INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE

INVESTIGAÇÃO DE

PATERNIDADE

ATUALIZAÇÃO CIENTÍFICA

DR. JOÃO LÉLIO P. DE MATTOS Fo

MÉDICO E PERITO JUDICIAL

SÃO PAULO

10000007

Durante mais de 10 anos, atuando como Perito Judicial, tive oportunidade de publicar uma série de trabalhos, na mídia impressa especializada, tanto Jurídica, quanto Médica.

Este documento contém uma coletânea atualizada, abordando temas complexos e atuais, como formulação de quesitos, investigação de paternidade com suposto pai falecido (em anexo), entre outros.

Nossos Laudos Periciais Judiciais são estruturados segundo padrão internacional, contendo, inclusive, identificação fotográfica das partes, além de sólida citação de referências bibliográficas.

Caso deseje alguma informação adicional, os dados para contato são:

Dr. João Lélio P. de Mattos Filho

Diretor do Laboratório DiaGenix

End.: Rua Dr. Cândido Espinheira, n°. 155

CEP 05402-000 – São Paulo

Fone: (011) 548 4306; FAX (011) 524 6518

ÍNDICE

INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE – Considerações sobre o uso das sondas de DNA 4

OS QUESITOS NA INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. 8

ESTUDO SOBRE PATERNIDADE . 14

O IMPACTO DA INTRODUÇÃO DO EXAME DO DNA NO CONJUNTO DE PROVAS NA INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. 17

DNA REVOLUCIONA INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE 23

A IMPRESSÃO DIGITAL DO DNA COMO MÉTODO DE IDENTIFICAÇÃO MÉDICO-LEGAL. 26

DNA POSSIBILITA INVESTIGAR PATERNIDADE COM SEGURANÇA 31

INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE COM SUPOSTO PAI FALECIDO ATUALIZAÇÃO MÉDICO-PERICIAL - DESCRIÇÃO DOS PRIMEIROS CASOS BRASILEIROS EMPREGANDO O EXAME DO DNA POSSIBILIDADES E LIMITAÇÕES 34

ATUALIZAÇÃO MÉDICO-JURÍDICA – INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE INTRA-ÚTERO 42

INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE

CONSIDERAÇõES SOBRE O USO DAS SONDAS DE DNA

Novamente nos manifestamos para trazer, à V. Exa., subsídios importantes para o melhor entendimento das provas que estabelecem vínculo genético, tão im­portantes atualmente.

Temos assistido, recentemente, a proliferação de entidades que alardeiam a realização de exames de DNA, entidades estas suportadas por esquemas publicitá­rios e de "marketing", cujo efeito persua­sivo, mesmo nas pessoas versadas na ma­téria, é eficaz e contundente. Ao contrário do verdadeiro comportamento científico, estas entidades têm-se utilizado da veicu­lação através da mídia não ética (jornais, revistas não especializadas), criando con­fusões e disseminação de informações contraditórias e, até mesmo, errôneas e enganosas.

Para esclarecermos estes pontos que consideramos importantes e vitais, na compreensão do exame do DNA, aborda­remos aspectos técnicos das sondas de DNA e sua relevância na método e inter­pretação da prova pericial.

As sondas de DNA são, em última análise, os elementos mais importantes para a execução técnica dos testes. São as sondas que detectam as variações nas se­qüências da molécula de DNA, para que seja possível a comparação entre indiví­duos.

Devido à importância das sondas de DNA e sua aplicabilidade, houve uma crescente preocupação na sua escolha e padronização, como reflexo de suas carac­terísticas técnicas.

São conhecidos, atualmente, dois ti­pos de sondas de DNA: as sondas "multi-locus" e as "single-locus". Há consenso, de todas as entidades e associações cientí­ficas, das vantagens e propriedades das sondas "single-locus", de tal maneira que as sondas "multi-locus" tiveram seu uso banido em Medicina Legal. As sondas "multi-locus" produzem um padrão composto por número excessivo de bandas, cuja leitura e comparação são difíceis e podem induzir a erro. Como não existe a possibilidade do cálculo de freqüências alélicas, não se pode obter o cálculo de probabilidade de paternidade, hoje unanimemente exigido pela Justiça de vários países do mundo.

Preocupados em desenvolver crité­rios que possibilitassem a padronização na técnica do exame do DNA, a Associação Americana de Bancos de Sangue (American Association of Blood Banks - AABB), editou várias versões de um conjunto de normas técnicas, sendo, a última, em 10000004, denominadas "Padrões para Testes Laboratoriais de Paternidade" (Standards for Parentage Testing Laboratories). Estas normas têm sido adotadas em centros desenvolvidos e, atualmente, somente são aceitos como juridicamente válidos, nos EUA, aqueles testes de DNA que sigam estritamente estas padronizações. Na parte relativa ao exame do DNA, o "Padrões para Testes Laboratoriais de Paternidade" menciona textualmente:

"Freqüências gênicas e haplotípicas devem ser obtidas, através do exame das populações de tamanho ade­quado". Também mencionam o se­guinte: "Nos casos de não-exclusão o laudo deve incluir o Índice de Pa­ternidade para cada sistema genético empregado, o Índice Combinado de Paternidade e a Probabilidade de Paternidade expressa em porcenta­gem".

Somente as sondas "single-locus" podem atender às exigências e requisitos feitos pela AABB.

No documento “A Testemunha Genética - Uso Forense do Teste do DNA” (Genetic Witness - Forensic Uses of DNA Tests), elaborado pelo Congresso dos Estados Unidos da América (Office of Technology Assessment), existem numerosas citações a respeito da preferência pelas sondas "single-locus" , estando entre as principais:

"Condições de detectar somente um "locus" por cromossomo, com razoável condição de hibridização."

"Produzir bandas bem caracteriza­das (tais como tamanho definido, número de bandas, intensidade rela­tiva das bandas) de tal forma que bandas não usuais possam ser detec­tadas."

"Detectar apenas um fragmento por alelo, de forma que as pessoas testadas exibam um ou dois alelos, na dependência se são homozigotas ou heterozigotas."

"Utilizar uma série de sondas para cromossomos diversos, ou regiões razoavelmente distante em um mesmo cromossomo, para haver se­gurança de que as regiões pesquisa­das são herdadas de forma indepen­dente."

Somente as sondas "single-locus" podem atender às recomendações do governo dos EUA, para aplicação em Medicina Legal.

A Associação Internacional de He­mogenética Forense (International Society for Forensic Haemogenetics) em seu “Recomendações Para Teste do DNA”, menciona o seguinte:

"A freqüência de mutações das sondas "multi-locus" é maior do que 0,01 e valores maiores devem ser esperados. Desde que cálculos, tendo como base elementos estatísti­cos para determinação da paterni­dade não podem ser obtidos, so­mente a opinião verbal a respeito da exclusão ou não-exclusão pode ser fornecida. O uso das sondas "multi-locus" sem comprovação estatística não possui aceitabilidade corrente nos testes de paternidade rotineiros".

Somente as sondas "single-locus" podem atender às exigências feitas pela Associação Internacional de Hemogené­tica Forense.

Em publicação recente, “A Impressão Digital do DNA - Uma Introdução” (DNA Fingerprinting - An Introduction) o renomado cientista Prof. Dr. L. Kirby faz as seguintes menções:

"Com as sondas "multi-locus" tem sido regra a incompatibilidade entre os alelos e as sondas. Em muitos laboratórios este fato resultou em dificuldades na execução do teste, em termos de detecção de bandas e reprodutibilidade."

"A principal desvantagem das son­das "multi-locus" é a resolução das bandas e o perfil de interpretação re­sultante, além da ausência da pos­sibilidade da obtenção de freqüên­cias alélicas."

"A principal vantagem das sondas "single-locus" reside em sua grande capacidade de determinar freqüên­cias alélicas em várias populações."

Somente as sondas "single-locus" podem atender aos critérios colocados pelo Dr. Kirby.

No livro “DNA na Ciência Forense” (DNA in Forensic Science), no capítulo intitulado o Exame do DNA na Investiga­ção de Paternidade, o autor, Dr. D. Dykes refere, textualmente:

"As principais categorias de poli­morfismos podem ser classificadas em "single-locus", "multi-locus" ..., dependendo do tipo de sonda ou en­zima de restrição utilizada. Em ter­mos práticos a sonda mais fácil de se trabalhar e a mais reprodutível é a "single-locus"."

"As sondas "multi-loci", tais como as sondas 33.15 e 33.6 de Jeffreys, no entanto, detectam muitos frag­mentos de diferentes "loci" podendo criar dificuldade entre as repetidas seqüências originadas. A reprodu­tibilidade da obtenção das bandas requer uma elevada padronização, o que pode levar estas sondas a serem pouco aceitáveis para comparações inter laboratoriais."

Somente as sondas "single-locus" podem atender as especificações coloca­das pelo Dr. Dykes.

O que foi aqui colocado, tem por fi­nalidade orientar os elementos pertencen­tes à Comunidade Jurídica (Juízes, Cura­dores, Advogados, etc.) quando da análise e interpretação de provas para investiga­ção de vínculo genético. Devem ser re­quisitados, de todos os laudos que utilizam exame do DNA, de maneira mínima, o seguinte:

Menção clara e expressa do tipo de sonda utilizada (se "multi-locus" ou "single-locus").

Menção clara e expressa dos Índices de Paternidade (ou Freqüências Fenotípi­cas) para cada sonda e para o conjunto de sondas.

Menção da Probabilidade de Paterni­dade e base estatística a sua obtenção.

Menção de razoável quantidade de refe­rências bibliográficas, para consultas e posterior análise comparativa entre metódos diversos.

É desejável que o Perito Judicial, en­carregado da produção da prova, tenha potencial acesso a, pelo menos, mais de um sistema (HLA ou outro de igual polimorfismo), pois a análise de um conjunto de provas é mais defensável e provida de maior bom-senso, quando investigamos vínculo genético.

Desta maneira, procuramos estender os padrões preconizados e aceitos pela comunidade científica mundial para o nosso meio, evitando opiniões e imposi­ções de caráter pessoal.

O uso de sondas "multi-locus" resul­tou inaceitável e obsoleto em países onde a tecnologia do exame do DNA tem seus adeptos. Não se pode prescindir desta tec­nologia, que deve ser exercida de forma coerente e adequada, do ponto de vista metodológico.

Deve estar sempre em mente a altís­sima probabilidade de que, caso a prova tenha sido produzida em condições não ideais, pode haver um comprometimento em sua validade, com a conseqüente re­percussão legal. É imperiosa a observân­cia a estes preceitos técnicos essenciais, que caracterizam a produção da prova e de sua fidedignidade científica.

A discussão de um tema tão polê­mico, atual e complexo, obviamente não se esgota neste breve apanhado. Nos colo­camos à disposição para consultas de qualquer natureza, não somente sobre testes do DNA, mas também a respeito do exame do HLA ou qualquer outra prova que se produza para investigação de vín­culo genético.

Sempre pautamos nossa conduta em elevados padrões éticos e de excelência científica e temos sido merecedores da confiabilidade de vários Magistrados, o que procuramos honrar através do nosso trabalho honesto e transparente.

Dr João Lélio P. de Mattos Filho

Médico, Perito Judicial e Membro

da Associação dos Peritos Judiciais do Estado de São Paulo

OS QUESITOS NA INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE

Artigo publicado no Repertório IOB de Jurisprudência, 2ª. quinzena de junho de 10000003, n°. 12/0003, pg. 234

A elaboração de quesitos em casos de investigação de paternidade (ou qual­quer investigação de vínculo genético) apresenta uma série de dificuldades. Os métodos progrediram de tal maneira que as consultas à literatura especializada fre­qüentemente causam frustração. É comum deparar-se com quesitos absolutamente inadequados, cuja formulação confunde e obscurece. Na era da biotecnologia ainda surgem quesitos sobre exames antropomé­tricos, prosopográficos (comparação entre fotografias), de arcada dentária, das im­pressões digitais e outros, que não pos­suem a menor validade científica. Muitas vezes o formulados dos quesitos o faz so­mente para mostrar serviço ou desencargo de consciência. Puro engano. Quesitos bem formulados demonstram conheci­mento ao Perito Judicial e orientam a exe­cução do laudo. Na verdade, um Laudo Pericial bem constituído responde a 0000% de qualquer rol de quesitos apresentado.

A formulação de quesitos é, por­tanto, uma arte, manifestação que deve refletir ao alto nível de conhecimento e interesse de quem os executa.

A intenção desta publicação é tornar a formulação de quesitos uma tarefa raci­onal e produtiva. Não pretende ser um guia e nem esgotar o assunto. O avanço da ciência exige uma constante atualização e novos aspectos futuros podem demandar quesitos e posicionamentos fora da rotina. As sugestões aqui colocadas podem, e de­vem, ser modificadas na medida em que as situações individuais assim os requei­ram.

Para um melhor entendimento, este artigo será dividido nos seguintes tópicos:

I - Definições (semântica e jurídica)

II - Classificação geral

III - Fundamentação

IV - Finalidades e objetivos

V - Cuidados na formulação de quesitos

VI - Exemplos práticos

I - DEFINIÇõES

I.A - Semântica

“Quesito”, segundo Aurélio Buarque de Holanda, é a palavra que designa “ponto ou questão sobre que se pede res­posta (opinião, juízo ou esclarecimento); termo denominado do latim “qua e situm” que significa pergunta ou interrogação”.

Deve-se entender, de maneira óbvia, que há um formulador do quesito, o que­sito em si, encerrando um conteúdo que gera uma expectativa e a resposta ou ma­nifestação, proveniente da pessoa inda­gada. A frase que encerra o quesito deve estar na forma interrogativa.

I.B - Jurídica

Pode-se entender, do ponto de vista jurídico, os quesitos como indagações formuladas ao Perito Judicial, a fim de se obter esclarecimentos sobre o fato ou ob­jeto em causa. Para alguns autores, os quesitos têm a função de delimitar o campo de perícia. Como a investigação de paternidade versa sobre assuntos eminen­temente técnicos, é problemática que seja exercida a ação delimitadora. Os quesitos são formulados pelas partes, pelo Juiz e pelos membros do Ministério Público.

