DOAÇÃO DE BENS

DOAÇÃO DE BENS - CONDIÇÃO

INEXISTENTE - USUFRUTO -

IMPOSSIBILIDADE DE NULIDADE

Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da ...

Vara Cível da Comarca de ...

TÉRCIA, nacionalidade ..., estado civil ..., menor

impúbere, representada por sua mãe ....,

(qualificação), também residente e domiciliada em ....,

na Rua .... nº ...., por seu procurador e advogado ao

final assinado, vêm, à presença de V. Exa., nos autos

em apreço, oferecer

CONTESTAÇÃO,

face as razões de fato e de direito abaixo argüidas:

1. Que consoante se constata da inicial, pretende a

sua autora, ...., a decretação da nulidade de doação

de bem imóvel efetuada em favor da ora contestante,

com reserva de usufruto, alegando, sucessivamente,

que:

- o citado ato, a doação, teve por suporte a

expectativa de que os pais e responsáveis da

donatária auxiliassem-na em suas necessidades,

principalmente quanto as de saúde, o que não logrou

se realizar, pois aqueles se mostraram além de

ingratos, negligentes e até insolentes, quando instados,

a prestarem auxílio até financeiro.

Alega ainda estar entregue a asilos, onde tem residido,

dado o total ausência de recursos, pois só tem uma

fonte de renda, a dos aluguéis advindos pelo usufruto

do imóvel doado.

Dentro dessa tônica e com o abandono dos pais da

menor que gratuitamente beneficiou, vale-se para o

pagamento de tratamentos médicos, inclusive,

geriátricos, de uma irmã;

- acrescente a isso tudo o fato de ter doado o seu

único bem, ficando sem condições de manter a sua

subsistência, o que, por si só, acarreta a nulidade do

ato gracioso, consoante previsto pelo art. 2.017 do

Código Civil.

2. Que, contudo, e como se demonstrará a seguir,

nenhuma razão de ordem legal, moral ou jurídica, tem

para obter o pretendido desfazimento do ato, senão

vejamos:

DOS FATOS

a - quando do falecimento do pai da autora, Sr. ...., a

mesma talvez por ser solteira, necessitou morar com

algum parente e não tendo sido aceita pela irmã de

nome ...., acabou por ir residir com uma tia materna

de nome .... e avó paterna .... da ora contestante, que

de bom grado e gratuitamente a recebeu, isso no ano

de ...., aproximadamente;

b - vinte anos após, já em ...., passou, por vontade

própria, a residir no lar de idosos e não em asilo

como indicado, de nome ...., situada na Rua .... nº ....,

nesta Cidade, pagando-se as despesas com a renda

de um imóvel de propriedade da mesma situado na

Rua .... nº ...., Bairro ....;

c - logo após ter passado para aquele lar e ao que se

sabe, foi ela, autora, procurada por sua irmã .... para

saber para quem deixaria o imóvel que possuía na

Capital do Estado de ...., isso no final do ano de ....

Assustada, segundo manifestou, procurou a tia

materna com quem morava por vinte anos e disse que

efetivamente não tinha herdeiros necessários e, por

isso, doaria o aludido imóvel à neta dessa, o que

acabou por concretizar, tendo a donatária, então, um

ano de idade.

Nada pediu, condicionou ou reivindicou na

oportunidade, só se reservando o usufruto;

d - durante todos esses trinta anos, a mesma,

independente de qualquer obrigação ou exigência, foi

atendida por todos os membros da família da

donatária, sem que nunca nada lhe faltasse econômica

ou moralmente.

As fotografias que acompanham esta bem

demonstram que sempre esteve ela junto com a

família da donatária, quer no natal, quer em festas da

família e em diversas ocasiões, nunca lhe faltando

companhia;

e - sempre se teve o máximo desvelo com a mesma,

até obrigando o pai da donatária, o falecido ...., com

ônus que nem podia suportar, citando-se como

exemplo o atendimento hospitar que teve no mês de

.... de ...., onde por exigência daquela irmã,

internou-se para operar a vesícula, no Hospital ....

Findo o atendimento médico-hospitalar, teve aquele

que assumir obrigações acima de seus recursos, razão

pela qual alienou a terceiros uma pintura em óleo

sobre tela de renomado artista ....;

f - já naquele ano de ...., o indicado .... acometido de

grave doença, a qual acabou por vitimá-lo neste ano

de ...., após ter se submetido a cinco cirurgias (no

mês de .... e .... de ...., em .... de .... e duas em .... de

....), além de aplicações, radioterapia e diversas

biópsias. Tudo isso lhe causou a perda de uma vista e

da fala, obrigando-o a se alimentar por sonda.

