sua remoção para a 110º Delegacia Policial – Teresópolis.
Como causa de pedir, alega o impetrante, em síntese, ter ocorrido violação ao princípio da legalidade e desvio de finalidade no ato de sua remoção da 19a DP para a 110a DP, uma vez que em contrariedade com o disposto no artigo 288, § 3º, do Decreto nº 3088/80 – Regulamento do Estatuto dos Policiais Civis do Estado do Rio de Janeiro, e artigo 37 da Constituição Federal, eis que encontrava-se de licença médica. Assim, com vistas a sanar a ilegalidade praticada pela Administração, propõe a presente demanda (fls. 02/06).
Com a inicial vieram os documentos de fls. 07/120 e 125/129.
As fls. 132/133, o impetrante esclarece ter sido novamente removido para o DAF – Departamento de Administração e Finanças, juntando, na oportunidade, os documentos de fls. 138/182.
Devidamente notificada, a autoridade apontada como coatora prestou informações (fls. 185/150), afirmando, em síntese, que o ato de remoção se deu a bem do interesse público, pois não era admissível manter um policial lotado em uma unidade policial localizada em área de grande relevância e índices de violência expressivos, sem que o mesmo apresentasse condições físicas de trabalhar em operações externas. Assim, a permanência do servidor de licença médica na referida Delegacia de Polícia atentaria contra os princípios da eficiência e do interesse público.
Com as informações vieram os documentos de fls. 151/158.
Nova manifestação do impetrante às fls. 157/161, acompanhada dos documentos de fls. 162/178.
O Estado do Rio de Janeiro apesar de devidamente intimado, não apresentou impugnação.
Parecer do Ministério Público às fls. 181/183, no sentido da denegação da segurança.
II
É o relatório. Fundamento e decido.
O presente mandado de segurança tem por objeto a declaração de nulidade de ato praticado pelo Chefe da Polícia Civil, que determinou a remoção do impetrante para a 110ª Delegacia Policial – Teresópolis, assegurando-se-lhe o direito de permanecer lotado na 19ª Delegacia Policial até o término de sua licença médica.
O impetrante invoca como fundamento jurídico de seu pedido o disposto no artigo 288, § 3º do Decreto nº 3088/80 – Regulamento do Estatuto dos Policiais Civis do Estado do Rio de Janeiro, razão pela qual o ato teria sido praticado com violação ao princípio da legalidade, e o artigo 37 da CRFB.
A questão importa, pois, em saber se a autoridade impetrada atuou com ilegalidade ou abuso de poder ao determinar a remoção do impetrado, considerando-se que o referido ato foi praticado, conforme noticiado nos autos, em 17 de setembro de 2012 (doc. de fl. 10), e sua licença médica iniciou-se em 13 de agosto de 2012 (doc. de fl. 19).
O artigo 288, § 3º do Decreto nº 3088/80 prevê não ser possível a remoção de policial que se encontre em licença de qualquer espécie ou freqüentando curso na Academia de Polícia.
Tal regra, no entanto, deve ser interpretada sistematicamente com os demais dispositivos regulamentares, e em consonância com a nova ordem constitucional que se estabeleceu com a Constituição Federal de 1988.
A Administração Pública, na prática de seus atos, deve pautar-se pelos princípios expressamente insculpidos no artigo 37, caput, da CRFB, não se olvidando, porém, dos princípios que lhe são subjacentes, dentre os quais o da supremacia do interesse público e o da razoabilidade.
O impetrante, segundo consta dos autos, encontra-se em licença médica desde a data de 13 de agosto de 2012, por apresentar quadro clínico de hipertensão arterial que o impossibilita de atuar em operações policiais externas, dado o alto grau de stress a que é submetido.
O artigo 250, caput, e § 1º do Decreto 3088/80, dispõe que atendidas as diretrizes da Secretaria e as necessidades de Segurança Pública, serão fixados os quantitativos de pessoal que constituirão a lotação de policiais civis em todos os Órgãos da Secretaria de Estado da Polícia Civil, entendendo-se por lotação o número de policiais civis de cada categoria funcional ou cargo isolado que, segundo as necessidades, devam ter exercício em cada órgão.
Vê-se, portanto, que a cada órgão da Secretaria de Estado da Polícia Civil é atribuído um determinado número de vagas para a devida lotação dos policiais, conforme a sua necessidade.
Assim, diante do quadro clínico apresentado pelo impetrante, que o impossibilita de exercer as funções compatíveis com o cargo para o qual foi nomeado - atuar em operações externas no combate à violência -, que cada vez mais atinge índices alarmantes, não é razoável exigir-se do Poder Público a manutenção da lotação de policial que não se encontra apto ao exercício de suas funções, e totalizando o número de vagas para aquela determinada unidade policial.
O Poder Judiciário, no exercício do controle da legalidade sobre os atos administrativos, deve fazê-lo sob o prisma da adequação entre o ato emanado do Poder Público e a sua finalidade.
O ato de remoção, como expressão do poder discricionário que é conferido aos agentes administrativos, deve ser adequado aos fins públicos, cabendo à autoridade competente relotar o servidor de acordo com o interesse do serviço, respeitados os direitos e vantagens inerentes ao cargo, e desde que não imponha ao servidor removido injustificado gravame.
O impetrante não é titular de cargo que lhe assegure o direito à inamovibilidade; tampouco há, nos autos, informação de que tenha sido submetido a processo de readaptação que justifique a sua manutenção na unidade policial mediante o exercício de funções burocráticas ou administrativas.
Em atenção, portanto, ao princípio da supremacia do interesse público, não se verifica ter a autoridade impetrada agido com abuso de poder, até porque procurou lotar o impetrante em Departamento mais compatível com o seu estado de saúde, o Departamento de Administração e Finanças, conforme documento de fls. 138 .
O fato de lhe ser assegurado pelo Decreto nº 3088, que data do ano de 1980, o direito de não ser removido em caso de licença de qualquer natureza, não se coaduna com a nova realidade social que ora se apresenta, com índices de criminalidade e níveis de insegurança alarmantes.
Preferir a legalidade estrita em detrimento da nova ordem social que se instalou em nosso Estado, onde se exige dos órgãos de segurança pública cada vez mais efetividade nas suas ações, não é consentâneo com o princípio da supremacia do interesse público, sobrepondo-se o interesse particular sobre o público, até porque o impetrante encontra-se em licença médica desde agosto de 2012, sem exercer suas atividades, portanto.
Da análise dos autos, não se verifica tenha havido prejuízo ao impetrante, decorrente do ato de remoção, bem como que este tenha se dado por motivos de ordem pessoal, a configurar o desvio de finalidade ou o abuso de poder por parte da autoridade policial.
III
Ante o exposto, julgo IMPROCEDENTE o pedido, denegando a segurança.
Isento o impetrante do pagamento de custas face a gratuidade deferida, bem como da verba honorária em atenção às sumulas 512 do STF e 105 do STJ.
P.R.I.
Rio de Janeiro, 06 de junho de 2012.
RICARDO COUTO DE CASTRO
XXXXXXXXXXXX DE DIREITO