II. CLASSIFICAÇÃO

Do ponto de vista jurídico, os quesi­tos são classificados, conforme se segue:

A - Quanto ao tempo em que são apresen­tados

1) Próprios ou originários

2) Suplementares

3) Elucidativos

B - Quanto à matéria

1) Pertinentes

2) Impertinentes

C - Quanto à origem

1) Voluntários ou legais

2) Oficiais

3) Inoportunos

A1 - Quesitos próprios ou originários

São assim denominados, se formula­dos no qüinqüídio respectivo.

A2 - Quesitos suplementares

Podem ser apresentados durante a realização da diligência. Entende-se, para perícias de investigação de vínculo gené­tico, início das diligências como sendo a coleta do material e final, quando o res­pectivo laudo é entregue.

Freqüentemente, tantos os quesitos próprios como os suplementares, já se en­contram detalhados e respondidos no res­pectivo laudo. Desta maneira, o Perito responderá indicando o local do laudo onde se encontram estas respostas.

A3 - Quesitos elucidativos

São destinados a esclarecer pontos do laudo que não tenham ficado claros ou que demandem esclarecimentos “a poste­riori”.

Deve ser observado e considerado que, para que os quesitos sejam respondi­dos, estes têm que chegar até o conheci­mento do Perito Judicial. Para comarcas que estão geograficamente acessíveis, o Perito assina o devido compromisso e, após decorrido o qüinqüídio para apresen­tação dos quesitos próprios, vai até o car­tório, onde retira o processo para estudos ou compila dados significativos ou pode, também, requerer fotocópias. Assim sendo, fica o Perito Judicial informado dos quesitos que deve responder. Os quesitos suplementares e os elucidativos, com freqüência, têm dificuldades de acesso ao Perito, pois, nesta época, o Perito Judicial já extraiu dos autos o ne­cessário para seu trabalho. É mister, en­tão, que, através de notificação adequada, o Perito tome ciência destes quesitos (suplementares e elucidativos).

B1 - Quesitos pertinentes

São considerados pertinentes aqueles quesitos que se circunscrevem aos fatos e objetos da perícia. Amiúde, nos depara­mos com a seguinte situação: encontramos quesitos que fogem totalmente do mérito metodológico da perícia (ex.: Foi pedido exame de arcada dentária? Foi feito exame antropométrico? Foi feito exame prosopo­gráfico?). Queremos crer que, antes de pensarmos que este é um artifício para iludir ou confundir a autoridade requisi­tante, é fruto da desinformação. Deve o Perito Oficial, nestes casos, em suas res­postas, fundamentar a impertinência destes quesitos, para que as dúvidas sejam ade­quadamente sanadas.

B2 - Quesitos impertinentes

Devem ser assim considerados, to­dos os quesitos que não se vinculem aos fatos e objetos da perícia. A identificação dos quesitos impertinentes deve ser do magistrado, mas esta pode caber, também, ao Perito Oficial, nos casos de matéria es­sencialmente técnica. Pensamos que a im­pugnação destes quesitos pode ser solici­tada pelo Perito Judicial, mas optamos por respondê-los, justificando e fundamen­tando a impertinência.

C1 - Quesitos voluntários ou legais

São quesitos voluntários aqueles formulados por uma das partes, de modo e arbítrio próprios.

Quesitos legais são aqueles que emanam do texto legal. Para investigação de vínculo genético, por se tratar de ma­téria técnica, são pouco freqüentes.

C2 - Quesitos oficiais

Os quesitos oficiais são assim de­noiminados, porque são formulados pelos Juízes, quando entenderem necessário.

C3 - Quesitos inoportunos

Considerados como inoportunos, são os quesitos formulados fora dos prazos legais ou não autorizados pelo Juiz. Po­dem ser, também, inoportunos em relação à matéria e aí, se confundem com os im­pertinentes.

Apresentação dos Quesitos

De maneira geral, podem apresentar quesitos:

- O Magistrado, que preside e dirige o processo

- Os representantes do Ministério Público

- Os advogados das partes envolvidas na lide

III - FUNDAMENTAÇÃO

Os métodos para investigação de vínculo genético (ou investigação de pa­ternidade, como querem alguns) tiveram um progresso extraordinário, nos últimos anos.

A velocidade destas alterações fo­ram, de tal forma, que não houve uma re­ação correspondente, nos veículos éticos de divulgação (livros, apostilas etc.), cri­ando-se, assim, um vácuo de informação. Decepcionar-se-á aquele que recorrer à pesquisa bibliográfica, com a literatura existente, mesmo com as mais novas e re­centes, que, com toda certeza, não satis­fará a curiosidade e premência de dados. Serão abordados os dois exames que con­sideramos mais modernos e adequados na investigação de paternidade: HLA e DNA. Fundamenta-se a confecção dos quesitos em conhecimentos mínimos dos testes em questão, que se seguem.

Esclarecemos, complementarmente, que, atualmente, somente as provas men­delianas sangüíneas têm valor na compro­vação biológica do vínculo genético, cujos caracteres estudados são herdados de acordo com as leis de Mendell, frade ge­neticista alemão, que possibilitou identifi­car, com clareza, quais são os elementos provenientes do pai e da mãe. Comprova-se a afirmação de Afrânio Peixoto, que destacava a “voz do sangue” nas investi­gações de paternidade. Qualquer outro método, que não leve em conta a análise de provas mendelianas sangüíneas, é desti­tuído de qualquer validade científica, para investigação de vínculo genético. É fre­qüente nos depararmos, em processos de comarcas distantes dos centros científicos, com os mais esdrúxulos laudos, utilizando métodos que não são aplicáveis para fins da investigação de vínculo genético. Para citar exemplos temos: laudos analisandos impressões digitais, laudos com análises de características físicas e fisionômicas, etc. Imprestáveis do ponto de vista cientí­fico, estes laudos, muitas vezes, são ex­tensos e prolixos, utilizando uma abun­dância de termos “científicos”, que che­gam a impressionar e confundir a autori­dade requisitante.

IV - FINALIDADES E OBJETIVOS

A finalidade da execução de quesi­tos, na perícia de investigação de vínculo genético, é o esclarecimento total e com­pleto de dúvidas que possam, porventura, pairar sobre todas as etapas da produção da prova. Estas etapas são resumidas, a seguir:

1. Identificação das partes

2. Coleta do material

3. Conservação e transporte

4. Execução dos exames

5. Interpretação dos resultados

6. Confecção do laudo

7. Entrega do referido laudo em cartório (término das diligências)

É importante frisar, mais uma vez, que, muitas vezes, os quesitos não são respondidos porque, simplesmente, não chegam ao conhecimento do Perito. Por esta razão, é importante que providências sejam tomadas neste sentido, evitando um desgaste desnecessário, pois, faz parte do procedimento ético e de boa técnica res­ponder a todos os quesitos, com referência à matéria da perícia.

V - CUIDADOS NA FORMULAÇÃO DOS QUESITOS

Não são suficientes, apenas, o em­prego dos pronemes interrogativos QUE, QUEM, QUAL, QUANTO e QUANDO. Os quesitos devem ser formulados de ma­neira clara e objetiva.

Recomendamos que, anteriormente à formulação, haja um estudo prévio da matéria, para evitar quesitos inoportunos, impertinentes ou que fujam aos princípios metodológicos empregados.

VI - EXEMPLOS PRÁTICOS DE QUESITOS

Podemos dividir os quesitos em ge­rais e específicos. Os quesitos gerais di­zem respeito à qualificação do perito e sua experiência no tema, bem como abordam cuidados tomados na identificação, con­servação e eventual transporte do material. Os quesitos específicos são relativos aos métodos científicos empregados na inves­tigação.

Quesitos Gerais

  1. Discorrer a respeito de sua experiência como Perito Judicial na área
  2. Possui o Perito Judicial alguma publi­cação a respeito de investigação de pa­ternidade? Caso afirmativo, anexar có­pia da publicação.
  3. Quantos casos foram, até o momento, conduzidos pelo Perito Judicial, em que utilizou o método em questão?
  4. Quais foram os cuidados tomados na identificação das pessoas periciadas?
  5. Como foi conservado o material cole­tado?
  6. Quais foram os cuidados tomados no transporte do material?
  7. Quais foram as providências tomadas para garantir a inviolabilidade do ma­terial durante o eventual transporte?
  8. Quais foram as providências tomadas para evitar a troca de material?
  9. Quais foram as pessoas, e suas respec­tivas qualificações, que presenciaram a coleta? Estas presenças foram docu­mentadas?
  10. Houve identificação mútua entre as partes? Justifique.
  11. As partes foram informadas de que a coleta poderia ser mutuamente presen­ciada, caso desejasse?
  12. Houve, durante a coleta, algum fato incomum ou inesperado, que pudesse, de qualquer forma, despertar suspeita ou prejudicar o resultado final?

Quesitos Específicos

Exame do HLA

  1. Há compatibilidade entre os haplótipos do filho e de sua mãe? Está confirmada a maternidade?
  2. A exclusão da paternidade foi verifi­cada?
  3. A não-exclusão da paternidade foi ve­rificada?
  4. Foi possível identificar claramene os haplótipos das pessoas investigadas?
  5. Quais são os haplótipos prováveis da mãe, filho e suposto pai?
  6. Há necessidade de examinar outros as­cendentes e descendentes, para deter­minar com clareza os haplótipos dos indivíduos examinados?
  7. É possível o cálculo da probabilidade da paternidade (Pp)? Caso afirmativo, comentar sobre a origem das freqüên­cias fenotípicas e tecer considerações sobre a magnitude estatística da dita probabilidade.
  8. Mencionar o responsável técnico pela realização do exame, bem como sua qualificação científica.
  9. Mencionar a entidade (nacional e/ou internacional) que controla e valida os métodos utilizados e os resultados obti­dos.
  10. Julga Perito necessários outros exames, por outros métodos, para confirmar ou reforçar a exclusão verificada?
  11. Julga o Perito necessários outros exa­mes, por outros métodos, para confir­mar ou reforçar a não-exclusão verifi­cada?
  12. Anexar a documentação bibliográfica que fundamenta a metodologia e as conclusões do laudo.

Exame do DNA

  1. Há compatibilidade genética entre os alelos do filho e de sua mãe? Está con­firmada a maternidade?
  2. A paternidade foi excluída?
  3. A paternidade foi confirmada?
  4. Especificar a procedência e atividade das enzimas da restrição, utilizadas no teste.
  5. Especificar a procedência e atividade das sondas utilizadas. São sondas “multi-locus” ou “single-locus”?
  6. Quantas sondas foram utilizadas? Jul­gou o Perito suficiente este número?
  7. É possível o cálculo da probabilidade de paternidade (Pp)? Caso afirmativo, comentar sobre a origem das freqüên­cias dos alelos encontrados e tecer considerações sobre a magnitude esta­tística da dita probabilidade.
  8. Mencionar o responsável técnico pela execução do exame e sua qualificação científica.
  9. Mencionar a entidade (nacional e/ou internacional) que controla e valida os métodos utilizados e os resultados obti­dos.
  10. Anexar a documentação bibliográfica que fundamenta a metodologia e as conclusões do laudo.

Como já colocado, este artigo não esgota a matéria e nem procura ser abso­luto. Apenas esperamos que sirva de um guia prático nas ações de investigações de paternidade, onde é consenso a importân­cia da prova pericial e saibamos como entendê-la e interpretá-la.

ESTUDO SOBRE PATERNIDADE

Artigo publicado na “Tribuna da Magistratura”, ano V, no 40, out/nov de 10000002

A prova pericial na investigação de paternidade – abordagem comparativa – impacto da introdução do DNA no arsenal de provas

I - INTRODUÇÃO

A investigação de vínculo genético (termo preferível à investigação de pater­nidade) sempre mereceu especial atenção da Justiça. Vários métodos foram empre­gados para obtenção de dados que sugeris­sem ou reforçassem a hipótese da paterni­dade, mas foi somente neste século que foi possível o estudo científico desta matéria, através do descobrimento dos primeiros marcadores genéticos. A descoberta do sistema ABO (Landsteiner, 100001) foi, sem dúvida, o marco inicial, neste sentido. O sistema ABO, juntamente com outros sis­temas (Rh, Mn, Ss, Kell, Duffy, Kidd) compõem os marcadores eritrocitários e recebem esta denominação devido ao fato de serem estudados nos glóbulos verme­lhos (eritrócitos) do sangue humano. Ou­tro marco importante foi a descoberta do sistema HLA (Dausset, 100052). A sigla HLA significa “Human Leucocyte Anti­gen” (antígeno dos leucócitos huma­nos), pois são estudados nos glóbulos brancos (leucócitos) no sangue humano. Recente­mente, a descoberta de métodos para o estudo de regiões específicas do DNA (Jeffreys, 100085), fechou o conjunto de provas destinadas a determinar o vín­culo genético. O DNA (ácido desoxirribo­nu­cleico) é a sede de todas as informações genéticas que herdamos de nossos pais e transmitimos aos nossos filhos. É uma molécula muito longa, composta de ele­mentos denominados bases, que se arru­mam e compõem os genes e que, por sua vez, formam os cromossomos. Os cro­mossomos estão localizados no interior do núcleo das células humanas. Os genes são os elementos responsáveis pela determina­ção de certo caráter genético. Como exemplo, há genes para determinar a cor dos olhos, a cor dos cabelos, e assim por diante.

Outras provas, que não as mendelia­nas sangüíneas, são desprovidas de qual­quer significado científico (ex.: compara­ção entre fotografias, análise da seme­lhança física, exames de arcada dentária, dactiloscopia comparada, entre outros) e assim devem ser consideradas no conjunto de provas destinadas a provar a vinculação genética.

Para análise da vinculação genética há uma sistematização básica de estudo.

Nos casos de investigação de pater­nidade, envolvendo mãe, filho e suposto pai, é feita uma coleta de material (geralmente sangue) de todos os partici­pantes e procede-se aos exames. Nos ca­sos onde a investigação de vínculo gené­tico envolve suposto pai falecido, são es­tudados os descendentes legítimos e a vi­úva (em alguns casos ascendentes e colate­rais), de maneira a tornar possível a re­construção da estrutura genética do fale­cido, formando uma verdadeira árvore ge­nealógica. Uma vez isto feito compara-se com a estrutura genética do reclamante da paternidade. Os exames mais utilizados nestes casos são o HLA e o DNA. Não está indicada a exumação de cadáveres, pois a conservação do material obtido pode não ser satisfatória o suficiente para que se obtenha um bom resultado (Diamond, 100087). A exumação é possível e útil em casos de identificação médico-legal e consiste em procedimento de exce­ção na investigação de vínculo genético.

