GRATIFICAÇÃO POR DESEMPENHO

ESTADO DO RIO DE JANEIR

PODER JUDICIÁRIO

COMARCA DA CAPITAL

JUÍZO DE DIREITO DA 10A VARA DA FAZENDA PÚBLICA

Proc. nº 2012.001.181189-1

SENTENÇA

I

Vistos etc..

WILSON FRANCISCO DA ROCHA, qualificado na inicial, propôs a presente ação em face do MUNICIPIO DO RIO DE JANEIRO, pedindo o reconhecimento do seu direito a alteração do valor a título de gratificação de desempenho, passando de 160 pontos para 280, bem como a condenação do réu nos valores atrasados acumulados, referentes aos 80 pontos a menor, desde a entrada em vigor do Decreto nº 12335/93.

Como causa de pedir, alega o autor, em síntese, perceber a gratificação por desempenho - instituída pelas Leis Municipais nº 1563/90 e 1933/92 - em índice de pontuação inferior ao que deveria estar recebendo. Aduz, a tanto, que o Decreto Regulamentar nº 12335/93, que objetivou dar eficácia à legislação, extrapolou seus limites, deixando de atentar para o fato da gratificação se vincular à produtividade. Assim, estabeleceu limite de 160 pontos para funcionários que ocupassem cargos que exigissem escolaridade em 2o grau, e até o limite de 280 pontos para os cargos que exigiam escolaridade em grau superior, sem se vincular ao padrão de produtividade. Por tal razão, o autor que por suas atividades faria jus ao percentual 280, passou a perceber o percentual 160, visto ocupar cargo com exigência apenas de 2o grau (fls. 02/07).

Com a inicial vieram os documentos de fls. 08/33.

Devidamente citado, o Município do Rio de Janeiro apresentou contestação às fls. 80/83, alegando, como defesa indireta de mérito, a incidência da prescrição qüinqüenal. Caso ultrapassado este ponto, sustenta que a diferenciação de pontuação em razão da escolaridade não se afasta do critério da produtividade estabelecido pela Lei nº 1563/90, já que o incremento na arrecadação municipal é maior pelo desempenho das atividades de nível superior do que aquelas que exigem apenas nível médio. Ademais, caso entendido ilegal o referido Decreto, a norma ficaria carente de regulamentação, e ineficaz, por ser de eficácia contida. Pugna pela improcedência do pedido e, na eventualidade, que seja observada a incidência da prescrição qüinqüenal no tocante a condenação.

Com a contestação vieram os documentos de fls. 88/65.

Réplica à fls. 68.

Parecer do Ministério Público às fls. 7/76, no sentido da procedência parcial do pedido, para declarar ilegais os dispositivos que estipulem contrariamente ao limite máximo individual de 280 pontos, e condenar o réu ao pagamento das diferenças.

II

É o Relatório. Fundamento e Decido.

Inicialmente cabe checar se a pretensão autoral, em ver majorado o índice de pontuação da gratificação por desempenho, encontra-se prescrita.

A toda evidência não. Tal se dá na medida em que não existiu decisão expressa, no âmbito da Administração, negando o direito aqui postulado.

Resta então saber se seria oportuna a prescrição qüinqüenal das parcelas vencimentais. Nesta parte, assiste razão ao réu. O autor só pode postular valores a título de gratificação que se fizerem até cinco anteriores ao aXXXXXXXXXXXXamento da ação, nos termos do Decreto-lei nº 20910/32.

Incide, na espécie, o entendimento constante na Súmula nº 85, do STJ, cuja redação é a seguinte: “nas relações de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do qüinqüênio anterior a propositura da ação”.

Passado o exame da defesa indireta de mérito, checa-se este.

Aqui, nesta parte, tem-se que a questão cinge-se aos limites regulamentares do Decreto nº 12335/93, que estabeleceu critérios para o pagamento da gratificação por desempenho criada pela Lei Municipal nº 1933/92, que remete à Lei Municipal nº 1563/90, percebida pelos servidores fazendários.

A referida legislação municipal, segundo se observa, ao criar a gratificação por desempenho, adotou como norte para impor o valor de até 280 pontos, a produtividade do servidor.

Assim sendo, a Administração ao ser levada a dar eficácia à legislação, editando decreto regulamentar, deveria, e deve, se ater aos limites estabelecidos pela lei, sob pena de se colocar nulo o seu ato normativo.

O poder regulamentar da Administração se atém a explicitar e especificar o conteúdo de norma legal preexistente, visando possibilitar a projeção de seus efeitos, com a perspectiva de execução de seu comando. Não pode o ato normativo da Administração criar deveres ou restringir direitos em dissonância da lei.

Quanto ao dito, não seria muito trazer a baila a seguinte lição da doutrina: “... consagra-se, em nosso Direito Constitucional, a aplicação plena, cabal, do chamado princípio da legalidade, tomado em sua verdadeira e completa extensão. Em conseqüência, pode-se, com Pontes de Miranda, afirmar: “Onde se estabelecem, alteram ou extinguem direitos, não há regulamentos – há abuso do poder regulamentar, invasão de competência legislativa. O regulamento não é mais do que auxiliar das leis, auxiliar que sói pretender, não raro, o lugar delas, mas sem que possa com tal desenvoltura, justificar-se e lograr que o elevem à categoria de lei” (CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO, Curso de Direito Administrativo, 16a ed., Malheiros, 2003, p. 313).

Portanto, ao regulamentar a norma concessiva do adicional por desempenho, deveria o Executivo se ater aos parâmetros adotados pelo legislador, não criando outros.

