EXCEÇÃO PRE EXECUTIVIDADE AFONSO
EXCELENTÍSSIMO SR.(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DA 3ª VARA FEDERAL DE EXECUÇÃO FISCAL DO RIO DE JANEIRO.
PROCESSO N°
vem perante à presença de Vossa Excelência, nos autos da execução que lhe move A UNIÃO FEDERAL, oferecer a presente
EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE
com fincas nos arts. 267, §3º; 585, inciso IV; 586, caput; 618, inciso I do Código de Processo Civil, e nos argumentos de fato e de direito que passa a expender:
I – DO CABIMENTO DA PRESENTE EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE.
A exceção de pré-executividade é uma espécie excepcional de defesa específica do processo de execução, ou seja, independentemente de embargos do devedor, que é ação de conhecimento incidental à execução, o executado pode promover a sua defesa pedindo a extinção do processo, por falta do preenchimento dos requisitos legais.
É uma mitigação ao princípio da concentração da defesa, que rege os embargos do devedor. Predomina na doutrina o entendimento no sentido da possibilidade da matéria de ordem pública (objeções processuais e substanciais), reconhecível, inclusive, de ofício pelo próprio magistrado, a qualquer tempo e grau de jurisdição, ser objeto da exceção de pré-executividade (na verdade objeção de pré-executividade, segundo alguns autores que apontam a impropriedade do termo), até porque há interesse público de que a atuação jurisdicional, com o dispêndio de recursos materiais e humanos que lhe são necessários, não seja exercida por inexistência da própria ação.
Por ser ilegítima a parte, não haver interesse processual e possibilidade jurídica do pedido; por inexistentes os pressupostos processuais de existência e validade da relação jurídica-processual e, ainda, por se mostrar a autoridade judiciária absolutamente incompetente.
Há possibilidade de serem argüidas também causas modificativas, extintivas ou impeditivas do direito do exeqüente desde que desnecessária qualquer dilação probatória, ou seja, desde que seja de plano, por prova documental inequívoca, comprovada a inviabilidade da execução.
Isso significa estar correta a alegação, de certa forma freqüente principalmente em execuções, de que, com a promulgação da atual Constituição Federal, a obrigatoriedade da garantia do juízo para oferecimento de embargos mostrar-se-ia inconstitucional, tendo em vista a impossibilidade de privação de bens sem o devido processo legal.
É certo que o devido processo legal é a possibilidade efetiva da parte ter acesso ao poder judiciário, deduzindo pretensão e podendo se defender com a maior amplitude possível, conforme o processo descrito na lei. O que o princípio busca impedir é que de modo arbitrário, ou seja, sem qualquer respaldo legal, haja o desapossamento de bens e da liberdade da pessoa.
Havendo um processo descrito na lei, este deverá ser seguido de forma a resguardar tanto os interesses do autor, como os interesses do réu, de forma igualitária, sob pena de ferimento de outro princípio constitucional, qual seja, da isonomia, que também rege a relação processual.
Ninguém pode ser afetado em sua esfera jurídica sem ter sido ouvido e vencido em juízo, em procedimento que, ainda, respeite sua dignidade pessoal.
Na verdade, o princípio do contraditório, sem o que não se pode admitir o processo como democrático, não é senão um simples aspecto do direito fundamental e genérico de igualdade dos governados perante a lei, que no campo da justiça, se traduz na igualdade das partes no processo (FIX-ZAMÚDIO, "Constitución y proceso...", p. 32; VIGORITI, La garanzia constituzionale..., p. 156).
Por fim, o contraditório e a ampla defesa seriam vãs declarações de garantia se o julgamento não ficasse adstrito à prova e as alegações do processo e se o julgador não estivesse obrigado a fundamentar nessas provas e alegações a sua sentença. O princípio do contraditório, portanto, começa com a garantia de defesa e termina com a obrigatoriedade da sentença fundamentada.
