ALUNO ESCOLA PÚBLICA OUTRO ESTADO DA FEDERAÇÃO VESTIBULAR

ESTADO DO RIO DE JANEIRO

PODER JUDICIÁRIO

COMARCA DA CAPITAL

JUÍZO DE DIREITO DA 10ª VARA DE FAZENDA PÚBLICA

Processo n° 2003.001.138989-3

SENTENÇA

I

Vistos etc..

Trata-se de mandado de segurança impetrado por ELIANE DOS SANTOS NUNES, qualificada na inicial, em face de ato do REITOR DA UNIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO - UERJ, objetivando assegurar sua matrícula no curso de graduação em Letras.

Como causa de pedir, alega a impetrante, em síntese, ter obtido aprovação no vestibular SADE/2003, para ingresso no curso de Letras da UERJ. No entanto, a autoridade apontada como coatora não aceitou sua matrícula, sob o fundamento de que o edital era claro ao exigir do aluno o curso do ensino fundamental em escola pública no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, o que não era o caso da impetrante, proveniente de unidade educacional publica do Estado do Amazonas. Diante desta situação, por entender ilegal o ato praticado, na medida em que viola o princípio da isonomia, ajuíza a presente demanda (fls. 02/12).

Com a inicial vieram os documentos de fls. 13/38.

Devidamente notificada, a autoridade apontada como coatora prestou informações (fls. 87/58), mencionando, em síntese, não ter a impetrante atendido as regras do edital, posto que não cursou integralmente o ensino fundamental e médio em instituição de ensino mantida pelo Poder Público, localizada no Estado do Rio de Janeiro.

Com as informações vieram os documentos de fls. 59/86.

O Estado do Rio de Janeiro se manifesta à fl. 91, reiterando as informações prestadas pela autoridade apontada como coatora.

Parecer do Ministério Público às fls. 93/96, no sentido da concessão da segurança.

II

É o relatório. Fundamento e decido.

Conforme se nota, a discussão posta na presente demanda refere-se a ser constitucional o sistema de cotas, em favor dos candidatos ao vestibular, oriundos de escolas públicas localizadas apenas no Estado do Rio de Janeiro.

Ou seja, saber se a restrição territorial estaria vulnerando os princípios da isonomia e da razoabilidade.

Assim, passando ao exame da questão, constata-se que a restrição territorial acima não se encontrava na Lei Estadual nº 3528/00, mas sim no Decreto nº 31868/02, que a regulamentou, sendo certo que hoje, a Lei Estadual nº 8151/03, expressamente estende o benefício àqueles que tenham cursado o ensino em escola pública das redes situadas em todo o território nacional, retirando a restrição que existia.

Assim, já por este retrospecto legal, pode-se notar que a restrição não era pretendida pelo legislador, colocando-se afrontosa ao que se pretendia: universalizar o ensino, franqueando-o a todos.

Desta forma, se podia e se pode notar que a idéia de acesso ao ensino não comporta mecanismos de discriminação arbitrária.

No caso, viabilizar “cotas” aos oriundos de escolas públicas encontra o respaldo de franquear o conhecimento aos carentes de recursos econômicos.

Ciente de que estes candidatos competem em desigualdade com os que têm capacidade econômica - pois não têm a facilidade para aquisição de livros, disponibilidade de tempo, perspectivas de aulas particulares etc. – a Administração confere um tratamento especial, visando viabilizar o aceso universitário com uma competição apenas entre esta classe.

Colocando-se neste âmbito e com esta razão, fácil perceber que não há distinção de situação entre o hipossuficiente econômico que cursa escola pública no Estado do Rio de Janeiro, e aquele que cursa em outro Estado.

Ambos se colocam em mesma situação, e devem ter conferido igual tratamento.

Neste sentido não seria muito transcrever a seguinte passagem do parecer do Ministério Público:

“A autora demonstrou, pelos documentos estampados com a inicial, ser aluna oriunda integralmente da rede pública de ensino, tendo cursado apenas parte de seus estudos, mais precisamente, da 1a a 6a série do ensino fundamental, no Estado do Amazonas, razão pela qual, a princípio, estaria contemplada pela Lei 3528, de 28.12.2012.

Entende o Ministério Público, contudo, que a discriminação em desfavor dos alunos egressos de escolas públicas de outros Estados não se sustenta, porque malfere a razoabilidade, a isonomia, e até mesmo a proibição de distinções regionais pelos próprios entes federativos.

Importa, de fato, em ulceração à razoabilidade porque os meios não se adequam aos fins pretendidos. Se o escopo da lei é, como parece inequívoco, garantir o acesso dos estudantes da rede pública ao ensino superior gratuito e de qualidade, não pode importar em discriminação dos candidatos advindos de outros estados da federação.

De ouro lado, a isonomia também restaria vulnerada porque inexiste razão lógica que ampare a discriminação em desfavor dos alunos de outros estados, sendo certo que este princípio se sustenta pelo tratamento desigual na justa medida da desigualdade. Se inexiste desigualdade, o tratamento dispensado pelo Estado há que ser uniforme, sob pena de macular o princípio antes enunciado” (fl. 98).

Por conseguinte, afrontoso à isonomia e a razoabilidade a restrição constante do Decreto regulamentar e do edital, e por isto, nula, incapaz de impedir o pleito formulado.

III

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido, concedendo a segurança, e tornando definitiva a liminar.

Custas na forma da lei.

Sem honorários advocatícios (Súmula n° 512 do Supremo Tribunal Federal ).

Submeto a presente sentença ao duplo grau obrigatório de jurisdição.

P.R.I.

Rio de Janeiro, 13 de maio de 2012.

RICARDO COUTO DE CASTRO

XXXXXXXXXXXX DE DIREITO