A fundamentação de todos os exa­mes para verificação de vínculo genético, incluindo o HLA e DNA, é relativamente simples, apesar de todo aparato tecnoló­gico utilizado na execução dos exames. O que se procura é a comparação entre mar­cadores genéticos das pessoas envolvidas no estudo. Uma vez identificados os mar­cadores genéticos comuns entre a mãe e o filho, os marcadores remanescentes são comparados com os marcadores genéticos do suposto pais. Na eventualidade da dis­cordância entre marcadores genéticos en­tre o filho e o suposto pai ocorre a exclu­são da paternidade, caracterizada pela im­possibilidade biológica da vinculação ge­nética. Quando ocorre uma correspon­dência entre marcadores genéticos entre o filho e o suposto pai, é possível, através de cálculos estatísticos baseados nas fre­qüências de aparecimento destes marcado­res na população, a determinação da pro­babilidade de paternidade. Desta maneira chegamos a valores que são significativa­mente expressivos, no cálculo da probabi­lidade de paternidade, que são indicativos da paternidade biológica.

II - ANÁLISE DE RESULTADOS

O exame dos marcadores eritrocitá­rios possibilita a exclusão da paternidade, embora sejam pouco precisos na não ex­clusão, sendo necessário lançar-se mão de outros exames mais poderosos (HLA e DNA).

O exame do HLA é muito útil e compõem, juntamente com os marcadores eritrocitários, em grande número de oca­siões, os exames para estudo da vincula­ção genética. O exame do HLA tem um poder de exclusão de uma falsa alegação de paternidade, que pode ser considerado comparável ao exame do DNA. Nos casos de não exclusão, no entanto, é menos sensível e pode ser necessária a comple­mentação de provas para certificação da vinculação biológica.

O exame do DNA é considerado como biologicamente decisivo. Tem poder de exclusão definitiva, mesmo quando os supostos pais são consangüíneos (parentes). A não exclusão, pelo exame do DNA, deve ser interpretada como indica­dor de paternidade biológica. Embora des­crito há pouco tempo (100085), a metodo­logia do exame do DNA mudou substan­cialmente. A razão primordial para a alte­ração e evolução deveu-se às característi­cas das sondas genéticas, inicialmente em­pregadas pelo descobridor do método (Jeffreys, 100085). Estas sondas têm a ca­pacidade de localizar as regiões específi­cas do DNA dos indivíduos, de maneira a torná-las comparáveis umas com as outras (filhos com supostos pais). As sondas uti­lizadas pelo Prof. Jeffreys (sondas “multi-locus”) davam resultados de difícil inter­pretação e podiam induzir a erro de leitura (Dykes, 10000000). Para que fosse possível o estabelecimento de regras claras e precisas na metodologia de execução do exame do DNA, a Associação Americana de Bancos de Sangue publicou, em 10000000, os Padrões Laboratoriais para Investigação de Pater­nidade (“Standards for Parentage Testing Laboratories”).

III - DOCUMENTAÇÃO DOS RESUL­TADOS

A documentação das provas é feita no Laudo Médico Pericial Judicial. Este deve ser completo, sem ser prolixo, com um número satisfatório de informações, em linguagem que possibilite seu enten­dimento. Deve conter suporte científico, traduzido por quantidade adequada de re­ferências bibliográficas. Os resultados e as conclusões devem ser claros, não dei­xando margens para o surgimento de in­terpretações não pertinentes. Eventuais quesitos, que não foram abordados no Laudo Médico Pericial Judicial, devem merecer especial atenção do perito, pois o esclarecimento destes pontos é essencial na manutenção da credibilidade da autori­dade requisitante no perito designado. Na verdade, a função pericial não se esgota com a entrega do laudo, mas perdura, até que todas as dúvidas sejam sanadas.

Não há estrutura pré-determinada para a execução do Laudo Médico Pericial Judicial, mas espera-se uma seqüência ló­gica na colocação dos tópicos, com ênfase para os pontos mais críticos (identificação, fundamentação, apresentação dos resulta­dos, conclusões e respostas aos quesitos).

IV - CONSIDERAÇõES FINAIS

É consenso o valor da prova peri­cial, nos processos onde se investiga o vínculo genético. Nestes casos, o valor da prova, pelo exame do DNA, está definiti­vamente estabelecido, desde que sua exe­cução tenha sido segundo padronização técnica internacionalmente aceita.

Pelo que foi discutido, o exame do HLA continua a ser considerado de grande valia, e, juntamente com o exame do DNA constituem-se nos mais modernos e precisos instrumentos de investigação que a Ciência jamais colocou nas mãos da Justiça, para que esta seja exercida em toda sua plenitude.

As referências bibliográficas menci­onadas ou qualquer outro dado de inte­resse podem ser obtidas através de comu­nicação com o autor.

NR - O autor é médico, perito em investi­gação de paternidade.

O IMPACTO DA INTRODUÇÃO DO EXAME DO DNA NO CONJUNTO DE PROVAS NA INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE

Artigo publicado no Repertório IOB de Jurisprudência, 2ª. quinzena de junho de 10000002, n°. 12/0002, pg. 276

I - INTRODUÇÃO

A introdução de novas tecnologias tende a modificar hábitos, complementar conceitos, ampliar conhecimentos e, em alguns casos, pode lançar luz sobre pro­blemas e indefinições, até então sem solu­ções.

Com o recente desenvolvimento da engenharia genética e da biotecnologia, tornou-se possível a investigação do DNA (ácido desoxirribonucleico) humano. O DNA, que compõe os cromossomos hu­manos, é, na essência, a sede de todas as informações genéticas, que herdamos dos nossos pais, que transferimos aos nossos filhos, responsável pela organização e funcionamento de todas as nossas células e órgãos.

A investigação de vínculo genético (termo preferível à investigação de pater­nidade) no que tange à produção de prova hematológica, sofreu considerável avanço com a introdução do exame do DNA. Com os exames convencionais utilizados era possível a exclusão da paternidade. Destacamos, entre os exames ainda hoje utilizados, os grupos sangüíneos (ABO, Rh, Kell, Duffy, etc.), as enzimas eri­trocitárias e o HLA ("Human Leucocyte Antigen" ou antígeno de leucócitos huma­nos). Deste grupo, o exame do HLA me­rece um comentário à parte. Descoberto por um cientista francês, prof. J. Dausset (que, posteriormente, ganhou um prêmio Nobel de Medicina), o exame do HLA tem sua aplicabilidade prática, em Medi­cina, na área dos transplantes, sendo o teste que se aplica para a verificação da compatibilidade de órgãos entre o doador e o receptor de rins, coração, etc. Há mais de duas décadas o HLA vem sendo utili­zado, além do campo médico, para inves­tigação de paternidade, devido a algumas de suas características genéticas.

Como já colocado, até o advento do DNA, com os exames existente era possí­vel a exclusão de uma referida paterni­dade. Na verdade, em algumas eventuali­dades, a execução de uma longa bateria de testes (algumas com mais de 10 testes), cujo resultado se configurasse em não ex­clusão, poderia reforçar a hipótese da pa­ternidade biológica. Estas longas baterias de provas resultavam em laudos de difícil compreensão, feitos com padronização técnica questionável e cujo custo não era desprezível.

O cientista inglês, prof. Allec Jeffreys, na Universidade de Leicester, em 100085, descobriu que certas regiões do DNA humanos podiam ser vasculhadas e examinadas através de ferramentas de en­genharia genética denominadas sondas. As sondas são pequenos pedaços sintéticos de DNA que contém um código genético complementar e que, portanto, pode-se ligar à certas regiões do DNA humano. Esta simples e extraordinária propriedade revolucionou a Medicina Forense, pois certas sondas são seletivas para regiões do DNA, que são extremamente variáveis de pessoa para pessoa, embora obedeçam às leis da genética que tornam possível a sua utilização como método de identificação de grande poder de definição.

Ao considerarmos o pouco tempo de utilização do exame do DNA (sua desco­berta deu-se em 100085 e sua implantação efetiva deu-se por volta de 10008000), veremos que a técnica para sua execução já sofreu alterações substanciais. As sondas origi­nalmente concebidas pelo Prof. Jeffreys (denominadas de sondas "multi-locus", pelo fato de localizarem vários fragmentos de um filamento cromossômico), ao pas­sarem pelo crivo da Justiça, evidenciaram algumas deficiências: produziam um nú­mero excessivo de fragmentos, com au­sência de distribuição populacional defi­nida, o que dificultava a leitura do teste e, potencialmente, poderia induzir a erros de interpretações. Além destes fatos, a repro­dutibilidade dos exames do DNA, feitos com as sondas do Prof. Jeffreys, deixava a desejar, pois alguns laboratórios não conseguiam resultados comparáveis entre si. Evidentemente, embora o exame do DNA já tivesse debutado em Medicina Forense e despontasse como definitiva­mente útil nas mais variadas áreas, fal­tvam normas aceitáveis de padronização. Esta padronização surgiu em 10000001, através da Associação Americana de Bancos de Sangue. É, portanto, recentíssima, e regu­lamenta aspectos significativos da metodo­logia do teste. O fulcro desta padronização reside no uso das denominadas sondas "single-locus". Diferente das sondas pri­meiramente utilizadas, as sondas "single-locus" localizam regiões precisas do DNA, originam padrões que podem ser reproduzidos, localizam alelos de fácil identificação, tendo freqüências de distri­buição populacional definida (levando-se em consideração o grupo étnico das pes­soas analisadas). Os países que aderiram às normas da Associação Americana de Bancos de Sangue (entre os principais es­tão Inglaterra e Austrália) somente acei­tam exames do DNA feitos com as sondas "single-locus". Esta padronização, devido à sua rigidez, pois visa aperfeiçoar o as­pecto técnico, tende a ser seguida pelos países que praticam o exame do DNA, entre eles, o Brasil. É até desejável e ne­cessário que seja desta maneira, pois co­loca o Brasil em pé de igualdade com paí­ses que possuem tecnologia de ponta, ob­tendo resultados comparáveis e críveis em qualquer nível.

II - ASPECTOS PRÁTICOS NA IN­VESTIGAÇÃO DE VÍNCULO GENÉ­TICO

O potencial de aplicabilidade do exame do DNA é extenso em Direito de Família. Pode ser utilizado para investiga­ção de vínculo genético, nas ações de in­vestigação de paternidade, investigação de maternidade, sendo decisivo nas negató­rias de paternidade. Mas é nas ações de investigação de paternidade contra suces­sores que o exame do DNA mostra toda sua eficiência. Nestas ações, invariavel­mente, o suposto pai está morto. O que fazemos, então, é a reconstrução da estru­tura genética do falecido, utilizando-se de material (sangue) dos descendentes bioló­gicos legítimos e da viúva. Em alguns ca­sos, podemos utilizar colaterais (irmãos e/ou irmãs) ou ascendentes (pai ou mãe) biológicos, quando outros não estão dis­poníveis. De posse dos parentes biológicos reconstruímos, na forma de uma árvore genealógica, a estrutura genética do fale­cido. Uma vez isto feito, comparamos esta estrutura com aquela (ou aquelas) prove­nientes das pessoas que estão reivindi­cando a paternidade. Enfatizamos que não é necessária a exumação de cadáveres para obtenção de material para exame. Para se ter uma idéia clara da precisão do teste do DNA nestas circunstâncias, vamos nos lembrar de um fato recente, ocorrido na Argentina, no final da década de 70 e iní­cio da década de 80. Por razões políticas, inúmeras pessoas foram detidas e desapa­receram. Muitas eram mulheres grávidas, que vieram a dar à luz na prisão. Estas crianças foram retiradas das mães biológi­cas e criadas por outras famílias, como sendo filhos legítimos. Como proceder à investigação de vínculo genético nesta si­tuação aparentemente insolúvel? Se não, vejamos: a mãe biológica (e, com grande freqüência, também o pai biológico) está desparecida e temos um casal que se diz pai e mãe de uma criança. Em um pri­meiro tempo, executamos a investigação de vínculo genético com as pessoas de que dispomos. No caso da criança não ser fi­lha biológica do casal, haverá uma dupla exclusão: a exclusão de paternidade e da maternidade (semelhante ao que ocorre quando investigamos crianças trocadas na maternidade). Uma vez excluído o vínculo genético primário, temos que localizar pa­rentes vivos, para que seja possível o es­tudo. Nesta hora é que as mães da Praça de Maio, em Buenos Aires (que na ver­dade são avós destas crianças) tiveram decisiva participação, para que o caso pu­desse ser esclarecido. Na eventualidade de pai e mãe não disponíveis, foram utiliza­dos os avós maternos e paternos. Algumas vezes tios paternos e maternos disponíveis também puderam colaborar e fazerem parte da investigação. Dessa maneira, as estruturas genéticas do pai e mãe biológi­cos foram determinadas, mesmo nas suas ausências, através de seus ascendentes e colaterais), e o vínculo genético com a criança pôde ser estudado. O que era uma tarefa impossível tornou-se uma palpável realidade. Cerca de cinqüenta crinças tive­ram seus parentes biológicos detectados, pelo exame do DNA, executado conforme a estratégia aqui descrita.

Para procedermos ao exame do DNA, nos casos usuais de investigação de vínculo genético (ações de Alimentos cumulado com Investigação de Paterni­dade ou ações Negatórias de Paternidade) a conduta é mais simples. O princípio bá­sico reside na comparação de alelos (que são os genes que compõem os cromosso­mos) maternos, paternos e filiais. Desta maneira, todos os alelos comuns entre a mãe biológica e seu filho são identificados e separados. De acordo com as leis de Mendel (frade austríaco que no século XIX estabeleceu as primeiras leis funda­mentais da genética) os alelos restantes têm de ser provenientes do pai biológico. Quando ocorre discordância entre os ale­los filiais e do suposto pai, diz-se que há uma exclusão de paternidade. No caso de uma correspondência entre os alelos filiais e do suposto pai, a nível de significância estatística, considera-se o suposto pai como pais biológico. Atualmente, para a investigação de paternidade pelo exame do DNA, somente são aceitas as sondas “single-locus”.