Quando se cogita do contraditório , depara-se com o que a doutrina do nosso tempo apelida de "um princípio constitucional do processo civil" (FREDERICO MARQUES, "Instituições de Direito Processual Civil", Rio, Forense, 1958, v. Il, nº 310, p. 111; EMÍLIO BERRI, "Diritto Processuale Civile Italiano", 1936, p. 87). E enquanto os princípios processuais, em regra, são relativos e admitem muitas exceções, o do contraditório apresenta-se como absoluto "e deve sempre ser observado, sob pena de nulidade do processo" (ANDRIOLI, "Lezioni di Diritto Processuale Civile", v. I, nº 5, p. 21; HUMBERTO JÚNIOR, "Curso de Direito Processual Civil", 5ª ed., Rio, Forense, 1989, v. nº 24, p. 28).
Aplica-se, então, o princípio do contraditório ao processo de execução para propiciar aquele que suporta a atividade executiva meios de se bater contra uma "liquidação ruinosa de seus bens" (FREDERICO MARQUES, ob. cit., Il, nº 310, p. 112; ROCCO, "L´interpretazione delle leggi processuali", Roma, 1906, p. 47).
Não se pode, outrossim, admitir um processo em contraditório sem que dos atos e termos do juízo seja dada ciência a todos os que devam suportar suas conseqüências. "O contraditório é ciência bilateral dos atos e termos processuais; com possibilidade de contrariá-los" (FREDERICO MARQUES, ob. cit., II, nº 311, p. 113).
Atualmente, a doutrina e jurisprudência têm gradativamente e com maior freqüência afirmado ser possível, pelo executado, a impugnação à executividade do título apresentado pelo exeqüente antes mesmo da realização da penhora.
Como ato de afetação patrimonial que é, a penhora atinge de forma severa a esfera jurídica do Executado, que está sendo injustamente demandado. O elenco extensivo de títulos executivos no ordenamento jurídico brasileiro, não encontrado em nenhum outro sistema jurídico, tem a grande vantagem de propiciar o desencadeamento de atos constritivos, graças à eficácia abstrata que emana do título executivo.
No entanto, em certas ocasiões, tais atos não são verdadeiramente desejados pelo direito. Em contrapartida, o mesmo ordenamento que oferece a possibilidade de o Exeqüente valer-se de atos de agressão sobre o patrimônio do executado permite a utilização por este de amplos meios de defesa.
É sabido que o título executivo, tal como definido pelo direito positivo, é elemento autorizador da penhora para depois, em sede de embargos do executado, discutir-se qual das partes tem razão. Isso significa que, não estando ele presente, ou mesmo carecendo de liquidez, certeza e exigibilidade, tem o juiz o dever de indeferir in limine a execução.
A presença de um título executivo, com a sua eficácia abstrata, permite seja feita desde logo a constrição de bens e eventuais discussões sobre a existência, inexistência ou valor da obrigação ficam adiadas para o momento dos embargos à execução.
Ora, quando o título não existe ou quando a sua própria existência é posta em discussão, seria uma ilegalidade exercer constrição sobre o patrimônio do obrigado, justamente porque para tanto falta o elemento legitimador possível – ou seja, o título executivo.
O título executivo não constitui prova inequívoca da real existência do direito afirmado e tão pouco cria direitos.
. Nesse sentido, cada vez mais os tribunais brasileiros têm aceito as denominadas objeções de pré-executividade, que versam sobre matéria de defesa e são cognoscíveis de ofício pelo julgador por se referirem a questões de ordem pública, passíveis de apreciação independentemente de qualquer iniciativa do demandado (CPC, art. 267, § 3º, e 301, § 4º).
Permite-se com tais objeções o oferecimento de defesas antes da efetivação da penhora ou do depósito e ao longo de todo o arco procedimental, pois não estão sujeitas à preclusão; o demandado pode insurgir-se contra a execução, antes de seguro o juízo, que autoriza a oposição de embargos por petição dirigida aos próprios autos do processo executivo.
Não há nada que justifique penhorar para depois discutir a existência ou requisitos como certeza, liquidez e exigibilidade do título: como penhorar primeiro e deixar para depois a discussão sobre a existência do próprio título ou a sua liquidez, a sua certeza, a sua exigibilidade, sem o qual penhora alguma se faz?
