RECURSO ESPECIAL PRESCRIÇÃO DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO
RECURSO ESPECIAL SOBRE PRESCRIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO
Por: Carlos Alberto Bittar Filho
Procurador do Estado de São Paulo, Doutor em Direito pela USP.
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EXMO. SR. DESEMBARGADOR QUARTO VICE-PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
APELAÇÃO CÍVEL Nº ...
FESP X ...
(SALA ...)
A FAZENDA DO ESTADO, por seu Procurador, inconformada, data maxima venia, com o r. acórdão de fls. ..., vem à presença de V. Exa., respeitosamente, nos autos em epígrafe, com supedâneo nos artigos 105, III, a, da Constituição Federal, 541 do Código de Processo Civil e 26 da Lei 8.038/90, interpor o presente RECURSO ESPECIAL, endereçado ao SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, pelas razões expostas em anexo, requerendo seja ele regularmente processado, na forma da lei.
Nestes termos,
P. deferimento.
São Paulo, 21 de outubro de 2012.
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CARLOS ALBERTO BITTAR FILHO
PROCURADOR DO ESTADO
RAZÕES DE RECURSO ESPECIAL
RECORRENTE: FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO
RECORRIDO: ...
I-) DA EXPOSIÇÃO DO FATO E DO DIREITO
1. Cuida-se de recurso de apelação e de reexame necessário interpostos nos autos de embargos à execução julgados procedentes pela r. sentença de primeiro grau. A ... Câmara de Direito Público do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por votação unânime, houve por bem negar provimento à apelação e acolher, em parte, a remessa necessária, apenas para afastar a condenação da Fazenda em verbas de sucumbência.
2. Em que pese ao seu brilhantismo, o r. acórdão de fls. ..., data venia, não pode prosperar, pois contraria o artigo 150, parágrafo 4º, do Código Tributário Nacional. Urge, destarte, seja reformada a r. decisão do tribunal a quo, conforme o que nesta peça se expenderá.
II-) DA DEMONSTRAÇÃO DO CABIMENTO DO PRESENTE RECURSO
3. Trata-se fundamentalmente, aqui, da comprovação do preenchimento do basilar requisito do prequestionamento, consagrado pelas Súmulas 282 e 356 do Pretório Excelso.
4. A respeito do prequestionamento, leiam-se as precisas e modernas lições de RODOLFO DE CAMARGO MANCUSO:
"... atualmente, o prequestionamento da matéria devolvida ao STF e ao STJ por força dos recursos extraordinário e especial há que ser entendido com temperamento, não mais se justificando o rigor que inspirou as Súmulas 282, 317 e 356. Desde que se possa, sem esforço, aferir no caso concreto que o objeto do recurso está razoavelmente demarcado nas instâncias precedentes, cremos que é o quantum satis para satisfazer essa exigência que, diga-se, não é excrescente, mas própria dos recursos de tipo excepcional. (...) Daí por que, tanto que o tema federal ou constitucional tenha sido agitado, discutido, tornando-se res dubia ou res controversa (RTJ 109/371), cremos que ele estará prequestionado."
(Recurso Extraordinário e Recurso Especial, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 1990, pp. 123 e 124)
5. Vê-se que os ensinamentos do renomado processualista se aplicam com perfeição ao presente caso. Com efeito, o tema federal in casu -- que é a contrariedade, pelo r. acórdão de fls. ..., do dispositivo legal mencionado (CTN, art. 150, parágrafo 4º) -- foi prequestionado, pois discutido e agitado, de modo explícito, na r. sentença de primeiro grau (fls. ...), nas razões de apelação (fls. ...), nas contra-razões respectivas (fls. ...) e na fundamentação do r. acórdão (fls. ...).
6. Aliás, assevere-se, a título de reforço, que não houve a oposição dos embargos declaratórios, pois que, in casu, plenamente configurado o prequestionamento explícito. A oposição dos embargos, indubitavelmente, configuraria um indesejável bis in idem.
7. No que diz respeito, assim, ao prequestionamento, foi ele demonstrado à saciedade. Quanto aos outros pressupostos recursais, percebe-se prima facie terem sido preenchidos: a) a r. decisão de fls. ... foi proferida por tribunal (in casu, o E. Tribunal de Justiça de São Paulo); b) foram esgotados os recursos ordinários; c) o r. acórdão foi proferido em sede de apelação; d) trata-se de quaestio iuris; e) a norma contrariada está encartada em lei complementar federal.
III-) DAS RAZÕES DO PEDIDO DE REFORMA DA DECISÃO RECORRIDA
8. Não há falar, in casu, na ocorrência da prescrição.
9. Ora, impende que se observe, ab initio, que a r. sentença de primeira instância não considerou o prazo decadencial ofertado à Fazenda Pública para a constituição do crédito tributário por meio do lançamento.
10. Ao reconhecer que, na hipótese de lançamento por homologação, o prazo prescricional da ação executiva flui da entrega da declaração, a r. decisão do juízo monocrático, ratificada pelo E. Tribunal de Justiça, aboliu, por completo, o prazo decadencial de que cuida o artigo 173 do CTN, prazo esse que se destina à constituição do crédito tributário. É como se a informação prestado pelo contribuinte tivesse força de lançamento, constituindo definitivamente o crédito fiscal, o que, data maxima venia, é absolutamente inadmissível.
11. Na verdade, o autolançamento só se completa com o ato da autoridade que expressamente homologa a declaração fornecida pelo contribuinte, ou, então, em caso de omissão dessa autoridade, pelo transcurso do prazo de cinco anos, contado da data do fato gerador.