Informações técnicas adicionais po­dem ser obtidas através de publicações disponíveis em veículos éticos de divulga­ção (Mattos Filho JLP. “DNA possibilita investigar paternidade com segurança”. Jornal da Associação Paulista de Medi­cina, 371:7, 100088; Mattos Filho JLP. “O DNA e a busca da verdade”. Jornal do Advogado, 164:8-000, 10008000; Mattos Filho JLP. “A impressão digital do DNA como método de identificação médico-legal”. Arquivos Brasileiros de Medicina, 63(2):137-140, 10008000; Mattos Filho JLP. “DNA revoluciona investigação de pater­nidade”. Jornal do Advogado, 168:6, 10000000). A padronização internacional é muito recente e deve contribuir para me­lhorar sensivelmente a qualidade e compa­rabilidade dos dados obtidos. Considerável esforço está sendo feito para fazer chegar às mãos dos Magistrados brasileiros este grau de excelência técnica internacional, tão necessário e desejável quando se quer produzir uma prova técnico-pericial con­fiável e universalmente aceita.

III - O EXAME DO DNA E O CON-JUNTO DAS PROVAS PERI-CIAIS

O crescimento da realização de exames do DNA para investigação de pa­ternidade tem sido notável, embora não haja recomendação para o abandono de outros exames (notadamente o HLA), sempre que possível. Como Perito Judicial das Varas de Família e das Sucessões do Foro Central da Comarca de São Paulo (Foro Dr. João Mendes Jr.) tenho assis­tido a uma tendência de extremo bom senso, entre os Magistrados: a valorização do conjunto de provas periciais. Sob o prisma estritamente pericial não há dúvida que, isoladamente, não é possível discor­dar da precisão do resultado de um exame do DNA, a não ser que haja ausência de padronização ou erro técnico comprome­tedor do resultado ou outra prova pericial evidentemente conflitante. Mas, do ponto de vista jurídico, a conversa é outra. Usualmente, a parte que não concorda com o resultado do exame do DNA (devemos lembrar que, em casos de in­vestigações de paternidade não há em­pate), munida ou não de Peritos Assisten­tes, manifesta-se em contrário. Por melhor e mais elaborada, uma prova, somente, é sempre questionável, mormente em pro­cessos como os de investigação de pater­nidade, onde todos concordam na necessi­dade e valor da prova pericial hematoló­gica. Como se trata de matéria eminente­mente técnica e, nem sempre, os Peritos Judiciais são atenciosos em sanar as dúvi­das e quesitos existentes, a autoridade re­quisitante lança mão de outras provas para que se tenha convicção nos resultados ob­tidos. Por este conjunto de aspectos, há clara e plena tendência para a produção do conjunto de provas periciais hematológi­cas. Temos recomendado, visando a mo­dernidade a racionalização de custos, a execução do exame do HLA e do DNA, pois, como já colocado, caracterizam conjunto de provas periciais de grande so­lidez e credibilidade.

A aceitabilidade do exame do DNA é um fato consumado, respeitando as normatizações aqui já colocadas. Para que se possa entender, de maneira global, como uma evidência científica passa do laboratório de testes para a sala de audi­ência dos foros, lançamos mão de jusris­prudência internacional (Justiça dos Esta­dos Unidos da América), conhecida por enunciado de Frye (Frye versus Estados Unidos da América – proc. no 20003, fls. 1.013 e 1.014, 100023, Corte de Apelações do Distrito de Columbia; tradução livre): “Não é possível definir com clareza a li­nha divisória que separa o praticamente aplicável e o experimental, na produção de provas com novas tecnologias. Em al­gum lugar desta zona nebulosa, a força de um novo princípio científico tem que ser reconhecida, enquanto os tribunais prosse­guem admitindo a nova prova, decorrente de princípios cientificamente reconhecidos e produzidos por peritos idôneos e qualifi­cados. O objeto desta discussão necessita de estar suficientemente estabelecido para que, então, ganhe aceitação geral, relativa ao seu campo de utilização."

IV  - ALGUNS DADOS ESTATÍSTI-COS IMPORTANTES

A jurisprudência internacional, a respeito do uso do exame do DNA, é ex­tensa , com destaque para a cooperação e colaboração de cientistas de vários países, que buscam soluções para casos locais. Em termos de jurisprudência nacional, ainda dispomos de poucos elementos (vide ementa publicada no “Repertório IOB de Jurisprudência”, sob no 3/6725 (da 2a C Civ Isolada do TJ PA), e acórdão sob no 3/6224 (da 1a C Civ do TJ SC).)

Pode se ter uma noção nítida do im­pacto da introdução do DNA, nas investi­gações de vínculo genético, através da análise de alguns dados, provenientes do relatório anual da Associação Americana de Bancos de Sangue, que coleta dados de mais de 200 laboratórios credenciados, espalhados pelo EUA. Na tabela a seguir, podemos verificar o crescimento absoluto do número de vários testes para investiga­ção de vínculo genético.

Tabela I - Testes de investigação de pa­ternidade presentes no relatório da Associ­ação Americana de Bancos de Sangue (100088, 10008000 e 10000000); número de testes por tipo de exame e número total de testes (por ano).

ANO

TESTE REALIZADO

100088

10008000

10000000

Grupo Sangüíneo (antígenos eritrocitários)

64.642

80.65000

110.60001

HLA

68.72000

7000.854

103.00025

DNA

1.00008

10.203

36.676

Número Total de casos (em muitos casos foram feitos mais de um teste)

75.716

85.231

117.00052

Quando da análise da tabela acima, pode-se chegar a algumas conclusões rele­vantes. Há um crescimento absoluto de testes para investigação de paternidade, traduzido pelo aumento do número de ca­sos. Este aumento pode ser explicado, en­tre outras razões, pela introdução do DNA como elemento esclarecedor, gerando maior interesse nas pessoas com este tipo de problema. O aumento do número de testes, ao considerarmos os exames de HLA e DNA teve crescimento proporcio­nal. Fica evidente que a introdução do exame do DNA não agiu em detrimento dos outros testes. Pelo contrário, estes (HLA e grupo sangüíneo) também cresce­ram. Uma observação de impacto é feita quando analisamos a curva de crescimento do exame do DNA. Em três anos, a partir de 100088, seu número absoluto foi multi­plicado por vinte. Ao somarmos os testes, feitos nos três anos, com os resultados preliminares de 10000001, chegamos a mais de 50.000 exames de DNA. Em 10000000, o DNA esteve presente em um terço das in­vestigações de paternidade e em dez por cento delas foi utilizado como único exame.

A abordagem dos testes disponíveis para investigação de vínculo genético, no Brasil, deve ser realista. O exame do DNA continuará a ser empregado em ritmo crescente, mas fatores como custo e confiabilidade dos laboratórios serão de­cisivos na sua trajetória. Dados não ofici­ais revelam que cerca de mais de 200 tes­tes mensais, relativos à ações de investi­gação de paternidade, utilizando, princi­palmente, o exame do HLA e grupos san­güíneos, são feitos no Estado de São Paulo. A maioria destas ações envolve pessoas com posses limitadas, muitas de­las beneficiárias da Justiça Gratuita ou atendidas pela Procuradoria de Justiça do Estado, que não podem arcar com os cus­tos do exame do DNA e, na verdade, de qualquer exame. Raras são as instituições públicas que realizam, gratuitamente, tes­tes de paternidade mas, até o momento, não foi possível estender a toda a popula­ção o exame do DNA e, deve-se escrever com todas as letras, não se cogita trans­formar o exame do DNA em panacéia. No recente 8o Congresso Internacional de Ge­nética Humana (Setembro-Outubro de 10000001, Washington DC) houve consenso, em todas as sessões científicas, que os testes tradicionais (HLA, grupos sangüí­neos etc.) devem continuar a serem feitos e, até mesmo, aperfeiçoados. Este Perito Judicial tem defendido ardorosamente o conjunto de provas na investigação de vín­culo genético. Tenho a firme convicção de que o Perito deve ter domínio sobre todos os exames necessários e não ser um mero executor de provas de laboratório. O tra­balho de equipe, em larga escala, é fun­damental, pois, cada vez mais, a comple­xidade tecnológica, que é fonte da preci­são nos resultados, é conseguida com es­forço em pesquisa e grandes investimen­tos.

V - CONSIDERAÇÕES FINAIS

É imprescindível ressaltar que, em investigação de vínculo genético, cada caso é um caso. Não existem dois casos iguais. Não existem fórmulas preestabele­cidas e rígidas. Os Peritos Judiciais da área devem, juntamente com os Magistra­dos e Peritos Assistentes Técnicos das partes, estudar detalhadamente cada pro­cesso, para que seja possível, racional­mente, chegar-se ao exame ou teste espe­cífico para aquele processo.

Em nenhuma outra oportunidade houve colaboração da Medicina Forense de tal magnitude, como a colocação, à disposição da Justiça, de arma de grande utilidade e precisão, o exame do DNA.

DNA REVOLUCIONA INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE

Entrevista publicada no Jornal do Advogado, n°. 168, jan./fev. 10000000, pg. 6

Nesta entrevista ao Jornal do Advogado, o perito judicial em exame de vínculo genético, João Lélio Peake de Mattos Filho, fala sobre o DNA, um método revolucionário de identificação médico-legal, usado na identificação de paternidade.

Por REINALDO MESTRINEL

O que é DNA?

É uma sigla que significa ácido de­soxirri­bonucleico. É a própria essência do mate­rial genético que se recebe metade do pai, metade da mãe, e que passamos para frente quando temos filhos, descendentes. Desta forma, é possível identificar-se cer­tas regiões específicas do DNA em pes­soas e compará-lo com outro, para verifi­car se há vínculo genético entre eles. Esta é uma técnica nova, descrita em meados dos anos 80 e que vem penetrando cada vez mais em numerosos centros científicos de vários países

Como é feito este exame e qual é a origem do DNA?

Para fazer o exame é preciso obter, por exemplo, sangue das partes, e o pro­cedi­mento laboratorial empresa material im­portado e tecnologia avançada. A im­pres­são digital do DNA foi descoberta pelo cientista inglês Alec Jeffreys, através de princípios da Engenharia Genética. Um dos primeiros usos que se tem notícia em relação à justiça foi na identificação cri­minal de um estuprador, por meio da comparação de seu DNA com o DNA otido de uma mancha de sêmen na roupa da vítima. O caso ocorreu na Inglaterra, em 100085. Desde então, a imprensa digital do DNA vem sendo utilizada, também e principalmente, para investigação de vín­culo genético. O termo “impressão digi­tal” é empregado porque não se tem dois DNAs rigorosamente semelhantes (a não ser em gêmeos idênticos), à maneira da impressão digital clássica – mas o termo nada tem a ver com o recurso datiloscó­pico tradicional. Para que se possa aferir seu grau de precisão, basta dizer que a chance estimada de se obter a mesma im­pressão digital do DNA em indivíduos di­ferentes é de uma em 30 milhões – o que pode ser considerado desprezível em ter­mos de estatística.

Que tipo de método é empregado na identificação do DNA?

O DNA é extraído das células (utilizando, por exemplo, o sangue, como disse), e fragmentado em várias partes, por enzimas de restrição, separadas de acordo com asua cargas elétricas por ele­troforese em gel de agarose. O material obtido é transferido para uma membrana de nylon, através da técnica de “Southeren Blotting”. O passo seguinte e decisico é a colocação das sondas radioativas do DNA que ligam-se às regiões preferenciais, posteriormente reveladas através de filmes de Raio-X. O aspecto final é uma seqüên­cia de faixas (bandas), que compõem para cada pessoa. Com o método, pode-se se­lecionar regiões preferenciais da molécula de DNA e verificar qual é a origem dos seus componentes – (tração) se materna ou paterna. Para a verificação de paternidade são analisados os materiais da mãe, do fi­lho e do suposto pai. O resultado é in­questionável. É possível a identificação da impressão digital do DNA de natimortos, abortos e gestações interrompidas. O mé­todo é utilizado também na identificação de crianças trocadas ou seqüestradas.

O material empregado é impor­tado, sob rigoroso controle das au­toridade, qual a razão desse ri­gor?

O principal reagente utilizado neste exame são as denominadas sondas do DNA, que são elementos que detectam as regiões do DNA a serem analisadas, como acabo de explicar. Estas sondas são pro­duzidas por poucos laboratórios e sua co­mercialização é protegida por uma série de mecanismos. O laboratório que as uti­liza tem obrigatoriamente que possuir não só as vias de importação, mas mostrá-las quando exigido. A importação é feita dos Estados Unidos e da Inglaterra. Este rigor é justificado pelas implicações éticas que seriam provenientes do uso inadequado deste procedimento. Poderia ser obtido e usado, por exemplo, numa forma não-ética, investigando paternidade de pessoas que nada têm a ver com isso. Aqui cabe um apelo às autoridades brasileiras para que a importação de material necessário para a execução desse exame fosse facili­tada, pois da maneira como se encontra atualmente, devemos esperar um atraso tecnológico que nào seria desejável, já que temos no País pessoas gabaritadas para trabalhar a nível de laboratório, a fim de executar exames altamente confiáveis.

A Justiça brasileira utiliza em larga escala o sistema HLA (Human Leucocyte Antigen – antí­genos dos glóbulos brancos huma­nos), desenvolvido em 100052 e dis­ponível no Brasil há cerca de dez anos. Com a descrição do DNA, o HLA fica obsoleto?

Não. O sistema HLA é outro re­curso ainda insubstituível na investigação de vínculo genético. Tecnologicamente é mais simples em sua execução do que a impressão digital do DNA e vem pres­tando um valiosíssimo serviço à Justiça brasileira. Não há motivos para se acredi­tar que o HLA será substituído pela im­pressão digital do DNA. Acredito que para a investigação do vínculo genético, em nível populacional, o sistema HLA ainda é importante e, como disse, in­substi­tuível, por razões técnicas e de custo. Mesmo em países desenvolvidos prefere-se o HLA. É certo que o DNA representa um avanço. Mas as pessoas que defendem o abandono do HLA desconhe­cem verdades científicas básicas. Para se ter uma idéia da exatidaão e da utilidade em medicina do HLA, o seu uso é con­cernente aos transplantes: através deste sistema procura-se o doador mais ade­quado.

Qual é, então, a diferença entre HLA e DNA?