No caso, o critério adotado pelo legislador foi o da produtividade. Logo, o administrador deveria se ater ao marco diferenciador de graus de produtividade. Tão só isto. Assim, de acordo com o entendimento jurisprudencial pacificado pelo Tribunal de Justiça deste Estado, não se colocaria, nem se coloca, correta a aferição da produtividade da função através da checagem do grau de escolaridade do servidor. O estabelecimento de tal critério fugiria àquele criado pela lei que lhe dá fundamento, invadindo, deste modo, a esfera do Poder Legislativo e extrapolando os limites de discricionariedade executiva.

Confira-se a respeito os seguintes julgados:

“AÇÃO ORDINÁRIA – GRATIFICAÇÃO DEFERIDA AOS SERVIDORES OCUPANTES DO GRUPO FAZENDÁRIO – DECRETO 12335/95 – ABUSO DO PODER REGULAMENTAR – LEI Nºs 1563/90 e 1933/92.

É ilegal o decreto regulamentador que estabelece critério de escolaridade para gratificação de desempenho, extrapolando os limites das Leis Municipais nºs 1563/90 e 1933/92, que se refere única e exclusivamente ao critério da produtividade. Recurso improvido” (Ap. Cível 2012.001.09180, 6a CC, Rel. Des. VALMIR RIBEIRO, J. 22.05.02).

“DIREITO ADMINISTRATIVO – SERVIDOR – VENCIMENTO – GRATIFICAÇÃO DE DESEMPENHO DEFERIDA AOS SERVIDORES OCUPANTES DO GRUPO FAZENDÁRIO.

Lei Municipal 1993/92. Critérios para quantificação do benefício. Lei Municipal 1563/90. Abuso do poder regulamentar. Ilegalidade do decreto regulamentador que estabelece diferenças entre os servidores em razão da escolaridade exigida para o cargo. Ato administrativo que extrapola os limites legais. Manutenção da sentença que julgou procedente o pedido de condenação da municipalidade ao pagamento das diferenças na forma do estipulado na Lei criadora do benefício. Verba alimentar. Correção monetária. Incidência a partir do momento em que as verbas deveriam ter integralizado o patrimônio dos beneficiários. Honorários. Fixação na forma do art. 2o, parágrafo 8o, do CPC. Aplicação equânime considerando o montante da condenação. Desprovimento do primeiro apelo. Provimento parcial do 2. Manutenção parcial do julgado” (Ap. Cível 2012.001.07018, 12a CC, Rel. Des. LEILA MARIANO, J. 15.02.00).

“SERVIDOR PÚBLICO – FUNCIONÁRIO FAZENDÁRIO – GRATIFICAÇÃO DE PRODUTIVIDADE – LEI MUNICIPAL N. 1993, DE 1992 – FIXAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA – REDUÇÃO DO VALOR.

Ação ordinária. Servidor público. Vencimento. Gratificação de desempenho. Lei n. 1933/92. Abuso do poder regulamentar. O decreto que regulamentou a Lei nº 1933/92, do Município do Rio de Janeiro, que criou a gratificação de desempenho, destinada aos servidores do grupo fazendário, sendo hierarquicamente inferior à lei, não poderia restringir as suas disposições, como fez, mas apenas, explicitá-la dentro dos limites por ela traçados. Recurso voluntário conhecido e, feito o reexame necessário, deu-se-lhe parcial provimento para reduzir o percentual da verba honorária” (Ap. Cível 2012.001.00896, Reg. 18.11.01, 18a CC, Des. MARLAN MARINHO, J. 11.09.01).

Logo, de acordo com o entendimento pacificado deste Tribunal - o qual segue este julgador apenas para não criar grau vencimental diverso aos servidores ocupantes do mesmo cargo, haja vista entender razoável o critério constante do regulamento - indevida a discriminação, pois não realizada dentro dos critérios legais.

Colocando-se ilegal o critério de pontuação, caberia saber sobre a ineficácia do decreto regulamentar, trazendo a impossibilidade de concessão do adicional por desempenho.

Esta tese não vinga. A ineficácia do decreto regulamentar é relativa. Apenas no que tange a diferenciação pelo grau de escolaridade. Não valendo a mesma, aplica-se a pontuação máxima a todos, observando os parâmetros subsistentes.

Assim, procede o pleito de alteração do índice da gratificação por desempenho, valendo notar que o autor, apesar de aposentado, pode ter incorporado esta gratificação propter laborem pois a Lei nº 1933/92, em seu art. 1o, §2o, permitia a incorporação desde que preenchidos requisitos temporais, seguindo orientação sedimentada na doutrina, como se colhe de passagem de HELY LOPES MEIRELLES em seu consagrado Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros, 22a ed., p. 817/818. Ou seja, o haver previsão legal para a referida incorporação, esta se fez presente nos termos aqui postulado.

III

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE em parte o pedido, para declarar a ilegalidade do critério estabelecido no Decreto nº 12335/93, para a gratificação de desempenho, e determinar ao Município do Rio de Janeiro que realize a mesma, em favor do autor, na pontuação 280, condenando ao pagamento das diferenças que se fizerem no qüinqüídio anterior ao aXXXXXXXXXXXXamento desta ação, corrigidas monetariamente. Os juros incidirão a partir da citação, no padrão de 1% ao mês.

Imponho, outrossim, ao réu os ônus sucumbenciais, fixando os honorários advocatícios em 10% do valor da condenação.

Submeto a presente sentença ao duplo grau obrigatório de jurisdição.
P.R.I.

Rio de Janeiro, 31 de maio de 2012.

RICARDO COUTO DE CASTRO

XXXXXXXXXXXX DE DIREITO