12. No caso sub judice, os fatos geradores ocorreram em abril de 1990. Assim, como não houve homologação expressa das declarações prestadas pelo contribuinte, a constituição definitiva do crédito tributário deu-se em abril de 1995, iniciando-se, a partir daí, a contagem do prazo prescricional para o ajuizamento da execução.
13. É fundamental que se esclareça que a inscrição do débito no cadastro da dívida ativa não corresponde à sua constituição definitiva. A rigor, a inscrição é medida voltada à constituição do título executivo extrajudicial (CDA). Também não se pode confundir a extinção do crédito tributário pelo pagamento com a extinção provocada pela decadência, em se tratando de autolançamento, em face do que dispõe precisamente o parágrafo 4º do artigo 150 do CTN.
14. No lançamento por homologação, o contribuinte tem a obrigação de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa. Assim, antecipado o valor declarado, na hipótese remota de homologação expressa e uma vez não constatadas diferenças omitidas na informação, a extinção do crédito tributário é uma conseqüência lógica e natural, pois nada mais haverá a ser reclamado. O mesmo se diga quando a homologação se processa, como na totalidade dos casos, pelo decurso do prazo de cinco anos.
15. Mas urge que se assevere que a antecipação do pagamento é conditio sine qua non de extinção do crédito tributário assim apurado.
16. A confusão parece estabelecer-se quando se considera a hipótese da homologação tácita, que se opera com o decurso do prazo qüinqüenal sem exame da autoridade administrativa, pois a leitura desatenta da disposição contida no parágrafo 4º do artigo 150 do CTN pode levar o intérprete ao equívoco de achar extinto o crédito tributário mesmo que não tenha havido o pagamento, o que é simplesmente inaceitável.
16. Efetivamente, estatui o mencionado dispositivo que, se a lei não fixar prazo à homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se haja pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito tributário, ressalvadas as hipóteses de dolo, fraude ou simulação. Mas é óbvio que a extinção definitiva só se opera no caso de crédito tributário cujo pagamento tenha sido antecipado pelo contribuinte. Assim, nas hipóteses de inexistência de antecipação ou de antecipação parcial, não se poderá cogitar da extinção do crédito tributário, pois a antecipação é condição para que tal ocorra.
18. De todas essas ponderações, conclui-se que, no caso em tela, o crédito tributário, gerado em abril de 1990, adquiriu definitividade, no que toca à sua expressão monetária, em abril de 1995, quando transcorreu o prazo de cinco anos, operando-se, pois, o lançamento tácito. Ora, a constituição definitiva, em abril de 1995, impediu a consumação da decadência, abrindo, a partir daí, para a Fazenda Pública, mais cinco anos para o início da cobrança executiva. Proposta que foi a execução aos 9/4/96, não se pode, pois, cogitar da respectiva prescrição, dentre da correta exegese do parágrafo 4º do artigo 150 do Código Tributário Nacional.
19. Ante o exposto, fica evidente que o r. acórdão guerreado contrariou a ratio do artigo 150, parágrafo 4º, do CTN. É o que se deduz da leitura da melhor doutrina:
"A contrariedade à lei é bastante ampla, abrangendo,aliás, a negativa de vigência. Contrariar a lei é, além de negar vigência, também interpretar erradamente. (...) A intenção do constituinte, pois, revigorando a expressão contrariar a lei, foi de ampliar o cabimento do recurso ao Tribunal Superior de Justiça, atendendo aos reclamos de certas correntes que lamentavam a excessiva rigidez do cabimento do recurso extraordinário. (...) De qualquer maneira cabe a distinção: contrariar a lei significa desatender seu preceito, sua vontade; negar vigência significa declarar revogada ou deixar de aplicar a norma legal federal." (VICENTE GRECO FILHO, Direito Processual Civil Brasileiro, São Paulo, Saraiva, 1993, 6ª ed., vol. 2, pp. 324 - 325; grifos nossos)
"Pensamos que ´contrariar´ um texto é mais do que negar-lhe vigência. Em primeiro lugar, a extensão daquele termo é maior, chegando mesmo a abarcar, a certos respeitos, o outro; segundo, a compreensão dessas alocuções é diversa: ´contrariar´ tem uma conotação mais difusa, menos contundente; já ´negar vigência´ sugere algo mais estrito, mais rígido. Contrariamos a lei quando nos distanciamos da ´mens legislatoris´, ou da finalidade que lhe inspirou o advento; e bem assim quando a interpretamos mal e assim lhe desvirtuamos o conteúdo." (RODOLFO DE CAMARGO MANCUSO, ob. cit., p. 92)
20. Corolário de todo esse raciocínio é que o r. acórdão guerreado acabou por contrariar, data maxima venia, a mens legis do artigo 150, parágrafo 4º, do CTN, rendendo ensanchas para a abertura da via excepcional pela alínea a do artigo 105, III, da Carta Magna de 1988. Urge asseverar que a contrariedade, in casu, consiste na incorreta aplicação do dispositivo em tela, considerando-se incidente a prescrição em caso em que dela não se pode cogitar.
V-) DO PEDIDO
21. Por todo o exposto, requer a Recorrente seja o presente apelo especial conhecido, dando-se-lhe provimento, com a conseqüente reforma da r. decisão do preclaro órgão jurisdicional a quo, como medida da mais lídima JUSTIÇA!
São Paulo, 21 de outubro de 2012.
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CARLOS ALBERTO BITTAR FILHO
PROCURADOR DO ESTADO