Duas situações básicas são decorren­tes de um estudo de esclarecimento de vínculo gnético nos processos desta natu­reza. A primeira delas é a exclusão da paternidade onde, com certeza absoluta, dizemos que o suposto pais A não é pais do filho B. Para este procedimento, o sis­tema HLA possui um poder de exclusão que é discretíssimamente inferior ao DNA. Isto é, para exclusão da paterni­dade, o HLA é equivalente à impressão digital do DNA. Outra situação é a não-exclusão. Pelo HLA, quando ocorre uma não-exclusão, pode-se falar em probabili­dade de paternidade com erros periciais que podem chegar a 0,1%. Nesta even­tualidade, utilizando-se do DNA, tem-se a certeza estatítica da paternidade. Percebe-se uma pequena superioridade, portanto, do DNA. A vantagem do DNA reside no seu enorme polimorfismo, pelo qual é virtualmente impossível encontrarmos ao acaso duas pessoas com a mesma estrutura de impressão digital do DNA.

Como os advogados podem lançar mão do sistema DNA?

Atualmente, o acesso ao exame de impressão digital do DNA é feito unica­mente pela iniciativa privada. Entretanto, não devemos nos esquecer que existem instituições públicas altamente capacitadas que executam a investigação de paterni­dade com o HLA. Em termos de perícia oficial, em nível de fórum central, temos usado a impressão digital do DNA em limitados casos em que houve dúvida quando se utilizou o HLA. Outra possibi­lidade em relação à investigação de vín­culo genético é a construção de árvores genealógicas comuns em casos de herança, onde o indivíduo já é falecido. Pode utili­zar primeiramente o HLA e, se necessá­rio, a impressão digital do DNA. A mai­oria das dúvidas versa sobre assuntos téc­nicos. Normalmente o perito é contratado pelo advogado e pode atuar como assis­tente técnico ou como parecerista. Em ambas as situações, o perito faz uma apreciação técnica do laudo já emitido e dá, por sua vez, seu parecer próprio. Seria ideal que o perito atuasse sempre como assistente técnico, pois desta forma acom­panharia todos os procedimentos periciais feitos pelo oficial e poderia até repeti-los, caso julgasse necessário. De certa forma, o número de peritos em investigação de paternidade é reduzido.◼

A IMPRESSÃO DIGITAL DO DNA COMO MÉTODO DE IDENTIFICAÇÃO MÉDICO-LEGAL

Artigo publicado nos Arquivos Brasileiros de Medicina, vol. 63, n° 2, mar./abr. 10008000, pg. 137

Resumo: O autor apresenta uma atualização a respeito de recente avanço tecno­lógico, denominado de “Impressão Digital do DNA”. Este método possibilita a identificação médico-legal a partir de materiais biológicos das mais diversas natu­rezas, praticamente sem margem de erro. Sua introdução no meio jurídico deu-se há aproximadamente três anos, sendo que a disseminação do método, que utiliza princípios de engenharia genética, está se fazendo com certa rapidez, devido à sua potencial exatidão.

De certa forma, a “Impressão Digital do DNA” vem complementar valiosamente os outros métodos já existentes (por exemplo: HLA, antígenos eritrocitários, etc.), com inegável colaboração à Justiça para esclarecimento da identidade de indiví­duos em casos de paternidade e também de certos crimes.

Unitermos: impressão digital do DNA; paternidade; identificação médico-legal; criminologia.

A Ciência Médica vem, através de sua história, decisivamente contribuindo para o desenvolvimento da Ciência Jurí­dica.

Especificamente, na área de verifi­cação de vínculo genético e identificação de tecidos, os primeiros progressos de­ram-se no início do século, com a desco­berta dos grupos sangüíneos(12), prosse­guindo com o importantíssimo advento do sistema HLA, no pós-guerra(3).

Este sistema está muito perto do ideal, pois preenche algumas característi­cas essenciais para utilização na identifica­ção de indivíduos, tais como: padrão de herança bem definida, estarem presentes nos indivíduos durante toda a vida, serem identificáveis por métodos, cujos resulta­dos possam ser rperoduzidos, apresenta­rem alto polimorfismo, e permitir o cál­culo de probabilidades, no caso de identi­ficação positiva(2).

Do ponto de vista médico, este exame é utilizado, primariamente, no campo da transplantação e estudo de do­enças genéticas.

Utilizado pela Justiça Brasileira, o sistema HLA é considera, até o momento, como o mais adequado no sentido da ve­rificação de peaternidade e casos correla­tos(6).

Notoriamente referendado por peri­tos e pela literatura internacionais(6,14,17), o sistema HLA foi, recentemente, objeto da única publicação atualizada, disponível no meio jurídico, tendo como autor o signa­tário deste artigo(15).

Como já colocado, embora os méto­dos usuais para verificação de vínculo ge­nético continuem adequados(5), a Ciência Médica, através do seu mais novo ramo, a Engenharia Genética, coloca nas mãos da Justiça a sua mais recente e revolucionária descoberta denominada de DNA Finger­prints(000,12,16), que pode ser traduzida por Impressão Digital do DNA.

Esclarece-se que o termo “Impressão Digital”, aqui empregado, nada tem a ver com o tradicional recurso dactiloscópico, referindo-se apenas ao fato que, à seme­lhança deste, não há duas estruturas de DNA iguais, quando avaliadas por este método.

Pelos dados da literatura, trata-se do primeiro teste conclusivo para o estabele­cimento da paternidade, pois a Impressão Digital do DNA possibilita virtualmente visualizar o material genético e comparaá-lo com o de pessoas diferentes.

Esta tecnologia avançada, também, pode ser aplicada em Criminologia, para identificar a proveniência, não só de san­gue, mas de outros materiais biológicos como provas (esperma, etc.).

Princípios técnicos

A metodologia empregada, descrita recentemente(10), visa a identificação do DNA do indivíduo.

Esse elemento, o DNA (ácido deso­xirribonucleico), é na essência o compo­nente mais íntimo da bagagem genética que recebemos de nossos pais, passamos aos nossos filhos, conservamos durante toda a vida, sendo o responsável pelo go­verno das funções biológicas dos diferen­tes órgãos e sistemas, pois está presente em todas as células do organismo.

O conjunto de moléculas de DNA compõe os cromossomos, que estão loca­lizados nos núcleos das células e arranja­dos aos pares.

A espécie humana possui 46 cro­mossomos, sendo uma metade de origem materna (23 cromossomos) e a outra me­tade de origem paterna. Como já colo­cado, cada cromossomo é composto por moléculas de DNA colocadas em cada se­qüência, única para cada indivíduo.

É possível, através deste método, selecionar regiões preferenciais da molé­cula de DNA do indivíduo e verificar qual é a origem dos seus componentes, se ma­terna ou paterna(11).

O DNA do indivíduo é extraído da suas células (utilizando, por exemplo, cé­lulas do sangue), fragmentado em várias partes por enzimas de restrição, separadas de acordo com suas cargas elétricas por eletroforese em gel de agarose, transfe­rindo-se o material obtido para uma mem­brana de nylon (através da técnica de Southern Blotting).

O passo seguinte, e decisivo, é a colocação das sondas radioativas de DNA que ligam-se às regiões preferenciais, posteriormente reveladas através de filmes de raio-x.

O aspecto final é o de uma seqüên­cia vertical de faixas (bandas), que com­põe a Impressão Digital do DNA (DNA Fingerprint), para cada indivíduo.

Aplicações e possibilidades

O exame para verificação da Impres­são Digital do DNA é feito utilizando-se uma quantidade pequena de sangue (5 ml), colhida de qualquer veia periférica, po­dendo, portanto, ser aplicado a crianças da mais tenra idade.

O sangue pode ser conservado à temperatura ambiental ( 22ºC) por al­gumas horas, até o início do teste.

Outros fluidos biológicos (sêmen) e também tecidos podem ser analisados, sendo necessárias algumas adaptações na técnica.

O tempo necessário para obtenção dos resultados é de cerca de três semanas.

A metodologia de obtenção da Im­pressão Digital do DNA foi utilizada pri­meiramente na Inglaterra, em 100085, em uma questão sobre migração(000). O caso envolveu um garoto nascido na Inglaterra, filho de pais nascidos no estrangeiro (Gana, na África). A mãe, um irmão e duas irmãs residiam na Inglaterra, en­quanto que o pai residia em Gana. Em certa ocasião o garoto foi em visita a seu pai, permanecendo certo tempo em sua companhia. Posteriormente, tentando re­tornar à Inglaterra, foi impedido pelas autoridades de migração, pois supeitou-se que o garoto tivesse sido substituído por outra pessoa. Neste caso, não só a pater­nidade, mas, também, a maternidade teve que ser provada, o que foi feito de forma decisiva, obtendo-se resultado positivo, e a reintegração do garoto, à sua família na Inglaterra, foi permitida.

Outro caso pioneiro, no terreno da criminologia, envolveu a identificação de um suspeito de estupro(4), onde o crimi­noso deixou uma mancha de esperma na roupa da vítima. A análise deste material pôde, sem sombra de dúvidas, demonstrar sua proveniência, o que foi aceito pela autoridade local, resultando em vários anos de prisão para o culpado.

Nos Estados Unidos da América a metodologia está à disposição da Justiça desde outubro de 100087, com vários casos em análise.

Um resumo das aplicações da meto­dologia da Impressão Digital do DNA é colocada a seguir(1,7,8,12,16).

  1. Verificação de paternidade

Para esta averiguação, os materiais ge­néticos da mãe, filho e suposto pai são analisados.

Primeiramente, todas as faixas (bandas) da mãe, com correspondência no filho, são identificadas e marcadas. As faixas (bandas) restantes, necessari­amente, têm de ter correspondência com as de origem paterna.

No caso de haver a presença, na cri­ança, das bandas resultantes do mate­rial genético do suposto pai, considera-se este como verdadeiro pai biológico (Fig. 1).

A exclusão ocorrerá quando não hou­ver correspondência entre as bandas do filho e do suposto pai (Fig. 1).

Desde que se obtenha material ade­quado (sangue, por exemplo), é possí­vel a identificação de natimortos, abortos e de gestações interrompidas.

Devido à extrema variabilidade da es­trutura do DNA, a probabilidade de se encontrar ao acaso duas pessoas com a mesma Impressão Digital do DNA é de um em cada 30 bilhões(16). Como a população da terra é estimada em 5 bilhões de pessoas (com 2,5 bilhões de homens) é virtualmente impossível que haja coincidência.

  1. Crianças trocadas na maternidade (ou seqüestradas)

Nestes casos temos as bandas resultan­tes do material genético da criança (filho) em discordância com as bandas dos falsos pais. Quando comparadas com a Impressão Digital do DNA dos verdadeiros pais haverá coincidência de bandas.

Como o material genético permanece inalterado, mesmo em casos em que a troca (ou seqüestro) já tenha ocorrido há muito tempo, é possível o esclare­cimento.

  1. Execução de árvores genealógicas para o estabelecimento do direito de herança

Também é uma aplicação viável, utili­zando-se do mesmo princípio do exemplo anterior desde que seja possí­vel ter acesso a material para análise de um mínimo de pessoas, embora, em ocasiões especiais, teoricamente seja possível a execução deste exame, mesmo com a falta do pai ou da mãe.

  1. Esclarecimento de crimes

Em vários casos, não é possível a ve­rificação da origem de certos materiais biológicos deixados no local do delito.

Em relação à Impressão Digital do DNA podemos comparar a amostra re­cuperada do local do crime, com aquela proveniente do suspeito, mesmo se tratando de amostras diferentes (sêmen versus sangue).

Conclusões

A cada ano, em centenas de proces­sos, necessitamos de um método adequado para identificação correta dos indivíduos. Quem é o pai da criança? A mancha de sangue achada na cena do crime pertence ao suspeito? A pessoa que reivindica a he­rança, realmente tem este direito?

Alguns instrumentos são disponíveis para que a finalidade da identificação seja possível, com destaque para o mais re­cente e específico deles, o sistema HLA, ainda insubstituível para certos eventos.

Todavia, o progresso da Medicina, associado com tecnologia de ponta, coloca nas mãos da Justiça a Impressão Digital do DNA, cujo lugar de destaque nas perí­cias judiciais está já reservado.

Como duas ciências irmãs, a Medi­cina e o Direito podem, como nunca, caminhar juntas, para que a promoção da Justiça, em um mundo conturbado como o nosso, se torne cada vez mais acessível ao componente básico da sociedade: o ser humano.

Summary

DNA fingerprint as method of medico­legal identification

The author presents an up-to-dating referring to a recent technologic advance, called “DNA Finger­print”. This method makes possible the medical-legal identification of biological materials from different individuals, almost without margin of error. It was introduced in the juridical envi­ronment about 3 years ago.

The diffusion of the method, that applies genetic engineering principles, is being done quickly, due to its potential precision. In such away, the “DNA Fingerprint” comes to complement the methods already existent (for example: HLA matching, erythrocytic antigens, etc.) with irrefutable colla­boration of Justice for the establishment of person identity in cases of paternity and also in certain crimes.

Uniterms: DNA fingerprint; paternity; medical-legal identification; criminology

Referências

1. The Bureau of National Affairs Inc – Legitimacy and Paternity Identification – “DNA Fingerprints”./ The Family Law Reporter, 13:1567, 100087

2. Council Report – Guidelines for Reporting Estimates of Probability of Paternity. J Am Med Ass, 253:320008, 100085.

3. DAUSSET J, NENNA A – Présence d’une Leucoaglutinine Dans Le Serun d’un Case d’Agranulocytose Chronique. Comptes Rendues des Séances de la Société de Biologie e des Filiales, 146:153000, 100052.

4. DODD BE – DNA Fingerprint in Matters of Family and Crime. Nature, 318:516, 100085.

5. DODD BE, LINCOLN PJ – Testing Paternity: Traditional Methods Usually Adequate. Brit Med J, 10005:1435, 100087

6. FORREST MF – The Legal Implications of HLA Testing for Paternity. J Family Law, 16:537-541, 100077-78.

7. GILL P, JEFFREYS AJ, WERRET D – Forensic Application of DNA Fingerprint. Nature, 318:577-578, 100085.

8. GILL P, JEFFREYS AJ, WERRET D – An Evaluation of the Forensic Use of Genetic Fingerprint. Electrophoresis, 8:10001-10004, 100086.

000. JEFRREYS AJ, BROOKFIELD FY, SEMEONOFF R – Positive Identification on an Immigration Test Case. Using Human DNA Fingerprint. Nature, 317:818-81000, 100085.

