EMBARGOS LUANA
EXMO. SR. JUIZ DE DIREITO DA 7ª VARA CÍVEL DA COMARCA DA CAPITAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
Processo nº 1998.001.116782-7
ESPÓLIO DE ETELVINA PEREIRA DA SILVA, representado por LUANA SILVA REGIS, brasileira, solteira, recepcionista, portadora da carteira de identidade nº 12129150-4, inscrita no CPF sob o nº ***********, residente e domiciliada na Rua José dos Reis, 2265, bloco 3, entrada 33, apto. 109, CEP 20770-054, Inhaúma, Rio de Janeiro, vem, pela DEFENSORIA PÚBLICA, que esta subscreve, tempestivamente opor
EMBARGOS DO DEVEDOR
em face do CONDOMÍNIO DO CONJUNTO HABITACIONAL JOSÉ DOS REIS, já qualificado nos autos do processo em epígrafe, pelos fatos e fundamentos que passa a expor:
INICIALMENTE, reitera o pedido de gratuidade de justiça anteriormente formulado, em petição protocolada junto ao PROGER em 23.02.2012, por ser juridicamente pobre, sem ter condição econômica de arcar com o pagamento de honorários advocatícios e despesas processuais, sem prejuízo do sustento próprio e da família.
O embargado ajuizou ação de cobrança de cotas condominiais, pelo procedimento sumário, em face da embargante, vindo a ser prolatada a sentença fls. 175/176, e, em face de seu trânsito em julgado, foi instaurada a presente execução que, segundo fls. 180, a quantia da dívida atingia o valor de R$ 11.852,36 (onze mil e oitocentos e cinqüenta e dois reais e trinta e seis centavos).
Não pago o valor da execução, foi efetivada a penhora de que trata o termo de penhora de fls. 249, surgindo daí o inconformismo do embargante, passando então a interpor os presentes embargos a fim de ver desconstituída a referida penhora.
DA INCONSTITUCIONALIDADE DA PENHORA
LEVADA A EFEITO
Buscando a essência da justiça, da legalidade, e da constitucionalidade das leis, é preciso que V.Exª atente para o que se segue:
A começar pelos “PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS” estabelecidos no título I da Constituição Federal, vale ressaltar o seu Art. 1º inciso III o qual assegura a “DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA”. Que proteção constitucional à dignidade da pessoa humana seria essa, se o Estado autorizasse a penhora e hasta pública de um imóvel (ou do direito que sobre ele se detém) que serve à residência de uma família inteira, como é o caso do imóvel de que tratam os presentes autos. Perdido o imóvel residencial familiar, eis que vendido em hasta pública para pagar dívidas, e de outrem, ressalte-se, estariam todos à rua (filhos do embargante que residem no imóvel), morando como mendigos sob um viaduto. Como entender aquela proteção constitucional ? Que dignidade seria essa ?
No mesmo diapasão estabelece o “Caput” do Artigo 226 da mesma Carta Política, que “a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado” . Ora, data vênia, como se falar que o Estado tem a obrigação de proteger a família, se ele mesmo, por lei ou por ato judicial, autorizasse que uma família inteira fosse morar ao relento, em decorrência de uma penhora e hasta pública por ele mesmo autorizados? Chegar-se ia a um outro paradoxo: se a própria Constituição Federal assegura o direito à moradia, à habitação, como entender-se que o Estado estaria autorizando tal expropriação de bens, a ponto de atirar toda uma família à rua, simplesmente para assegurar direitos meramente patrimoniais. Que direitos seriam esses? Proteger-se-ia o credor, que tem interesses meramente patrimoniais em detrimento de direitos maiores, quais sejam, por exemplo, direito à dignidade, à moradia, à vida, etc;
Destarte, é fácil perceber que flagrante é a inconstitucionalidade.
Não restam dúvidas de que a lei 8009/90, que trata da impenhorabilidade de imóvel residencial familiar, trouxe ao mundo jurídico pátrio importantes inovações, a qual deve ser interpretada em sintonia com os comandos constitucionais supracitados. A lei deve ser interpretada à luz da Constituição, devendo a ela se submeter. Qualquer interpretação dissonante do que acima se sustenta, deve ser entendida como inconstitucional. Assim, inconstitucional é a decisão judicial que determina a penhora e hasta pública de imóvel residencial familiar; inconstitucional é a norma ordinária que eventualmente disponha em contrário.
Há aqueles que são refratários ao texto constitucional, alegando que, em hipóteses como a dos autos, não se aplica a referida impenhorabilidade, por força do Artigo 3º, que cuida de exceções. Contudo, tais exceções não podem se sobrepor à ratio, aos princípios, aos pilares, às garantias, às normas constitucionais. Qualquer exceção seria admitida, se não atingisse a dignidade humana, se não houvesse quebra do princípio da igualdade, se não suprimisse o direito à moradia, o direito à habitação, o direito à vida propriamente dita, se não violasse, enfim, a Constituição Federal.
Importa considerar ainda que o Artigo 3º da lei 8009/90, ao tratar das exceções, não excepcionou a possibilidade de se penhorar dito imóvel (ou direito) em se tratando de débitos condominiais. Em nenhum de seus incisos se encontra aquela exceção. Não pode o intérprete fazer interpretação extensiva, com sacrifício de direitos e garantias constitucionais, como aqueles que se viu acima. Oportuno ressaltar que quando o Artigo 3º inciso IV da referida lei excepciona as “contribuições devidas em função do imóvel familiar”, é evidente que não está se referindo a débito condominiais. Referida expressão deve ser entendida como contribuições de natureza fiscal, já que seqüenciada de “ impostos e taxas”, sendo as “contribuições” ali entendidas como “contribuições de melhoria”, a qual se constitui numa espécie do gênero, tributos, tais como os “impostos e taxas” ali mencionados.
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Como se vê, exaustivamente, não tem a embargante que se submeter à penhora e seus efeitos, eis que violada restou a Constituição Federal, cuja declaração ora se requer; uma norma processual ou mesmo de direito material, por mais imperiosa que pareça ser, não pode apagar da Constituição da República, direitos, garantias, princípios e pilares, sustentáculos de qualquer Estado que se proclama ser, Democrático deDireito.
DO PEDIDO
Diante do exposto, vem a V.Exa. requerer o seguinte:
1) sejam os presentes embargos distribuídos por dependência aos autos epigrafados, recebidos em seu efeito suspensivo, suspendendo-se a execução, em face do disposto no parágrafo primeiro do Artigo 739 do Código de Processo Civil, autuando-se-lhe em apenso aos autos do processo epigrafado, conforme determina o Artigo 736 da mesma lei instrumental.
2) seja o embargado intimado para impugnar os presentes embargos, se assim o quiser, no prazo de dez dias, na forma do Artigo 740 do Código de Processo Civil.
3) ao final, sejam julgados procedentes os presentes embargos, declarando e reconhecendo a inconstitucionalidade da penhora levada a efeito, desconstituindo-a, via de conseqüência; ou se assim V.Exª não entender, que pelo menos seja reconhecido o excesso de execução, ajustando-a à realidade do título que se executa, impondo-se, em qualquer situação, ao embargado, os ônus sucumbenciais, devendo os honorários advocatícios reverter em favor do Centro de Estudos Jurídicos da Defensoria Pública Geral do Estado do Rio de Janeiro, na forma da lei 1146/87.
4) por derradeiro, requer o deferimento de todas as provas em direito admitidas, tais como, documental suplementar, oral, pericial contábil.
Atribui à causa o valor de R$ 17.274,03
Pede Deferimento.
Rio de Janeiro, 2 de março de 2012.