Como é sabido, a ausência das condições da ação provoca a extinção do processo (CPC, art. 267). Além disso, por serem de ordem pública, questões como essa podem e devem ser conhecidas a qualquer tempo e grau de jurisdição, independentemente de provocação das partes (art. 267, § 3º).
O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Resp nº 187.195, publicado em 17 de maio de 2012, tendo como relator o Ministro Carlos Arberto Meneses Direito, esposou o seguinte entendimento:
"Execução. Falta de liquidez. Nulidade (pré-executividade). 1. Admite-se a exceção, de maneira que é lícito, por simples petição. A saber, pode a parte alegar a nulidade, independentemente de embargos, por exemplo" Admissível, como condição de pré-executividade, o exame da liquidez, certeza e exibilidade do título a viabilizar o processo de execução" (Resp – 124.364, DJ de 26/10/98)."
II – DOS FATOS
O Executado adquiriu através de Aforamento um lote de terreno da Marinha em 21/11/1978, sendo que jamais tomou posse do referido bem, visto que logo após sua alienação o mesmo foi invadido por pessoas de reputação duvidosa.
De pronto o Executado procurou imitir-se na posse, via consensual, via judicial e não obteve êxito, sendo inclusive ameaçado de morte juntamente com sua família.
Decepcionado com a demora no trâmite processual, visto que até os oficiais de justiça não conseguiam intimar nenhum dos invasores, procurou então o órgão legal e foi orientado que “era só deixar de pagar por um tempo que caducaria o aforamento”.
O Executado é pessoa de 77 anos, aposentado, doente e ao receber o Mandado de Citação dessa execução sofreu uma crise cardíaca, da qual está restabelecendo-se. Acreditava o Executado que o terreno já tinha voltado aos domínios da União há muitos anos e que jamais poderia sofrer qualquer sanção pelo inadimplemento.
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III – DO DIREITO
A legislação que regulamenta os aforamentos dos terrenos da Marinha, no Brasil, é o Decreto Lei 9.740/46, o qual determina em seus artigos 101 e 103.
Art. 101. Os terrenos aforados pela União ficam sujeitos ao fôro de 0,6% (seis décimos por cento) do valor do respectivo domínio pleno.
§ 1º O pagamento do fôro deverá ser efetuado adiantadamente durante o primeiro trimestre de cada ano, sob pena de multa de 20% (vinte por cento).
§ 2º O não pagamento do fôro durante 3 (três) anos consecutivos importará na caducidade do aforamento. (grifo nosso)
Art. 103. O aforamento se extinguirá por inadimplemento de cláusula contratual, por acordo entre as partes, ou, a critério do Governo, pela remissão do foro e, quanto às terras de que trata o art 65 ou quando concedido com fundamento nos itens ns. 8º, 9º e 10º do art, 105, quando não estiverem as mesmas sendo utilizadas apropriadamente.(grifo nosso)
Ensina ainda a ilustre mestra Maria Helena Diniz em seu livro (Curso de Direito Civil Brasileiro 4° Volume – Direito das Coisas – Editora Saraiva ,pag. 266):
Extingue-se a enfiteuse:
- ...............................................
- Pelo comisso, deixando o foreiro de pagar as pensões devidas por 3 anos consecutivos, caso em que o senhorio o indenizará das benfeitorias necessárias (CC, art.692, II; Dec-Lei 9.760/46, art. 101, § 2O ; STF, Súmulas 122 e 169).
O Comisso não opera de pleno direito, devendo ser pronunciado por sentença judicial. Cabe ao senhorio direto propor ação contra o foreiro a fim de que se comprove e decrete o comisso. Só depois da sentença do magistrado é que o enfiteuta perderá o seu domínio útil, consolidando-se o direito de propriedade na pessoa do senhorio direto. Entretanto as parte poderão estipular, se o quiserem, no contrato enfitêutico, que a falta de pagamento do canon não acarretará o comisso, desde que tal cláusula seja decretada judicialmente.
Pelos arts. 101, §2°., 103, § 1°., 118 e 121 do Decreto-lei n° 9.760/46 também se extingue o aforamento de bens da União por inadimplemento de cláusula contratual, consistente no atraso de pagamento de foro durante 3 anos, só que o reconhecimento desse comisso independente de decisão judicial.(grifo nosso)
Pela brilhante doutrina da mestra Maria Helena Diniz que expressamente entende que a pena de Comisso no caso de bens públicos independe de sentença judicial, fulmina a pretensão de cobrança do imposto foreiro.