10. JEFFREYS AJ, WILSON V, THIEN SL – Hypervariable Minisatellite Regions in Human DNA. Nature, 314:63-73, 100085.

11. JEFFREYS AJ, WILSON V, THIEN SL – Individual Specific Fingerprint of Human DNA. Nature, 316:76-7000, 100085.

12. KELLY KF, RANKIN JJ, WINK RC – Method and Applications of DNA Fingerprint: A Guide for Non-Scientist. The Criminal Law Review, fevereiro:105-110, 100087.

13. MARCELLI A, PREVOST P – HLA et Médecine Légale. In: HLA 100084 Complexe Majeur d’Histocompatibilité del’Homme. J. Dausset et M Pla eds. Flammarion Médecine-Sciences, Paris, p. 305, 100083.

14. LANDSTEINER K – Uber Agglutina-tionreischeinungem Normalen Menslichen Blutes. Wien Klin Wochenschr, 14:1132, 100001.

15. MATTOS FILHO JLP – Investigação de Paternidade: Considerações Sobre Aplicação da Metodologia HLA. Rev. Tribunais, 607:252-25000, 100086.

16. MERZ B – Medical News and Pers-pectives. DNA Fingerprint Come to the Court. J Am Med Ass, 25000:210003-210004, 100088

17. TERESAKI PI – Resolution by HLA Testing of 1000 Cases Not Excluded by ABO Testing. J Family Law, 16:543-556, 100077-78.

DNA POSSIBILITA INVESTIGAR PATERNIDADE COM SEGURANÇA

Artigo publicado no Jornal da APM - Associação Paulista de Medicina, set. 100088, n°. 371, pg. 1

Os processos de investigação de pa­ternidade, que congestionam tribunais de Justiça em todo o mundo, acabam de ob­ter, através dos avanços da Medicina, um aliado poderoso para a realização de perí­cias rigorosamente seguras. Trata-se de um método revolucionário para a identifi­cação de tecidos, a partir do qual é possí­vel estabelecer com precisão absoluta vínculos genéticos para efeito de investi­gações de paternidade e criminal, e cons­trução de árvores genealógicas. Desen­volvido pelo cientista inglês Alec Jeffreys, através de princípios da Engenharia Gené­tica, um dos ramos mais desenvolvidos da ciência médica, o novo método possibilita virtualmente ver o material genético das pessoas, isto é, o DNA. Este elemento, o DNA (ácido desoxirribonucleico), é o componente mais íntimo da bagagem ge­nética. Está presente em todas as células do organismo e é responsável pelo go­verno das funções biológicas dos diferen­tes órgãos e sistemas. Esta metodologia foi denominada de “Impressão Digital do DNA”.

O termo “impressão digital” nada tem a ver com o recurso datiloscópico tradicional. Mas foi adotado porque, à semelhança deste, não há duas estruturas de DNA iguais, quando avaliadas por este método. Para que se possa aferir seu grau de precisão, basta dizer que a chance es­timada de se obter a mesma impressão digital do DNA em indivíduos diferentes é de uma em 30 bilhões.

Enquanto os demais métodos de in­vestigação de vínculo de paternidade utili­zam apenas o sangue para suas análises, o DNA trabalha com outros tipos de mate­rial biológico, além deste, como esperma e raiz de cabelo, por exemplo.

As primeiras publicações sobre o método descrito por Alec Jeffreys datam de 100085, e foram difundidas inicialmente na Inglaterra. A partir de outubro de 100087, a mesma metodologia passou a ser utilizada nos Estados Unidos. Os dois paí­ses são os únicos centros em condição de realizar os exames para obtenção da Im­pressão Digital do DNA. Mas o Brasil pode ter acesso ao método, através do médico João Lélio P. de Mattos Filho, professor colaborador da Escola Paulista de Medicina e pós-graduado na disciplina de “Imunologia” pela mesma instituição. Lélio de Mattos é também perito médico para casos de esclarecimento de vínculo genético. Em 100087, ele conheceu Jeffreys na Inglaterra e, “a partir desse contato, ficou aberto um canal para envio de ma­terial a uma sucursal norte-americana dos laboratórios do cientista”, informa João Lélio.

Teste conclusivo

A metodologia empregada visa a identificação do DNA. O conjunto de moléculas de DNA compõe os cromosso­mos, que estão localizados nos núcleos das células e arranjados aos pares. A espécie humana possui 46 cromossomos, sendo uma metade deles de origem materna, e a outra, de origem paterna. Cada cromos­somo é composto por moléculas de DNA dispostas em seqüência única para cada indivíduo.

Lélio de Mattos explica o método: “O DNA é extraído das células (utilizando-se o sangue, por exemplo), e fragmentado em várias partes, por enzi­mas de restrição, separadas de acordo com suas cargas elétricas por eletroforese em gel de agarose. O material obtido é trans­ferido para uma membrana de nylon, atra­vés da técnica de “Shouthern Blotting”. O passo seguinte, e decisivo, é a colocação das sondas radioativas de DNA que ligam-se às regiões preferenciais, posteriormente reveladas através de filmes de Raio X. O aspecto final é o de uma seqüência de fai­xas (bandas), que compõem uma impres­são digital do DNA para cada pessoa. Através do método, pode-se selecionar regiões preferenciais da molécula de DNA e verificar qual é a origem dos seus com­ponentes – se materna ou paterna”.

Para a verificação de paternidade, são analisados os materiais da mãe, do fi­lho e do suposto pai. “Primeiramente, to­das as faixas (bandas) da mãe, com cor­respondência no filho, são identificadas e marcadas. As faixas restantes necessaria­mente têm de ter correspondência com as de origem paterna. No caso de haver a presença, na criança, das bandas resultan­tes do material genético do suposto pai, considera-se este como verdadeiro pai bio­lógico. A exclusão ocorrerá quando não houver correspondência entre as bandas do filho e as do suposto pai. E o resultado é inquestionável”, assegura João Lélio de Mattos.

O exame para verificação da impres­são digital do DNA é feito utilizando-se uma pequena quantidade de sangue (5 ml) colhida de qualquer veia periférica. O material pode ser conservado à tempera­tura ambiente (em torno de 22ºC), por algumas horas, até o início dos testes, e os resultados são obtidos em cerca de três semanas. Outros fluidos biológicos (sêmen) e também tecidos podem ser ana­lisados, sendo necessárias algumas adapta­ções à técnica. Por suas características, o teste pode ser aplicado até em crianças re­cém-nascidas, desde que seja possível a obtenção de material adequado, é possível a identificação da impressão digital do DNA de natimortos, abortos e gestações interrompidas.

Outras utilizações

O teste é útil também na identifica­ção de crianças trocadas ou seqüestradas. “Nestes casos, o método revela ou exclui a concordância entre as bandas genéticas do filho, em correspondência com as ban­das dos pais. Como o material genético permanece inalterado durante toda a vida, mesmo os casos em que a troca ou seqües­tro ocorreram há muito tempo podem ser resolvidos”, esclarece João Lélio.

A execução de árvores genealógicas para o estabelecimento do direito de he­rança também é beneficiada por essa téc­nica. Teoricamente, em alguns casos é possível a execução do exame mesmo com a falta do pai ou da mãe. “Basta ter acesso a material de análise de um número mí­nimo de pessoas”, garante João Lélio. Com relação a perícias para esclareci­mento de crimes, o médico brasileiro in­forma ser possível comparar a amostra de materiais biológicos deixados no local dos fatos, com amostras provenientes do pró­prio suspeito, mesmo em se tratando de substâncias diferentes, como sangue ver­sus sêmen.

Em virtude de ser muito novo e de custo bastante elevado, o teste ainda não está sendo utilizado rotineiramente. “Por ora, o sistema HLA (Human Leucocyte Antigen), descrito em 100052 e disponível no Brasil a cerca de dez anos, atende satis­fatoriamente às exigências da grande maioria dos casos em curso na Justiça, oferecendo índices de certeza da ordem de 0000% sobre a probabilidade de paternidade. No entanto, devido ao poder de identifica­ção incontestável da técnica de impressão digital do DNA, futuramente esse teste ocupará lugar de destaque nas perícias ju­diciais”, garante João Lélio de Mattos.

INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE COM

SUPOSTO PAI FALECIDO

ATUALIZAÇÃO MÉDICO-PERICIAL - DESCRIÇÃO DOS PRIMEIROS CASOS BRASILEIROS EMPREGANDO O EXAME DO DNA POSSIBILIDADES E LIMITAÇÕES

Obra publicada na Revista dos Tribunais, vol. 722, pg. 35000-64, dez. 10000005

I. INTRODUÇÃO

As ações de investigação de paternidade são, de certa forma, freqüentes nas Varas Cíveis e da Família e das Sucessões. O que se observa, na maioria dos casos, é um menor, representado pela sua genitora, movendo uma Ação de Investigação de Paternidade cumulada com Alimentos, contra um indivíduo apontado como suposto pai. Para solucionar estes casos, do ponto de vista biológico pericial, o Magistrado, em certa etapa do processo, nomeia um Perito de sua confiança que vai realizar os exames que forem convenientes para a elucidação do vínculo genético em questão. Até o final da década de oitenta a Ciência Médica dispunha dos clássicos testes, envolvendo os antígenos eritrocitários (ABO, Rh, Kell, Duffy, MNSs, entre outros, também denominados de série vermelha, estão entre os principais e mais conhecidos) e do exame do HLA (Human Leukocyte Antigen). Aplicando, simultaneamente, os dois tipos de exames - avaliação de antígenos eritrocitários e o exame do HLA - é possível a exclusão de cerca de 0000% dos falsos pais biológicos, nos casos em que o suposto pai está vivo e disponível (Salaru 10000003 e 10000003a). Quando ocorre a não exclusão, o cálculo da probabilidade de paternidade vai ser variável conforme a constelação genética do indivíduo testado (Borowsky 100088).

O advento do exame do DNA, no início da década de noventa, proporcionou um avanço significativo em certas eventualidades, principalmente quando as probabilidades de paternidade, calculadas através de testes convencionais, eram baixas ou de magnitude insuficiente para que a paternidade biológica fosse claramente estabelecida. Deve-se ter em mente que o exame do DNA exclui, praticamente, 100% dos falsos pais biológicos, e possibilita o cálculo da probabilidade de paternidade sempre em valores acima de 000000,000% (Morris 10000001).

O exame do DNA já se encontra padronizado em seus procedimentos técnicos (American Association of Blood Banks 10000000, Baird 10000003) e se encontra validado pela Justiça e plenamente aceito em vários países (Bureau of National Affairs 100087, Hicks 100088, Marx 100088, U.S. Congress - Office of Technology Assessment 10000000), contando, inclusive, com manifestações expressivas da Magistratura brasileira (Silva Filho 10000000), com Jurisprudência estabelecida (Fonseca 10000004) e literatura nacional extensa (Mattos Filho 100088, 10008000, 10008000a, 10000000, 10000002 10000002a).

De posse desta ferramenta de alta tecnologia e poder de resolução sem precedentes foi, então, possível a elucidação de casos complexos de investigação de paternidade, inclusive aqueles em que o suposto pai encontra-se falecido (ou não se encontra disponível para o teste).

II. FUNDAMENTAÇÃO TÉCNICA

Na investigação de paternidade com suposto pai falecido os testes convencionais (antígenos eritrocitários e exame do HLA) exibem certas deficiências, inerentes às suas características técnicas, tornando-os de relativo valor nestes casos. O exame do DNA, devido ao insuperável polimorfismo de seus marcadores, tem se mostrado de grande utilidade, mesmo quando não dispomos do suposto pai. O polimorfismo é traduzido pela variabilidade da distribuição de marcadores genéticos na população; quanto mais variado o polimorfismo, maior é a precisão do sistema na definição de um determinado vínculo genético

Uma breve noção de genética forense é necessária para um entendimento satisfatório do tema. O DNA (ácido desoxirribonucleico), é o âmago do material genético do indivíduo e está localizado no núcleo de todas as células do organismo, estruturando os cromossomos. A espécie humana possui 46 cromossomos, arranjados aos pares, sendo uma metade de origem materna e a outra metade de origem paterna. Os genes são os elementos que compões os cromossomos e são os responsáveis pela definição dos caracteres genéticos de cada indivíduo, sendo que concorrem, para esta definição, sempre dois genes, um de origem materna e outro de origem paterna, que recebem a denominação de genes alelos. Desta maneira, quando a investigação de paternidade é feita com o suposto pai vivo, procede-se da seguinte forma: são identificados os alelos da criança e da mãe e são separados os alelos em comum (alelos filiais de origem materna). Os alelos restantes (alelos filiais de origem paterna) têm, obrigatoriamente, de ser originados do pai biológico. Caso haja coincidências entre os alelos paternos presentes na criança e aqueles alelos verificados no indivíduo testado, a paternidade é atribuída com certeza biológica e estatística. Caso contrário, quando ocorre uma discordância entre os alelos de origem paterna da criança e aqueles verificados no indivíduo testado, estaremos diante de uma exclusão da paternidade biológica.

Nas investigações de paternidade com suposto pai falecido os princípios são os mesmos, com algumas variantes. Temos dois caminhos a seguir. O primeiro, e preferencial, é estudarmos a prole do suposto pai falecido, juntamente com a viúva (a quem denominamos de família original). É plenamente possível, através do estudo dos descendentes, chegarmos à reconstituição dos alelos paternos (denominada de reconstrução reversa da árvore genealógica) e , desta forma, compará-los com os alelos de origem paterna do reclamante da paternidade. O respaldo deste procedimento, em termos de suporte bibliográfico é bastante sólido (Di Leonardo 100084, Darlu 100085, Lenhart 100088, Odeberg 100088, Boonlayangoor 10008000,Smith 10008000, Yokoi 10000000, Helminen 10000001, Bockel 10000002, Brenner 10000003, Yassourides 10000003). Usualmente, em se tratando de indivíduo vivo, a melhor fonte de DNA é o sangue, mesmo em pequena quantidade (2,5ml, não mais). Uma simples coleta de sangue, então, é adequada para fornecer material para o teste. Outros materiais (cabelo, unhas) são imprestáveis pois tratam-se de tecidos desvitalizados, desprovidos de DNA para este tipo de análise,

Embora a constituição genética seja individual para cada pessoa, meio-irmãos por parte de pai terão, certamente, alelos paternos em comum, o que viabiliza o cálculo da probabilidade destes alelos de origem paterna serem provenientes da mesma pessoa. Devido ao alto poder de definição do exame do DNA, temos, usualmente, encontrado valores acima de 000000% de probabilidade de paternidade, nos casos em que analisamos. Idealmente, quanto maior o número de descendentes vivos que compõe a família original, maior é a probabilidade de êxito na definição da vinculação genética. Como partimos sempre da premissa de que os descendentes da família original são, realmente, filhos biológicos do pai falecido, é conveniente incluir no estudo algum ascendente do pai falecido (a mãe ou o pai ou ambos, se disponíveis e de acordo com a permissão da autoridade requisitante, pois nem sempre estas pessoas fazem parte da lide). Investigações tendo somente os avós vivos (mãe e pai falecidos) resultaram em conclusões biológicas surpreendentes (Diamond 100087, Penchaszadeh 10000002). Para a execução do exame do DNA, nos casos em que é possível a análise da família original, é utilizado um conjunto de sondas unilocais. Esta sondas são os elementos que localizam , nos cromossomos, os alelos dos participantes da análise.

