ASSALTO EM ÔNIBUS INEXISTÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO ESTA

ESTADO DO RIO DE JANEIRO

PODER JUDICIÁRIO

COMARCA DA CAPITAL

JUÍZO DE DIREITO DA 10ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA

Processo nº 2002.001.092776-8

SENTENÇA

Vistos etc...

I

JORGE LUIZ CORREA DE ANDRADE, qualificado na inicial, propôs a presente ação em face do ESTADO DO RIO DE JANEIRO, postulando a condenação do réu ao pagamento de indenização a título de danos morais e materiais.

Como causa de pedir, alega o autor, em síntese, ter sido vítima de roubo seguido de lesões corporais, no dia 08.03.01, quando encontrava-se no interior do coletivo de propriedade da Empresa de Transportes Flores Ltda., vindo, em decorrência destes fatos, a sofrer perda de capacidade laborativa. Assim, por entender que houve falha na prestação do serviço por parte do réu, ajuíza a presente demanda (fls. 02/10).

Com a inicial vieram os documentos de fls. 11/80.

Devidamente citado, o réu apresentou contestação (fls. 86/52), sustentando, em síntese, a inexistência de responsabilidade, na medida em que não pode ser alçado a condição de segurador universal. No caso, não teria o autor apresentado qualquer elemento capaz de indicar uma participação do Estado no evento, ainda que de forma omissiva.

Réplica às fls. 55/57.

Novos documentos juntos pelo Estado do Rio de Janeiro às fls. 62/76.

Saneador à fl. 81, deferindo a produção de prova pericial.

Laudo pericial às fls. 98/98, acompanhado do documento de fl. 99.

Parecer do Ministério Público às fls. 108/109, no sentido da improcedência do pedido.

II

É o relatório. Fundamento e decido.

A questão posta a debate consiste em saber se existe, ou não, responsabilidade do Estado pelos danos sofridos pelo autor, em razão das lesões sofridas por conta de roubo no interior de ônibus.

Assim, para o correto deslinde da causa, necessário se faz, por primeiro, observar que é imputada uma conduta omissiva ao réu, consistente na falta do serviço de segurança pública, na forma preconizada pelo art. 188, §5o, da CRFB.

Ou seja, correlaciona o autor os danos sofridos, com a ausência do devido serviço de segurança pública.

Esta situação importa - conforme vem se orientando a jurisprudência e a doutrina - em deslocamento da natureza da responsabilidade incidente. Deixa-se de aplicar o §6o, do art. 37, da CRFB, retirando a idéia de responsabilidade objetiva, e passa-se a aplicar o art. 15, do CC/16, que vigorava na época dos fatos, trazendo a denominada responsabilidade subjetiva.

Sobre o assunto, vale a seguinte passagem de CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO:

“Quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) é de aplicar-se a teoria da responsabilidade subjetiva. Com efeito, se o Estado não agiu, não pode, logicamente, ser ele o autor do dano. E se não o foi o autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido responsabilizá-lo se descumpriu dever legal que lhe impunha obstar o evento lesivo.

...

Não bastará, então, para configurar-se responsabilidade estatal, a simples relação entre ausência do serviço (omissão estatal) e o dano sofrido. Com efeito: inexistindo obrigação legal de impedir um certo evento danoso (obrigação, de resto, só cogitável quando haja possibilidade de impedi-lo mediante atuação diligente), seria um verdadeiro absurdo imputar ao Estado responsabilidade por um dano que não causou, pois isto equivaleria a extraí-la do nada; significaria pretender instaurá-la prescindindo de qualquer fundamento racional ou jurídico. Cumpre que haja algo mais: a culpa por negligência, imprudência ou imperícia no serviço, ensejadoras do dano, ou então o dolo, intenção de omitir-se, quando era obrigatório para o Estado atuar e fazê-lo segundo um certo padrão de eficiência capaz de obstar o evento lesivo.

... se o Estado devendo agir, por imposição legal, não agiu ou o fez deficientemente, comportando-se abaixo dos padrões legais que normalmente deveriam caracterizá-lo, responde por esta incúria, negligência ou deficiência que traduzem um ilícito ensejador do dano não evitado quando, de direito, devia sê-lo. Também não o socorre eventual incúria em ajustar-se aos padrões devidos.

... solução diversa conduziria a absurdos. É que , em princípio, cumpre ao Estado prover a todos os interesses da coletividade. Ante qualquer evento lesivo causado por terceiro, como um assalto em via pública, uma enchente qualquer, uma agressão sofrida em local público, o lesado poderia sempre arguir que o “serviço não funcionou”. A admitir-se responsabilidade objetiva nestas hipóteses, o Estado estaria erigido em segurador universal” (Curso de Direito Administrativo, 5a ed., Malheiros, 1998, p. 889/891).

No âmbito da jurisprudência deste Estado, não seria muito trazer a colação recente julgado:

“RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – FURTO – VIA PÚBLICA – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – INAPLICABILIDADE – CULPA ANÔNIMA DO SERVIÇO PÚBLICO – FALTA DE PROVA – OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR – INOCORRÊNCIA.

Responsabilidade civil. Vítima de furto em via pública. Responsabilidade do Estado, inexistindo o dever individualizado de agir, a responsabilidade do Estado, na hipótese de dano decorrente de sua omissão, então de natureza genérica, é subjetiva. Aplicação da teoria da culpa anônima ou impessoal da Administração pública: falta do serviço, e não da objetiva prevista no art. 37, §6o, da CF, que consagrou a teoria do risco administrativo. Sentença incensurável. Recurso desprovido” (Ap. Cível, Proc. 2000.001.11525, 13a CC, Unânime, Des. NAMETALA MACHADO JORGE, J. 11.01.01).

Por conseguinte, fazia-se, como se faz, indispensável a demonstração de que o Estado devia e podia agir para impedir o evento delituoso.

Veja-se que o dever de segurança é de caráter genérico, o que traz a necessidade de comprovação de ter tido a parte ré todos os meios a sua disposição para evitar o dano ocorrido.

Inexistindo provas quanto a tal, acolher a pretensão do autor, importaria em erigir o Estado em verdadeiro segurador universal.

Note-se que o simples apontar que foi vítima de roubo, com lesões corporais graves, perpetradas por arma de fogo, não acarreta a automática responsabilidade civil do Estado.

A causa direta e imediata das lesões não se deve à conduta do Estado, mas sim de terceiro, mais precisamente daquele que foi o autor do crime. Este último é quem se coloca responsável em linha direta.

Não comprovando a presença de um policial militar no momento, que tenha ficado omisso, nem havendo demonstração de que no trecho em que se deu o roubo, incidentes como este se colocavam diários e do conhecimento do Poder Público, incabível a imputação de sua responsabilidade.

Finalizando, não prospera o pedido autoral. A parte autora não comprovou a relação direta entre a conduta omissiva do Estado e o dano ocorrido.

III

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido.

Deixo de impor ao autor os ônus sucumbenciais, face a gratuidade deferida. Fixo a verba honorária em 10% do valor da causa, cabendo a observância do art. 12, da Lei nº 1060/50.

P.R.I..

Rio de Janeiro, 18 de março de 2012.

RICARDO COUTO DE CASTRO

XXXXXXXXXXXX DE DIREITO