O contrato de aforamento celebrado em 1978 e o inadimplemento contaminam este contrato tornando-se nulo pelo Comisso. Portanto desamparada a possibilidade de cobrança do tributo incidente sobre o bem, visto que este bem já não mais encontra-se afeto ao domínio do Executado, voltou o domínio do Executante, a partir do inadimplemento do 3° ano consecutivo.
. Por certo, entende-se que para que o título tenha sua eficácia subordina-se a fatos jurídicos perfeitos e incontestáveis, o que não corresponde a presente execução.
De forma que a execução está fundada em título ilíquido, incerto e inexigível, o que é manifestamente inadmissível, sendo impossível torná-lo líquido dentro do próprio processo executivo.
A jurisprudência é no seguinte sentido:
EXECUÇÃO – Nulidade, pela inexistência de título líquido, certo e exigível (CPC, art. 618-I). Inocorrência de afronta à lei federal, e dissídio não comprovado. (STJ – REsp 6.508 – MG – 3ª T. – Rel. Min. Nilson Naves – DJU 08.04.1991)
EXECUÇÃO POR TÍTULO EXTRAJUDICIAL – EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE – FALTA DE LIQUIDEZ, CERTEZA E EXIGIBILIDADE DO TÍTULO – 1. Não ofende a nenhuma regra do Código de Processo Civil o oferecimento da exceção de pré-executividade para postular a nulidade da execução (art. 618 do Código de Processo Civil), independentemente do embargos de devedor. 2. Considerando o Tribunal de origem que o título não é líquido, certo e exigível, malgrado ter o exeqüente apresentado os documentos que considerou aptos, não tem cabimento a invocação do art. 616 do Código de Processo Civil. 3. Recurso especial não conhecido. (STJ – REsp 160.107 – ES – 3ª T. – Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito – DJU 03.05.2012 – p. 145)
III – DA PRESCRIÇÃO
Com a devida vênia, apenas por amor ao debate se V.Excia não entender que o título executivo esteja eivado pelo vício da inexigibilidade pela imposição gravosa da pena do Comisso, outro vício avulta-se na inobservância do prazo prescricional de cobrança dos créditos tributários.
Determinam os textos legais:
Art. 1º O caput do art. 47 da Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998, passa a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 47. O crédito originado de receita patrimonial será submetido aos seguintes prazos:
I - decadencial de dez anos para sua constituição, mediante lançamento; e
II - prescricional de cinco anos para sua exigência, contados do lançamento."
E ainda o CTN em seu art.
Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados:
I - do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado;
II - da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado.
Parágrafo único. O direito a que se refere este artigo extingue-se definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento.
Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva
É importante frisar o registro da dívida ativa constante da peça exordial indica que seu número é 70.6.03.013594-33 e data de registro é 06/05/2003 incluindo neste registro débitos de 1988 a 2002. O que de pronto visualiza-se a inclusão de débitos prescritos naquela ocasião.
V – REQUERIMENTOS
Diante do exposto, roga o Executado que o processo seja julgado IMPROCEDENTE em razão nulidade do contrato que lhe originou. Se, entretanto, Vossa Excelência entender que a execução não é nula, fulminada pela extinção do Aforamento pela pena de Comisso, prevista na legislação especial, requer o Executado:
- seja deferido o benefício da justiça gratuita nos termos da Lei no 1.060/50, com a nova redação introduzida pela Lei nº 7.510/86, por ser pessoa juridicamente pobre nos termos da lei;
- Seja suspensa a execução, até decisão do incidente ora suscitado, vez que, por se tratar de matérias de ordem pública, pressupostos processuais e condições da ação, de modo que o processo não pode coexistir com a ausência de liquidez e exigibilidade inerentes ao título, sob pena de nulidade, na forma do art. 618, I do CPC.
- seja decretada a prescrição dos débitos do período anterior ao último quinquênio;
N. Termos
Pede Deferimento