A outra forma de abordagem é pela exumação do suposto pai e posterior tentativa de encontrar DNA viável para o estudo. Vários fatores colaboram para a dificuldade do isolamento do DNA, nestas condições (decomposição do material biológico "post-mortem", fatores físicos - temperatura, umidade, condições de luminosidade - e contaminação por bactérias saprófitas), embora existam alguns relatos de sucesso (Jeffreys 10000002). A esqueletização de um corpo está plenamente estabelecida decorridos cerca de dez a quatorze meses após o sepultamento, com todas as conseqüências sobre a matéria biológica e sua viabilidade para testes de qualquer natureza, o que nos dá uma noção da dificuldade deste procedimento. Cabelos, unhas e outros materiais desvitalizados não contém DNA e, portanto, são imprestáveis para análise. Destarte, consideramos este procedimento como exceção, reservando-o para eventualidades onde não existam quaisquer parentes vivos do suposto pai falecido. Desde que a exumação seja o único meio de tentar elucidar o caso aconselhamos que sejam obtidos ossos longos (ex: fêmur, tíbia, ulna, etc.), pois o DNA a ser isolado encontra-se no interior destes ossos (mais precisamente na medula óssea). Lembremo-nos de que os ossos não são maciços como um cabo de vassoura, mas possuem um canal longitudinal onde se aloja a medula óssea, rica em células que podem servir de fonte de DNA; da culinária tiramos o exemplo do "ossobuco" ou tutano que nada mais é do que a medula óssea, bovina, por suposto, servida em nossas mesas. As peças exumadas devem ser acondicionadas em sacos plásticos a serem lacrados, indo no interior de um recipiente de conservação térmica (ex: caixa de isopor de dimensões apropriadas) que será colocada sob refrigeração (não congelar!). Para o transporte é conveniente a colocação de gelo reciclável dentro do recipiente térmico, em quantidade suficiente para manter a refrigeração até que o transporte esteja concluído. A utilização do gelo reciclável justifica-se, pois este material não tem o inconveniente do gelo comum, que pode derreter e umedecer o material exumado, comprometendo sua viabilidade. Feito isto, procede-se à lacração do recipiente térmico e está pronto para o transporte, com durabilidade garantida pelo tempo suficiente para que chegue em boas condições ao laboratório. Na análise do DNA de material exumado são aplicadas ferramentas biológicas de altíssimo poder de resolução. O recurso do PCR (Polymerase Chain Reaction ou reação em cadeia da polimerase) é o mais adequado, possibilitando que sejam detectados fragmentos de DNA em restos teciduais já degradados. O PCR nada mais é do que um amplificador de DNA, de tamanho poder discriminatório que torna viável a análise do DNA de um único espermatozóide. Nos casos em que não há necessidade de exumação a utilização do PCR é desnecessária, pois a quantidade de DNA presente nas amostras de sangue é suficiente para que os perfis genéticos sejam estabelecidos. Deve ser considerado que a aplicação deste conjunto de recursos de biologia molecular de última geração tem sua repercussão nos custos do teste.

III. CASUÍSTICA BRASILEIRA

Entre julho de 10000002 e julho de 10000004 atuamos em dezesseis casos de investigação de paternidade. Na Tabela I são colocadas as principais características dos casos, com a óbvia omissão das identificações pessoais e detalhes do processo, pois se tratam de ações protegidas por Segredo de Justiça, o que não incorrerá em nenhum prejuízo para a compreensão dos aspectos técnicos e periciais relativos a cada caso.

AUTORES

REQUERIDOS

Pp

menor com mãe

dois maiores com mãe

000000,0005%

menor com mãe

mãe e pai do suposto pai falecido

000000,0002%

menor com mãe

três menores com mãe

0,0%

menor com mãe

irmã do suposto pai falecido

0001,0000%

menor com mãe

quatro maiores com mãe

000000,000000%

maior com mãe

três menores com mãe

0,0%

maior

maior com mãe

85,7%

dois menores com mãe

um maior

000000,1% p/ambos

dois maiores com mãe

três maiores com mãe

0003,000000% e 0008,83%

dois maiores com mãe

dois menores com mãe

000000,000000% p/ambos

três maiores com mãe

menor com mãe

000000,6000%

três maiores com mãe

maior com mãe

000000,71%

menor com mãe

dois maiores com mãe

000000,82%

maior com mãe

material exumado

000000,71%

menor com mãe

três maiores com mãe

0,0%

maior com mãe

sete maiores com mãe

000000,000000%

Tabela I. Nesta tabela pode ser apreciada, na coluna da esquerda, os autores dos processos, juntamente com os respectivos representantes; na coluna central estão colocados os requeridos e na coluna da direita as probabilidades de paternidade (Pp) encontradas.

IV. RESULTADOS

Dos dezesseis casos analisados, em doze a atuação foi como Perito Judicial e em quatro foi como Perito Assistente. A exumação foi necessária em apenas um caso (6,25%), confirmando os dados de literatura que a colocam como procedi­mento de exceção (Mattos Filho 10000002a). Neste caso a probabilidade e paternidade foi de 000000,71%. De todos os dezesseis ca­sos, foi verificada a exclusão de paterni­dade em três (18,75%). Nos quinze casos restantes, que foram analisados sem neces­sidade de exumação, em um deles foi analisada a irmã do suposto pai, obtendo-se 0001,0000% de Probabilidade de Paterni­dade, em outro havia apenas o reclamante sem a mãe, testado contra seu provável meio-irmão por parte de pai, cuja mãe estava viva e que resultou em 85,7% de Probabilidade de Paternidade (caso de grande dificuldade técnica). Nos casos restantes (dez ações, sendo que em cinco havia mais de um reclamante da paterni­dade), onde a inclusão da paternidade foi determinada e o(s) reclamante(s) da pater­nidade tinha(m) a mãe viva, envolvendo dezessete reclamantes (autores), a Proba­bilidade de Paternidade foi maior do que 000000% para quinze reclamantes (88,23%). Nos dois casos restantes a Probabilidade de Paternidade foi de 0003,000000% em um e 0008,83% em outro (coincidentemente dois irmãos reclamantes da mesma paterni­dade).

V.CONCLUSÕES

A utilização do exame do DNA para o esclarecimento de casos de investi­gação de paternidade envolvendo suposto pai falecido trouxe elementos periciais de­cisivos, resultando em grande precisão na definição da paternidade biológica. Na maioria dos casos, incluindo-se aquele em que foi necessária a exumação, foi possí­vel a obtenção de probabilidades de pater­nidade com valores que não seriam possí­veis com a utilização dos testes conven­cionais.

A introdução de tecnologias de ponta em certos setores de atividade pro­porcionou avanços consideráveis. Em se tratando de casos complexos de investiga­ção de vínculo genético, com suposto pai falecido, praticamente insolúveis antes do advento do exame do DNA, atualmente são plenamente exequíveis. Os valores aqui encontrados não deixam qualquer margem de dúvida com relação a estas possibilidades.

Desta forma, a união de objetivos e esforços da área Médico-Científica con­vergiu para benefício da nobre Ciência do Direito, ambas irmanadas no mesmo sen­tido de buscar a verdade biológica, que traduzida para a área jurídica significa a ampliação dos horizontes em busca de sua finalidade última e máxima: a Justiça.

Autor: Dr. João Lélio Peake de Mattos Filho, é médico graduado e pós-graduado pela Escola Paulista de Medicina e Perito Judicial para casos de Investigação de Paternidade há dez anos, atuante no Foro Central de São Paulo, bem como em Foros Regionais, Distritais, outras Comarcas e, também, outros Estados da Federação; é membro atuante da Associação dos Peritos Judiciais do Estado de São Paulo, sendo o autor que mais tem publicado trabalhos a respeito, presentes nas referências bibliográficas deste ensaio.

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ATUALIZAÇÃO MÉDICO-JURÍDICA

INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE INTRA-ÚTERO

Obra a ser publicada pelo Instituto dos Advogados de São Paulo

1- INTRODUÇÃO

A) ASPECTOS JURÍDICOS

Os direitos do nascituro têm sido objeto, através dos tempos, de grande discussão, embora as suas bases jurídicas tenham sido estabelecidas com toda a sua clareza há, relativamente, pouco tempo. Cito, preliminarmente, o que estabelece a Dra. Silmara J. A. Chinelato e Almeida em seus trabalhos: "O Nascituro no Código Civil e no Direito Constituendo no Brasil (Projeto do Código Civil e Projeto de Constituição Federal)", in "Revista de Direito Civil", n. 44 (abril/junho 100088, pág. 181) e em "O Direito de Família e a Constituição de 100088", Editora Saraiva, 10008000, Coordenador Carlos Alberto Bittar, pág. 41, do qual transcrevo: "Do ponto de vista biológico, não há dúvida de que a vida se inicia com a fecundação do óvulo pelo espermatozóide, resultando um ôvo ou zigoto. Assim o demostram os argumentos colhidos na Biologia. A vida viável começa, porém, com a nidação, quando se inicia a gravidez; o embrião ou feto representa um ser individualizado, com uma carga genética própria, que não se confunde nem com a do pai, nem com a da mãe."

A mesma douta autora, em seu "Direito do Nascituro a Alimentos - Uma Contribuição do Direito Romano", na "Revista de Direito Civil", n. 54/52-60, estabelece com clareza a paridade entre nascituro e nascido quanto a alimentos (pág. 55): "No nosso modo de ver, ao nascituro são devidos alimentos em sentido lato - alimentos civis - para que possa nutrir-se e desenvolver com normalidade, objetivando o nascimento com vida."

Ainda com manifestação brilhante sobre o mesmo tema, surge o trabalho de Professor Mário Aguiar Moura, "Legitimidade do nascituro para investigar a paternidade" publicado na "IOB, Repertório de Jurisprudência", quinzena de fevereiro de 10000001, n. 3/ 0001, pág. 63: "Nada conspira contra a possibilidade de a mãe que traz o filho concebido, ou o curador nomeado, caso aquela não possa exercer o direito, promova a ação de representação do nascituro. A objeção que se tem manifestado de que não é possível a ação, porque está ausente a personalidade não procede. Nessa linha de raciocínio estaria igualmente o reconhecimento voluntário, através de um ato jurídico, de que o nascituro é parte na relação que se constitui."

Como derradeiro e ilustrativo exemplo, cito o Acórdão proferido pela Primeira Câmara Civil de Férias do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (Apelação Cível n. 10003.648.1) cujo relator foi o D.D. Desembargador Dr. Renam Lotufo (Investigação de Paternidade - Ação proposta em nome de nascituro pela mãe gestante. Recurso contra sentença que extinguiu o processo por ilegitimidade ativa. - Provimento. Superveniente nascimento com vida). Neste Acórdão, por votação unânime, foi dado provimento ao referido recurso.

Ora, com todos este elementos citados, de nada adianta o embasamento e ordenamento jurídico sobre o tema, se não há uma forma diagnóstica da paternidade intra-útero que possa ser empregada o mais precoce possível durante a gestação. O que se busca, então, é a determinação da paternidade biológica ainda antes do nascimento (na verdade o quanto mais precoce melhor) para garantir os direitos do nascituro, que seja segura para o binômio gestante/feto e que seja inequivocamente precisa na determinação de seus resultados. Neste contexto, o exame do DNA, feito através da obtenção da amostra de vilo corial, vem de encontro a todas as expectativas da Justiça. No tópico a seguir são detalhadas as bases e fundamentação do exame do DNA, bem como seus princípios na aplicação intra-uterina deste teste.

B) ASPECTOS MÉDICO-PERICIAIS

A investigação de paternidade, também denominada investigação de vínculo genético, vem sofrendo considerável progresso, nos últimos tempos. Embora os primórdios teóricos da genética tenham sido enunciados no século passado, através dos estudos clássicos do frade austríaco Gregor Mendel (1822-1884), na verdade, sua bases científicas remontam ao início do século, com a descoberta dos grupos sangüíneos ABO por Landsteiner (100001), seguidos pela descoberta, mais tarde, do fator Rh por Wiener e colaboradores (100040).

Um grande impulso foi dado com a descoberta do sistema do HLA (HLA-human leucocyte antigen) pelo grupo do professor francês, Dr. Jean Dausset (100052). Esta última descoberta possui sua aplicação no campo médico relacionada aos transplantes, pois trata-se do exame empregado para se avaliar a compatibilidade que existe entre um doador e um receptor de órgãos. Devido a seu grande polimorfismo (variabilidade de tipos e distribuição de marcadores em uma população) o exame do HLA, durante vários anos, prestou inestimável serviço para a Justiça, auxiliando nas investigações de vínculo genético, proporcionando um bom índice de exclusões da paternidade, embora, algumas vezes, quando das não exclusões, o cálculo das probabilidades de paternidade fossem pouco precisas.

Com a recente introdução da tecnologia para o estudo da molécula de DNA, para fins de estudo de vinculação genética (Jeffreys e colaboradores, 100085) foi dado o mais importante passo na dire­ção de termos um exame biologicamente decisivo, tanto para os casos de exclusão, quanto para os casos de não exclusão (que passaram a ser denominados de inclusão de paternidade, tamanha a sua precisão na determinação da vinculação genética). O elemento decisivo para a aplicação desta revolucionária tecnologia reside nas de­nominadas "sondas", que são os elementos que detectam, como mísseis teleguiados, as regiões cromossômicas entre as pessoas estudadas e comparam suas seqüências de determinantes genéticos.