Só por essa sucinta descrição pode-se perceber os

problemas atravessados por toda a família;

g - porém, e apesar disso tudo, continuaram a assistir

a autora em todas as suas necessidades materiais e

psicológicas, pagando inclusive suas contas, entre elas

a contribuição à previdência social. A quitação dessa

contribuição era efetuada com recursos do pai da

donatária, debitando-se o valor em sua

conta-corrente bancária.

Assim, como se denota, inexistiu a citada ingratidão,

entendendo-se que o interesse no desfazimento, em

verdade, é de terceiros, que teriam sido prejudicados

em suas expectativas de herdarem alguma coisa

quando do falecimento da autora.

E, note-se, a doação em nada ficou condicionada.

Nada se exigiu da donatária ou de seus pais.

DO DIREITO

a - Inicialmente é de se fazer ver, que por quaisquer

dos dois motivos invocados, a pretensão é de ficar

reconhecida a nulidade da citada doação, razão

porque se impõe que se verifique tal possibilidade, em

caso da efetiva ocorrência de ingratidão.

O ato de liberalidade praticado pela autora em favor

da menor ora contestante, pode ser conceituado, se

indicando a princípio pois e dado a se ter preservado

o usufruto, não veste todas as características dessa

classe, como pura, segundo a classificação de

Orlando Gomes na 8ª ed. de sua obra "Contratos"

(Forense, pág. 250).

"Sendo pura poderá vir a ser revogada e não

decretada nula, na hipótese de se ter ingratidão do

donatário."

E o pretendido é que seja decretada como nula.

A doação efetivamente se classifica como pura,

efetuada por "espírito de liberdade, sem subordinação

a qualquer acontecimento futuro e incerto" (segundo

Orlando Gomes, op. cit.), necessário que ficasse

comprovada a ingratidão, para ser revogada.

Contudo e como já evidenciado, ingratidão não houve

quer por parte da menor donatária (que pela sua

pouca idade pouco ou nada poderia fazer), quer por

seus pais, (os quais nem estavam obrigados, já que o

ato foi sem encargo). Ninguém atentou contra a sua

vida, nem cometeu ofensa física, injúria, calúnia, ou

deixou de ministrar os alimentos de que necessitava,

(isso ela nem aponta).

Os pais da donatária, como já aduzido, sempre

empregaram os melhores de seus esforços nos seus

cuidados com a autora, inclusive, arcando com

dispêndio que não podiam. Onde a ingratidão?

b - por outro lado é de se destacar que, a reserva de

usufruto, além de subtrair a qualidade de doação

conceituada como pura, não acarreta a implicação à

questão do previsto pelo art. 1.175 do Código Civil,

indicando ser nula a doação de todos os bens, sem

reserva de parte ou de renda suficiente para a

subsistência da doadora.

Essa questão já foi enfrentada por nossas Cortês de

Justiça, vindo a se entender, como bem se lê na

ementa do acórdão unânime juntado a esta, proferido

pela 2º Câmara Cível do TJ-PR, na apel. cível.

1617/0000 e onde votaram os ilustres desembargadores

Negi Calixto, Sydney Zappa e Oswaldo Espíndola:

"Para anular a doação por infringir o art. 1.175 do

Código Civil, é mister provar que o doador ficou sem

recursos ou haveres para sua subsistência."

Do corpo desse acórdão se destacam os seguintes

trechos:

"Ora, ao fazer a doação do imóvel a doadora

reservou para si o direito do usufruto, circunstância,

que conforme franco entendimento da jurisprudência,

afasta a hipótese de nulidade decretada pelo art.

1.175, como já expressamente acentuado: Doação do

Imóvel, com reserva de usufruto para o doador, não

infringe o art. 1.175 do Código Civil." (RT - 522/15000)

"Embora minguados os meios de subsistência dos pais

que doaram imóvel aos filhos, não podem eles alegar

que não os têm para viver e, assim fundamentar

pedido de decretação de nulidade da respectiva

doação." (RT - 530/1000000)

"A doação, na espécie, atendeu todos os requisitos

do contrato perfeito e acabado, e era onerosa em

razão do usufruto em favor da doadora, circunstância

obedecida pela donatária."

Dentro dessa tônica aquela Egrégia Câmara negou

procedência ao pleito com objetivo de se decretar a

nulidade da doação. Esse caso, como se percebe,

tem perfeita identidade com a questão aqui tratada.

Conseqüentemente, também, por este ângulo, a

pretensão não pode ser endossada.

Face ao exposto, resultando demonstrado não poder

prosperar a ação, requer digne-se, afinal, dar pela sua

improcedência, com as cominações de estilo.

Nestes termos e protestando pela produção de todas

as provas em direito admitidas, caso de plano e pela

outorga de julgamento antecipado, não se afaste o

pleito, respeitosamente,

Pede Deferimento.

Local e data.

(a) Advogado e n° da OAB