Inicialmente, nos estudos de Jeffreys foram utilizadas sondas multilo­cais, que, posteriormente, revelaram certas deficiências e foram substituídas pelas sondas unilocais, que são as prefe­rencialmente aceitas pela Justiça de países do primeiro mundo (caso dos EUA). Os fundamentos para compreensão da inter­pretação do exame do DNA são razoavel­mente simples. O DNA (ácido desoxirri­bonucleico) é o componente mais íntimo do nosso material genético e que forma os cromossomos, localizados no núcleo das células do organismo. A espécie humana possui 46 cromossomos, arranjados aos pares, sendo uma metade (23 cromos­somos) de origem materna e a outra me­tade (23 cromossomos) de origem paterna, que são resultantes da fecundação, repre­sentada pela união do gameta feminino (óvulo) com o gameta masculino (espermatozóide). Os genes, por sua vez, são segmentos cromossômicos de tamanho variável. Para que seja possível a expres­são de certos caracteres específicos é ne­cessária a cooperação dos genes paternos e maternos, que passam a ser denominados de genes alelos ou, simplesmente, alelos. Nestes caracteres, por suposto, é possível separar os componentes maternos dos pa­ternos. Desta maneira, estudando um trio (mãe, criança e suposto pai), são compa­rados e separados os alelos maternos com os alelos filiais de origem materna. Os alelos restante têm, obrigatoriamente que ser provenientes do pai biológico. Caso haja correspondência entre os alelos filiais de origem paterna e aqueles presentes no suposto pai, a paternidade é comprovada com certeza biológica e estatística. Caso contrário, se ocorre discordância entre os alelos filiais de origem paterna e os verifi­cados no suposto pai, a paternidade está excluída. A principal propriedade que torna o exame do DNA um instrumento de inigualável precisão para a investigação vínculo genético é o seu polimorfismo de altíssima amplitude, impedindo que haja indivíduos com a mesma construção alélica e que possam ser confundidos com o pai biológico verdadeiro.

A aceitação de evidência desta magnitude foi rapidamente avaliada e aceita por vários países (Dodd 100085, Lomax 100086, Hicks 100088, Kobilinsky et al. 100088, Freckelton 10000000, Gottschall 10000001, Americam Association of Blood Banks, 10000000) incluindo o Brasil (Mattos Filho, 100088, 10008000, 10008000a, 10000000, 10000000, 10000002a). Destaca-se a manifestação da comunidade jurídica, através do brilhante artigo de Silva Filho, publicado na "RT", n. 655/54-65, 10000000. Com relação à literatura científica internacional, no que concerne à investigação intra-útero, são encontradas escassas referências, embora a validação da técnica esteja bem estabelecida (Ishiyama 100088, Jiang 10008000, Kovacs 10000000, Mosinger 10000000, Sprecher 10000000, Lobiani 10000001). Assim sendo, de posse desta ferramenta de alta tecnologia, outros setores da Medicina Legal também experimentaram um avanço significativo. Na área criminal, a identificação de pessoas através de diminutas manchas de sangue ou esperma, até então impossível de ser feita, tornou-se rotina. Mas foi, na verdade, na investigação de paternidade que os reflexos foram os mais espetaculares. Usualmente, quando abordamos este assunto, o cenário mais comum que nos vem à mente é o de uma criança que, representada pela mãe, move uma ação de investigação de paternidade contra certo indivíduo. Porém outras situações bem mais complexas e pouco usuais podem ocorrer, tais como investigação de paternidade com pai falecido (tema este que será desenvolvido em outro artigo, pois estas investigações estão se tornado cada vez mais freqüentes) e, por que não dizer, a investigação de paternidade intra-útero.

2 - CARACTERIZAÇÃO TÉCNICA

O escopo principal é a preservação da integridade física do binômio gestante-feto. A coleta de material do feto é feita obtendo-se uma amostra de vilo corial, que consiste no componente fetal da placenta. A placenta é composta de duas faces: a materna, que possui células idênticas às da mãe e a fetal, cuja estrutura celular é a mesma da do feto. Destarte, para obtermos células fetais (e, portanto DNA, que se encontra no núcleo das células) não é necessário importunarmos o feto. O que procedemos é a coleta do vilo corial, hoje considerada rotineira para o diagnóstico, não só de anomalias genéticas mas de outras situações patológicas, tais como infecções, anormalidades metabólicas, etc., onde seja imprescindível o obtenção de tecido fetal. A biópsia de vilo corial é, portanto, uma intervenção usual e segura, com risco mínimo para o feto e a gestante. Basicamente, a amostra de vilo corial é obtida, com o auxílio do ultra-som (que possibilita localizar com precisão a placenta), podendo ser procedida através da via baixa (utilizando o colo do útero para o acesso) ou pela parede abdominal. Este procedimento foi descrito pela primeira vez por Ward (100082). As vantagens da técnica de obtenção de amostra de vilo corial e da utilização de tecnologia do exame do DNA são complementares. É possível conseguir amostras de vilo corial viáveis, a partir da nona semana de gestação e a quantidade de vilo corial requerida para o exame do DNA é mínima. Uma vez coletado o vilo corial, procede-se a coleta de material (uma pequena quantidade de sangue) da mãe e do suposto pai, de onde se extrai o DNA dos núcleos dos respectivos glóbulos brancos, pois os glóbulos vermelhos são células desprovidas de núcleo.

As células do vilo corial (ou do, líquido amniótico) são colhidas em pequena quantidade, mas são mantidas algumas horas em cultura em meio apropriado para que se multipliquem e possibilite a extração do DNA de seus núcleos. Desta etapa em diante a metodologia é a mesma empregada nos casos de filhos de qualquer idade, cuja fonte de material é uma pequena amostra de sangue. O resultado é obtido em duas a três semanas. Em resumo, antes da décima terceira ou décima quarta semana de gestação (muito antes da metade da gestação e antes, até, do aumento visível do volume abdominal), o diagnóstico da paternidade já está concluído. O exame do DNA é procedido de acordo com os padrões mais avançados (Baird 10000003, AABB 10000000) e os resultados alcançam mais de 000000,000% de probabilidade de paternidade (quando da não exclusão), levando-se em conta que o exame exclui cem por cento dos falsos pais biológicos.

3-CASUÍSTICA BRASILEIRA

Mesmo levando-se em conta a casuística internacional, a investigação de paternidade intra-útero é pouco freqüente. Em levantamento na literatura foram encontradas apenas escassas referências (Nata 10000003, Tsuda 10000003, Mingjun 10000003, Saji 10000003, Ludes 10000001, Wiegand 10000002), todas muito recentes.

Considerações científicas à parte, as investigações de paternidade intra-útero carregam sempre aspectos emocionais e sociais dramáticos. Talvez seja a ocasião onde nós tenhamos que exercer nossas mais profundas habilidades em termos de relacionamento humano. A ansiedade em se conhecer o resultado se contrapõe com a necessidade que temos em proceder ao exame com a mais elevada técnica. A habilidade em declinar o resultado e explicar os aspectos técnicos, muitas vezes com resultado esperado adverso, servem como exemplo de que exercer esta atividade não é uma função exclusivamente técnica e reveste-se de situações inauditas e emoções permanentes.

Entre março de10000004 e março de10000006 fomos procurados para solucionar seis casos de investigação de paternidade intra-útero, cujos resumos colocamos a seguir, obviamente preservando as identidades e detalhes pessoais que não são relevantes para a elucidação e compreensão científica do caso. A coleta do vilo corial foi da responsabilidade do Dr. Antonio Fernandes Moron (CRM-SP 37.00004), médico obstetra, Diretor Clínico do Centro Paulista de Medicina Fetal e Professor de Obstetrícia da Escola Paulista de Medicina. No caso número 7, houve a colaboração da Dra. Paula Arruda (CRM-PE 10.0000002), médica responsável pelo setor de Medicina fetal e Reprodução Humana da Clínica Lucilo Ávila Jr., Recife (PE). Este caso foi o único realizado utilizando, como fonte de DNA fetal, o líquido amniótico. Autorizações da gestante e do suposto pai foram obtidas por escrito, após explicações detalhadas de todos os procedimentos, bem como sua finalidade. Para a realização destas análises foram utilizadas quatro sondas unilocais (que rastrearam os pares cromossômicos da mãe, do feto e do suposto pai) com a técnica de acordo com o que preconiza a Associação Americana de Bancos de Sangue, que é a entidade que possui os padrões mais rígidos para este tipo de procedimento laboratorial

Caso nº. 1: FPMA, 28 anos, caucasóide, gestante de 11 semanas, feto do sexo feminino, procedeu a coleta de vilo corial. Foi obtida uma amostra sangue da gestante. O suposto pai, LBA, de 63 anos, caucasóide, forneceu amostra de sangue. A comparação entre as regiões cromossômicas fetais, de origem paterna, e aquelas presentes no suposto pai, não foram coincidentes e, portanto, foi excluída a paternidade biológica pelo exame do DNA.

Caso nº. 2: LS, 23 anos, caucasóide, gestante de 13 semanas, feto do sexo masculino, procedeu a coleta de vilo corial. Foi obtida uma amostra de sangue da gestante. O suposto pai, JLVRC, de 25 anos, caucasóide, forneceu amostra de sangue. A comparação entre as regiões cromossômicas fetais, de origem paterna, e aquelas presentes no suposto pai, foram absolutamente coincidentes, obtendo-se a probabilidade de paternidade maior do que 000000,000000%, o que caracteriza a paternidade do ponto de vista estatístico e biológico pelo exame do DNA.

Caso nº. 3: LNM, 30 anos, caucasóide, gestante de 11 semanas, feto do sexo feminino, procedeu a coleta de vilo corial. Foi obtida uma amostra de sangue da gestante. O suposto pai, TM, caucasóide, de 31 anos, forneceu amostra de sangue. A comparação entre as regiões cromossômicas fetais, de origem paterna, e aquelas presentes no suposto pai, não foram coincidentes e, portanto, foi excluída a paternidade biológica pelo exame do DNA.

Caso nº. 4: SMV, 35 anos, caucasóide, gestante de 14 semanas, feto do sexo feminino, procedeu a coleta de vilo corial. Foi obtida uma amostra de sangue da gestante. Este caso é de relevante importância, pois dois supostos pais se habilitaram para a investigação. O primeiro, LCA, caucasóide, 41 anos, forneceu amostra de sangue. A comparação entre as regiões cromossômicas fetais, de origem paterna, e aquelas presentes no suposto pai, não foram coincidentes e, portanto, foi excluída a paternidade para este indivíduo, pelo exame do DNA. Posteriormente, foi testado AAC, caucasóide, 32 anos, que forneceu amostra de sangue. A comparação entre as regiões cromossômicas fetais, de origem paterna, e aquelas presentes no suposto pai, não foram coincidentes e, portanto, foi excluída a paternidade biológica para este indivíduo, pelo exame do DNA.l

Caso n°. 5: SSNJ, , 2000 anos, caucasóide, idade gestacional de 20 semanas, feto do sexo masculino, procedeu a coleta de vilo corial. Foi obtida uma amostra de sangue da gestante. O suposto pai, ARBJ, caucasóide, de 2000 anos, forneceu amostra de sangue. A comparação entre as regiões cromossômicas fetais, de origem paterna, e aquelas presentes no suposto pai, não foram coincidentes e, portanto, foi excluída a paternidade biológica pelo exame do DNA.

Caso n°. 6: YGYA, 23 anos, caucasóide, idade gestacional de 24 semanas, feto do sexo masculino, procedeu a coleta de vilo corial. Foi obtida uma amostra de sangue da gestante. O suposto pai, ASJF, caucasóide, de 21 anos, forneceu amostra de sangue. A comparação entre as regiões cromossômicas fetais de origem paterna aquelas presentes no suposto pai, não foram coincidentes e, portanto, foi excluída a paternidade biológica pelo exame do DNA.

Caso n°. 7: SCAI, 26 anos caucasóide, idade gestacional de 14 semanas, feto do sexo masculino, procedeu a coleta de líquido amniótico. Foi obtida uma amostra de sangue da gestante. O suposto pai, FAJ, caucasóide, 36 anos, forneceu amostra de sangue. a comparação entre regiões cromossômicas fetais, de origem paterna, e aquelas presentes no suposto pai, não foram coincidentes, portanto, foi excluída a paternidade biológica pelo exame do DNA a paternidade biológica

Em média, o tempo para obtenção dos resultados foi de três semanas.

4-RESUMO

O artigo em questão procura colocar a importância da investigação de paternidade envolvendo o nascituro, discorrendo sobre todo o seu respaldo do ponto de vista jurídico, evidenciado pela jurisprudência citada.

A amostra consistiu de setes gestantes, sendo uma com mais de dois supostos pais, o que pode ser considerado como a maior casuística descrita por um autor brasileiro.

Adicionalmente, foram colocados os princípios básicos de genética forense e da técnica do exame do DNA e sua aplicação na investigação de paternidade intra-útero, com a descrição dos primeiros casos brasileiros, constando de seis exclusões e uma inclusão da paternidade biológica (um caso teve dois supostos pais excluídos), cujas idades gestacionais estavam entre 11 a 24 semanas, onde fica evidente a possibilidade de investigar a paternidade em período de extrema precocidade da gravidez.

Queremos crer que trata-se de uma estudo de valor científico considerável, pois em poucos momentos da história do Direito houve uma integração tão íntima com a Ciência Médica, no sentido de oferecer suporte técnico para que a Justiça seja exercida em toda a sua plenitude.

Como Perito Judicial, com quinze anos de atuação em investigação de vínculo genético, assistimos a um avanço substancial nos métodos de biologia molecular que visam o esclarecimento de situações desta natureza. Os membros da comunidade jurídica devem sentir-se privilegiados por pertencerem a uma época em que estas ferramentas estão disponíveis.

O autor é o Dr. João Lélio Peake de Mattos Filho, médico graduado e pós-graduado pela Escola Paulista de Medicina e Perito Judicial para casos de investigação de paternidade, atuante no Foro Central de São Paulo, bem como Foros Regionais, Distritais, outras Comarcas e, também, outros Estados da Federação; é membro da Associação dos Peritos Judiciais do Estado de São Paulo, sendo que seus artigos encontram-se listados nas referências bibliográficas deste estudo.

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Texto gentilmente cedido por Palmiro Sartorelli Neto (palmiro@aguianet.com.br)

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